NORMA AMBIENTAL DE JOINVILLE ESCLARECE A FAIXA DE PROTEÇÃO QUE DEVE SER DADA AOS CURSOS D’ÁGUA NATURAIS CANALIZADOS, RETIFICADOS E DESVIADOS

Foi publicada no dia 01 de julho de 2015 a nova norma ambiental do Município de Joinville que veio a regulamentar a situação dos variados cursos d’água naturais existentes no perímetro urbano da cidade, mas que há muito tempo não detém mais qualquer função ambiental, visto que foram retificados, canalizados, desviados sob logradouros públicos e integrados ao sistema público de drenagem pluvial.

A Resolução COMDEMA n. 001/2015, composta por apenas 4 (quatro) artigos, tem o nítido proposito de aclarar ainda mais a situação dos elementos hídricos existentes no território urbano municipal, facilitando, com isso, o entendimento dos órgãos urbanísticos-ambientais e de toda a coletividade a respeito do que deve, ou não, ser objeto de proteção.

Com o teor da nova redação, as margens dos elementos hídricos que se encontrem na situação acima mencionada (retificado, canalizado, desviado aos logradouros públicos e integrados ao sistema de drenagem pluvial – art. 1º, “a” até “d”) não estarão sujeitas às distâncias previstas no Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), mas sim àquelas da Lei Complementar n. 29/1996 (Código do Meio Ambiente de Joinville).

Em verdade, o que fez a nova resolução foi reforçar ainda mais a orientação dada pelo Código Ambiental Catarinense (Lei n. 14.675/09 com nova redação dada pela Lei n. 16.342/2014) e o posicionamento pacificado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – principalmente naquele município – que não considera como áreas de preservação permanente (APPs) as faixas marginais de elementos hídricos artificiais.

Embora digna de aplausos por enfrentar uma questão tão corriqueira e contraditória, pecou a resolução ao afirmar que os demais elementos hídricos que não atendam a todos os critérios, ou seja, retificado, canalizado, desviado para logradouros públicos e integrados ao sistema de drenagem pluvial, deverão ser caracterizados como cursos d’água natural, merecedores, portanto, de proteção pelo código florestal (art. 3º).

Ora, é plenamente possível que o elemento hídrico esteja canalizado, mas não integrado ao sistema de drenagem pluvial, por exemplo. Neste caso, como a nova legislação ambiental somente protege os cursos d’água naturais, por certo que, ainda que não integrado, se ele estiver canalizado e/ou retificado, de natural não se trata, perdendo a proteção dada pela Lei n. 12.651/2012.

Portanto, ainda que a norma venha a resolver alguns problemas pontuais frequentemente enfrentados na prática, o fato é que sua interpretação pode gerar divergências, causando uma certa insegurança jurídica.

Por: Lucas Dantas Evaristo de Souza

2015-07-15T17:37:46+00:0015 de julho de 2015|

ACRESCIDOS DE MARINHA E O NOVO PLANO DIRETOR

Abstraída a polêmica sobre se o atual Plano Diretor de Florianópolis está mesmo em vigor – considerando o TRF da 4ª Região determinou a realização de novas audiências públicas e a votação de um novo projeto de lei – o tema que mais tem chamado a atenção nos últimos dias na cidade diz respeito às sucessivas negativas a consultas de viabilidade para construção em áreas inteiramente urbanizadas (algumas até já loteadas), ao argumento de que estariam situadas em “acrescidos de marinha, natural ou artificial”.

É que a tal LC, em seu art. 119, §1º – se é que vigente, repita-se – estabelece que “os acrescidos de terrenos de marinha, formados por acessão natural ou artificial, serão destinados ao uso público ou coletivo”. Com base nesta disposição é que a Prefeitura Municipal vem sistematicamente indeferindo pretensões de construir de vários munícipes.

É flagrante o equívoco. A uma porque a linha de marinha em que o Município vem se baseando é aquela que está em debate no Serviço do Patrimônio da União, ou seja, ainda não está homologada e, portanto, o ato que a demarcou ainda não pode produzir efeitos – nem para a União nem, menos ainda, para o Município.

A duas, porque a leitura do parágrafo deve ser feita em consonância com a cabeça do artigo, este que diz expressamente que “os terrenos de marinha que estiverem no uso comum do povo se constituem em logradouros públicos municipais,…”. Ou seja, somente aquelas áreas que não sejam objeto de aforamento ou ocupação por particulares é que poderiam ser atingidas pela restrição legal, se esta fosse válida. Não quaisquer terrenos de marinha, portanto.

Demais disso, no que tange a loteamentos aprovados pelo Poder Público no passado e já devidamente implementados, a aplicação da referida norma, como vem sendo feita, ofende o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, caracterizando, ainda, retroatividade indevida.

Isto sem falar na ofensa ao princípio da razoabilidade, na medida em que, se levada a extremos esta postura, áreas inteiras do Município passariam a ser de uso público ou coletivo, com flagrante repercussão sobre o direito de propriedade, o que, por evidente, não é de se admitir.

Outros argumentos contrários a esta atitude do Poder Público Municipal podem ainda ser aduzidos, mas, por brevidade, fica-se por aqui, na expectativa de que esta política seja revista ou, então, no novo plano a ser votado por determinação da Justiça, esta verdadeira “aberração jurídica” não seja reproduzida.

Por: Marcelo Buzaglo Dantas

2015-07-15T17:35:20+00:0015 de julho de 2015|

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE LANÇA NOTA SOBRE COBRANÇAS DO CADASTRO AMBIENTAL RURAL – CAR

O Ministério do Meio Ambiente lançou nota esclarecendo que a inscrição para o Cadastro Ambiental Rural não é paga e o proprietário pode acessar o site www.car.gov.br e seguir o passo a passo do preenchimento com auxílio da cartilha ou de pessoas treinadas nas Secretarias de Agricultura e Meio ambiente.

O CAR é um registro público eletrônico das informações ambientais dos imóveis rurais, cujo objetivo é promover a identificação e integração das informações ambientais das propriedades e posses rurais visando o planejamento ambiental, monitoramento, combate ao desmatamento e regularização ambiental.

Trata-se de registro obrigatório e gratuito e para atingir o seu objetivo fim, o Ministério do Meio Ambiente – MMA capacitou mais de 30 mil pessoas em todo o Brasil para auxiliar os proprietários rurais a proceder ao referido registro. A nota emitida pelo MMA indica, ainda, que o documento não tem valor fundiário, não podendo ser cobrado por cartórios para registrar escrituras de imóveis, mas, a partir de 2017, as instituições financeiras cobrarão o CAR como pré-requisito para conceder crédito aos produtores rurais.

Assevera o MMA que aqueles que não possuírem acesso à internet ou encontrarem dificuldade para realizar o cadastro pelo site podem procurar sindicatos, cooperativas e secretarias de Meio Ambiente e Agricultura de sua cidade para receber apoio, uma vez que foram capacitadas para tanto.

Por: Marcelo Suppi

2015-07-01T17:56:40+00:001 de julho de 2015|

AS ALTERAÇÕES DAS FAIXAS MARGINAIS DE CURSOS D’ÁGUA DO CÓDIGO FLORESTAL ANTERIOR EM RELAÇÃO AO NOVO CÓDIGO FLORESTAL

As Áreas de Preservação Permanente em faixas marginais de curso d´água, que atualmente estão dispostas no art. 4º, I, da Lei n. 12.651/2012, sofreram uma considerável mudança em relação ao antigo Código Florestal (Lei n. 4.771/1965). Primeiramente observa-se que hoje as faixas marginais de um curso d’água para identificação das áreas de preservação permanente começam a contar a partir “da borda da calha do leito regular” e não desde o seu “nível mais alto”, o que, para alguns, seria um retrocesso ambiental, pois, a faixa de preservação diminuiu.

A nova legislação definiu ainda que não serão todos os cursos d’água que merecerão proteção, mas apenas aqueles naturais. À vista disto, os elementos hídricos artificiais (canalizados, provenientes das águas da chuva, etc) não detém mais em suas margens qualquer proteção ambiental, não se tratando, portanto, de área de preservação permanente.

O esclarecimento da questão por parte do legislador infraconstitucional se revela de suma importância, pois, como na antiga legislação não constava a palavra “natural”, dúvidas surgiam a respeito da abrangência das hipóteses consideradas como APP’s, visto que diante da lacuna legislativa, poder-se-ia entender que estariam contempladas no regime de especial proteção tanto as margens dos cursos d’água naturais quanto às dos artificiais, o que, a nosso ver, sempre foi equivocado.

Devido a essa omissão, muitas questões acabavam chegando ao Poder Judiciário e competia a este resolver, pois havia quem entendesse que a proteção deveria ser tanto para os cursos d’água naturais quanto para os artificiais e outros que discordavam desse ponto de vista, limitando a proteção somente aos cursos d’água naturais.

Com a nova legislação, essa discussão, se ainda vigente, encontra-se totalmente superada, pois o legislador deixou clara a sua intenção em proteger somente as margens dos cursos d’água naturais.

Como se não bastasse, a lei acrescentou ainda que o curso d’água, além de natural, deve ser perene e intermitente. Se for efêmero, a legislação ambiental, da mesma forma, não terá qualquer aplicabilidade.

Muito embora o diploma tenha desagradado em grande parte aos diversos segmentos envolvidos (ruralistas e ambientalistas), o fato é que, até que o STF decida em sentido contrário, a nova lei florestal, com todas suas regulamentações, é válida e deve ser imediatamente aplicada a todos os operadores de direito.

Por: Marcela Dantas Evaristo de Souza

2015-07-01T17:54:06+00:001 de julho de 2015|

DECISÃO DO TRF4 PÕE EM DÚVIDA A VIGÊNCIA DO PLANO DIRETOR DE FLORIANÓPOLIS

No ano de 2013, o Ministério Público Federal ingressou com Ação Civil Pública (n. 5021653-98.2013.404.7200/SC), contra o Município de Florianópolis e contra a Advocacia Geral da União – AGU, apontando uma série de irregularidades ocorridas durante o processo de elaboração do Plano Diretor da capital catarinense. Segundo o MPF, o Município não respeitou as regras estabelecidas na Constituição Federal e na Lei do Estatuto das Cidades, sobretudo no que se refere às audiências públicas necessárias para a criação do Plano.

A rigor da lei, a elaboração de um Plano Diretor de fato requer participação popular na definição de suas diretrizes, e isto se justifica justamente pela importância e pelo impacto que tal regulamento enseja perante a sociedade.

Ocorre que, em sua defesa, o Município de Florianópolis e a AGU alegaram que houve intensa participação dos cidadãos florianopolitanos nas discussões sobre as novas diretrizes do plano, principalmente por meio de reuniões comunitárias, seminários, conferências e oficinas, nas quais se debateram, em grupos e subgrupos, o presente e o futuro de cada bairro da bairro da cidade.

Apesar dos esforços do Município, a sentença acolheu os argumentos do MPF e julgou procedente a ação, determinando à Prefeitura que realizasse a oitiva da população, através de assembleias marcadas com a devida antecedência e divulgação, para que, somente após a análise das considerações expostas pela comunidade, um novo texto do Plano Diretor seja encaminhado para votação do Poder Legislativo.

Insatisfeitos com o desfecho da ação em primeiro grau, o Município e a AGU recorreram ao Tribunal Federal da 4ª Região, que, embora em um primeiro momento tivesse suspendido a decisão da Justiça Federal de SC, acabou por mantê-la ao julgar o mérito dos recursos, ressaltando que não se sustenta o argumento de que houve mais de sete anos de discussões sobre o tema, com o que teria sido permitida a participação popular, porquanto as dezenas de reuniões, oficinas setoriais e outros eventos realizados não podem ser equiparados a audiências públicas. E, mesmo que o Município tenha realizado mais de uma centena de reuniões, tais reuniões não obedeceram, segundo os Desembargadores do TRF4, o Princípio da Publicidade, permitindo, assim, que a população pudesse participar e discutir a temática com o devido preparo prévio.

Diante da decisão do TRF4, tem se discutido muito acerca de qual Plano Diretor estaria em vigor em Florianópolis: se o atual, alvo da Ação Civil Pública e objeto da comentada decisão, ou se os antigos, de 1985 (Balneários) e de 1997 (Distrito Sede).

Apesar da decisão não mencionar expressamente que o texto atual do Plano Diretor tenha perdido efeito, o comando da sentença, agora mantida pelo Tribunal, pressupõe tal entendimento. A decisão afirma que houve afronta aos preceitos legais no desenvolvimento do anteprojeto da mencionada lei, e, tendo em vista estas ilegalidades, um novo texto deverá ser produzido, após a realização das devidas audiências públicas.

É plenamente compreensível que a situação gere algum tipo de insegurança jurídica, principalmente àquelas pessoas que investem na área e necessitam da mais clara transparência acerca das regras urbanísticas a serem observadas, entretanto, quer nos parecer, pelo menos no cenário atual, que o Plano Diretor vigente a partir de 2014, ao menos por ora, não possa ser seguido.

Convém ressaltar que a decisão do TRF4 é passível de recurso ao Superior Tribunal de Justiça, e não causará surpresa se o Município de Florianópolis promover alguma medida judicial a fim de fazer valer o regular cumprimento do atual Plano Diretor.

Com a iminência do julgamento dos embargos de declaração opostos pela Prefeitura, a controvérsia muito provavelmente deva ser sanada, ao menos até o julgamento da causa pelo STJ, no caso das partes recorrerem à Corte Superior.

Por: Maurício Dupont Gomes de Freitas

2015-07-01T17:50:22+00:001 de julho de 2015|

LOGÍSTICA REVERSA COMO CONDICIONAMENTE À EMISSÃO DAS LICENÇAS DE OPERAÇÃO EM SP

Já afirmamos, em outras oportunidades (nº1 e nº2), que a Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS) ainda não havia produzido os efeitos inicialmente almejados, muito embora tenha sido instituída já em 2010 pela Lei n. 12.305. Sustentamos, igualmente, que cedo ou tarde as obrigações ali previstas começariam a ser cobradas, sempre aconselhando o seu cumprimento (nº1 e nº2). Pois bem, o Estado de São Paulo acaba de encontrar uma maneira efetiva de garantir o cumprimento das obrigações estabelecidas pela PNRS, ou ao menos a execução dos instrumentos nela previstos.

Recentemente publicada, em 24 de junho deste ano, a Resolução n. 45 da Secretaria de Estado do Meio Ambiente de SP (SMA) (Veja aqui a norma) estabeleceu que a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) passará a exigir o cumprimento da obrigação de estruturar e implementar sistemas de logística reversa como condicionante para a emissão ou renovação das licenças de operação emitidas pelo órgão. Assinada pela atual Secretária de Estado do Meio Ambiente, Patrícia Iglecias, que, diga-se de passagem, muito entende da temática (veja-se o seu livro intitulado: Resíduos Sólidos e Responsabilidade Civil Pós-Consumo), a resolução certamente poderá auxiliar na concreta instituição de uma benéfica política que não vinha sendo efetivamente cobrada.

Segundo a norma, estão obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos e embalagens após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos produtos que, por suas características, exijam ou possam exigir sistemas especiais para acondicionamento, armazenamento, coleta, transporte, tratamento ou destinação final, de forma a evitar danos ao meio ambiente e à saúde pública, mesmo após o consumo desses itens.

Os produtos relativos a essa obrigatoriedade estão divididos em três categorias pela resolução: (i) produtos que, após o consumo, resultam em resíduos considerados de significativo impacto ambiental; (ii) embalagens de produtos que componham a fração seca dos resíduos sólidos urbanos ou equiparáveis; (iii) e as embalagens que, após o consumo do produto, são consideradas resíduos de significativo impacto ambiental. Esses produtos específicos estão arrolados, respectivamente, nos incisos I, II e III do parágrafo único do artigo 2º da norma, refletindo o que já havido sido previsto na Lei da PNRS em 2010.

Importante notar, ademais, que, a fim de garantir a efetiva implementação desses sistemas de logística reversa, quando previstos como condicionante nas licenças de operação emitidas, a CETESB poderá celebrar Termos de Compromisso objetivando o acompanhamento da execução desses sistemas, servindo como comprovação do cumprimento das condicionantes pelas empresas signatárias ou aderentes.

As empresas que porventura aderirem aos acordos setoriais federais, que vêm sendo assinados juntamente com o Ministério do Meio Ambiente, poderão compatibilizar ou complementar os seus termos de compromisso conforme as diretrizes fixadas naqueles. Não fica clara, contudo, a situação das empresas que já forem signatárias dos referidos acordos setoriais e que, por isso, preferirem não assinar o termo de compromisso perante a Companhia Ambiental Estadual. A resolução somente prevê que o acompanhamento e a comprovação do cumprimento das obrigações pelas empresas não signatárias ou aderentes de Termos de Compromisso com a SMA ou a CETESB serão regidos por regras e metas que ainda serão definidas e divulgadas oportunamente pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo.

Não obstante, é importante salientar que o descumprimento da resolução poderá ensejar a aplicação das penalidades previstas na legislação ambiental em vigor. Estas sanções, contudo, já estavam previstas na própria lei da PNRS de 2010, não sendo suficientes a garantir a sua eficácia. Certamente, a maior novidade se deu, portanto, na caracterização dessa obrigação como condicionante da emissão ou renovação das licenças de operação. Sem dúvidas, será essa nova medida que poderá auxiliar na efetiva implementação dos sistemas de logística reversa.

Por fim, cabe salientar que a nova Resolução poderá ficar à mercê das críticas realizadas por aqueles que se virem obrigados a participar dos processos licenciatórios e, consequentemente, a instaurar sistemas de logística reversa, uma vez que a obrigação ali prevista somente irá abranger os empreendimentos passíveis de licenciamento, abrindo-se a possibilidade da exclusão de algumas parcelas do ciclo de responsabilidade dos resíduos sólidos, que, em tese, deveria ser compartilhada por todos envolvidos na “vida” dos produtos. Isto é, do seu nascimento até a sua destinação final. Lembre-se, contudo, caso isso ocorra, que todos já se encontram vinculados às obrigações previstas na Lei da PNRS desde 2010.

Por: Guilherme Berger Schmitt

2015-07-01T17:47:25+00:001 de julho de 2015|

Comentário ao julgado do Superior Tribunal de Justiça que condicionou o registro da sentença de usucapião de imóvel rural à averbação da reserva legal no Cadastro Ambiental Rural – CAR.

Em recente decisão, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, deu provimento ao Recurso Especial n. 1.356.207, interposto pelo Estado de São Paulo contra a decisão do Tribunal de Justiça daquela unidade federativa, decidindo, nos termos do voto do relator, Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, pela obrigatoriedade da inscrição da reserva legal no CAR para a efetivação do registro da sentença de usucapião.

Apesar do Novo Código Florestal limitar a obrigatoriedade de averbação da reserva legal apenas para os casos de “transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento” do imóvel (art. 18 da Lei n. 12.651/12), o relator, fundamentando o seu voto no discutível princípio “In dubio pro natura”, entendeu que no meio rural é comum a transmissão apenas do domínio, desacompanhada da transmissão da propriedade. Assim, ao se interpretar a norma de forma restrita, dispensando a prévia averbação da reserva legal em casos de aquisição originária por usucapião, estaria-se reduzindo significativamente a sua eficácia ambiental, contrariando o seu condão protetivo.

Ainda em sua fundamentação, em sintonia com o referido princípio, ampliou o entendimento do texto legal, enxergando na palavra “transmissão” a possibilidade de uma interpretação mais ampla, viabilizando a sua abrangência aos processos de usucapião ao considera-los como a “transmissão” da propriedade por força de sentença, sendo então atingidos pela norma.

De fato, como se sabe, não cabe ao Poder Judiciário extrapolar os limites impostos pela legislação, inovando-a de acordo com o seu convencimento. Todavia, em se tratando de meio ambiente, nos casos em que há possibilidade de dupla interpretação, as decisões do Superior Tribunal de Justiça costumam, perfilhar uma visão mais rigorosa, optando normalmente pela leitura que melhor garanta a proteção dos processos ecológicos e da biodiversidade o que, contudo, acaba não raro por desconsiderar a realização de outros direitos fundamentais.

Por: Lucas Soares

2015-06-10T16:24:55+00:0010 de junho de 2015|

As peculiaridades da aplicação da legislação ambiental à zona urbana

Há algum tempo convivemos com a controvérsia a respeito da aplicabilidade generalizada das normas ambientais nas áreas situadas nos centros urbanos. Essa problemática, que se estende desde o advento do Código Ambiental de 1965, foi recentemente sentida no tortuoso processo de aprovação do Novo Código Florestal (Lei n. 12651/2012), que, caso não tivesse sido alvo de diversos vetos presidenciais, poderia ter previsto medidas diferenciadas para as zonas urbanas e rurais.

Essa aplicação discriminada, ainda que vetada, possivelmente teria sido uma solução interessante para os problemas atualmente sentidos, uma vez que, passados três anos da sua publicação, cada vez mais percebemos que a almejada aplicabilidade equânime da norma vigente não conseguiu refletir na prática as peculiaridades presentes nos distintos zoneamentos. E, por certo, são nas zonas urbanas que os problemas advindos dessa ampla abrangência são mais sentidos.

Isto porque aqueles que buscam empreender nas zonas urbanas podem encontrar diversos percalços no seu caminho, ainda que os municípios expressamente determinem que o desenvolvimento das áreas visadas seja essencial àquela localidade. Isto ocorre, pois diversas normas ambientais preveem restrições gerais que, por vezes, não levam em consideração as particularidades inerentes a determinadas regiões do País.

Assim, não são raras as ocasiões que nos deparamos com pedidos de demolição e recuperação das faixas marginais de elementos hídricos que atravessam regiões centrais de grandes metrópoles brasileiras, ainda que suas margens há anos já se encontrem ocupadas por residências, prédios ou avenidas. Por vezes, esses elementos já se encontram totalmente canalizados e suas margens sequer apresentam suas funções ecológicas originais.

Essas restrições não se circunscrevem às previsões do Código Florestal, pois os empreendedores ainda podem se deparar com diversas condicionantes estabelecidas pela legislação ambiental.

A Lei da Mata Atlântica, muito embora preveja limites diferenciados para as áreas rurais e urbanas, estabelece padrões meramente formais de caracterização das zonas urbanas, não levando em consideração aspectos fáticos usualmente mencionados em outras leis que apresentam conceitos baseados em critérios mensuráveis e objetivos. Além disso, a referida lei pode obstar por completo a supressão de vegetação, ainda que em zonas urbanas, caso sejam identificadas no local espécies da flora e da fauna silvestres ameaçadas de extinção, sequer prevendo a possibilidade de adoção de medidas compensatórias e mitigadoras com vistas a assegurar a conservação da espécie.

Nesse mesmo sentido, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, instituído pela chamada Lei do SNUC (Lei n. 9.985/2000), também prevê situações que podem obstar o licenciamento de empreendimentos que pretendam se instalar no entorno das Unidades de Conservação ou das suas Zonas de Amortecimento.

Isto porque o licenciamento de empreendimentos que possam afetar essas áreas, e que sejam licenciados por EIA/RIMA, fica atrelado à autorização do órgão responsável pela administração da unidade eventualmente afetada, mesmo que a área já esteja completamente antropizada. Essa condicionante pode se apresentar ainda mais absurda, pois não é incomum que as zonas de amortecimento das UC’s se estendam por até 10 km, mesmo naquelas que se encontrem nos arredores das zonas urbanas já consolidadas.

Os empreendedores, porém, não estão completamente desamparados, uma vez que o Poder Judiciário (seja o Estadual ou Federal), por vezes decide seguir em sentido oposto ao do que decorre do texto legal, adaptando a aplicação normativa às peculiaridades dos casos concretos. Ressalte-se, porém, que devido à especificidade da matéria, os casos concretos podem e devem ser levados à apreciação do Judiciário, uma vez que a correta transposição da esparsa legislação ambiental vigente à realidade fática das áreas urbanas requer um trabalho interpretativo minucioso.

Contudo, ainda que a busca pelo Poder Judiciário seja a solução mais eficaz em casos pontuais, a sua aplicação generalizada não parece ser a solução permanente ideal, pois os interessados podem ficar à mercê da interpretação e da ideologia aplicada por cada juízo, gerando insegurança jurídica para aqueles que se veem nas mais diversas situações que envolvem a incidência das normas ambientais nas cidades.

Assim, entendemos que a adequação pontual de algumas normas ambientais vigentes, que se apresentam hoje como os maiores pontos de “engarrafamento” nas zonas urbanas, possa ser a solução mais apropriada para os principais problemas da incidência das normas ambientais que são frequentemente enfrentados nas zonas urbanas.

Por: Guilherme Berger Schmitt

2015-06-10T16:22:46+00:0010 de junho de 2015|

Lei de Biodiversidade: aproximação entre desenvolvimento econômico e conservação

Muito se tem comentado, nos últimos dias, a respeito das principais alterações advindas com a Lei nº 13.123/15, que instituiu o novo Marco da Biodiversidade brasileiro.

Entre as consequências positivas da norma recém-sancionada, destaca-se a busca pela congregação dos interesses dos pesquisadores, das empresas utilizadoras das riquezas naturais das comunidades tradicionais detentoras dos conhecimentos que envolvem esses bens e da própria conservação da natureza.

Nesse sentido, merece saudação a criação de um marco legislativo que busca atender, de forma inédita, perspectivas vistas, não raras vezes, como antagônicas. Conferindo uma racionalidade conciliatória ao tema, a norma acaba por evitar eventuais conflitos, fomentar e facilitar a realização de pesquisas envolvendo a riqueza biológica do Brasil e proporcionar maior segurança aos procedimentos que tratam da exploração desses bens.

Sob o ponto de vista das comunidades, são vistas como positivas as medidas destinadas à conservação e ao reconhecimento de seu patrimônio cultural, além daquelas que instituem, pela primeira vez na legislação brasileira, a exigência de pagamento de royalties pelo uso dos conhecimentos dessas comunidades.

Mas o ponto de maior relevância parece ser que a garantia dos direitos de tais agentes não representou um obstáculo à conservação da biodiversidade, tampouco ao desenvolvimento técnico e econômico que pode advir da exploração dos elementos naturais tutelados.

Destaca-se, desse modo, a especial atenção dada às reais necessidades dos pesquisadores e das empresas que buscam acessar o patrimônio genético brasileiro e que, até o advento da Lei nº 13.123/15, tinham suas ações dificultadas ou mesmo criminalizadas, principalmente em razão da alta carga burocrática contida no antigo sistema. Sob a vigência da legislação anterior, ainda que a diversidade biológica no Brasil fosse de fato muito atrativa, ainda eram poucas as empresas que se debruçavam sobre essa área de pesquisa, sobretudo em razão da falta de segurança que as regras existentes transmitiam a esses agentes.

Avançando nesse sentido, o novo Marco da Biodiversidade permite que as pesquisas sejam iniciadas de maneira muito mais ágil – através de cadastro eletrônico dos pesquisadores, conforme já destacado em artigo anterior – e regulamenta o modo como deve se dar a repartição de benefícios. Nesse ponto reside um dos maiores benefícios da Lei, que dirimiu as dúvidas existentes a esse respeito. Até então, o contrato de repartição de benefícios deveria ser celebrado entre as empresas exploradoras do patrimônio e as comunidades tradicionais antes mesmo do desenvolvimento do produto final. Isso dificultava em muito a determinação dos valores a serem repassados, uma vez que era praticamente impossível determinar previamente qual seria a viabilidade econômica e o real potencial do produto. Agora, o acordo pode ser celebrado até um ano após o lançamento do material no mercado, o que traz maior segurança para as empresas e mostra-se mais justo para todos os interessados.

Outro aspecto da Lei que parece se alinhar às reais circunstâncias da exploração desse tipo de riqueza natural é a determinação de que apenas produtos finais onde o elemento da biodiversidade ou o conhecimento tradicional for essencial para a formação do bem estarão sujeitos ao pagamento de compensações, o que serve a viabilizar economicamente o desenvolvimento do setor e evitar que elementos naturais utilizados em menores quantidades sejam deixados de lado ou substituídos por elementos sintéticos em razão de uma carga demasiadamente onerosa.

Além disso, ao descriminalizar a atividade de pesquisadores e instituições de pesquisa e exploração, o novo marco regulatório aproxima esses agentes das comunidades tradicionais e viabiliza a livre negociação de seus conhecimentos, garantindo, na hipótese de haver exploração econômica deste conhecimento, que se realize o depósito de 0,5% da receita líquida anual no FNRB (Fundo Nacional para Repartição dos Benefícios). Desse modo, a norma traz segurança jurídica tanto aos empresários quanto aos detentores do conhecimento associado.

As novas diretrizes garantem uma profunda alteração no modo como as indústrias de cosméticos, alimentos e produtos farmacêuticos podem acessar os recursos ambientais e os conhecimentos tradicionais associados, facilitando o compartilhamento dos benefícios advindos desse patrimônio. Desse modo, congregando conservação com inovação, a norma coloca um ponto final às dúvidas que há muito obstaculizavam o desenvolvimento das pesquisas que envolvem a biodiversidade do país.

Por: Mariana Gmach Philippi

2015-06-10T16:21:46+00:0010 de junho de 2015|

A INEXIGIBILIDADE DE EIA/RIMA EM LICENCIAMENTO DE PROJETO DE ÁREA ÚTIL INFERIOR A 100 HECTARES

É de notório conhecimento na seara jurídica que o Estudo de Impacto Ambiental e o seu respectivo Relatório (EIA/RIMA) deve ter a sua elaboração restrita somente às atividades potencialmente poluidoras de significativa degradação ambiental, enquanto as demais – quando sujeitas a licenciamento – podem ser avaliadas por estudos mais simples.

Contudo, desde o advento da Resolução n. 001/86 do CONAMA, o teor da referida resolução vem sendo erroneamente utilizado para embasar a obrigatoriedade da elaboração desse complexo instrumento no licenciamento de empreendimentos que desejarem se instalar em áreas superiores a 100 (cem) hectares.

Ora, se aplicássemos o texto da resolução nesses moldes, poderíamos nos ver diante de situações extremas, com a necessidade de licenciamento subsidiado por EIA/RIMA em casos de simples edificações como residências particulares, se essas fossem construídas em imóveis com área superior a 100 hectares.

É importante notar, assim, a minucia técnica da redação da citada Resolução, que é clara ao afirmar que dependerá de elaboração de EIA/RIMA o licenciamento dos projetos urbanísticos acima de 100 hectares (art. 2º, XV), e não os projetos implantados em áreas acima de 100 hectares, como caracterizado em outras hipóteses da mesma norma (art. 2º, XIV). Assim, enquanto um deles claramente se refere à área do empreendimento (XIV), o outro se refere ao tamanho do projeto a ser implantado (XV), e não, evidentemente, à área do imóvel onde estará situado. Essa diferença na leitura da referida Resolução é essencial para a manutenção da aplicação parcimoniosa do instrumento.

Essa interpretação vem sendo aplicada, inclusive, pelo eg. Tribunal Federal da 4º Região, que claramente atrela a obrigação de elaboração do EIA/RIMA somente aos empreendimentos que contemplem projeto urbanístico com área maior do que 100 hectares. Adotando entendimento semelhante, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais estabeleceu inclusive uma ligação entre o termo “projeto urbanístico” e a área construída do empreendimento, ou seja, definiu projeto urbanístico como sendo aquele que ocupa a área útil a ser utilizada pelo empreendimento.

Esse mesmo entendimento, segundo o qual somente as áreas úteis e edificadas devem ser computadas para o fim de se definir o estudo ambiental exigível para o licenciamento, encontra respaldo em situações análogas. Vejamos.

No mais recente Guia de Atuação do Ministério Público de Santa Catarina no Ordenamento Territorial e Meio Ambiente, ao tratar do cálculo da percentagem das áreas de uso comum, ficou assentado que somente a área útil do parcelamento do solo deverá ser levada em consideração no momento da definição das áreas verdes ou institucionais. Segundo o teor do referido manual, essa interpretação garante, não apenas a correta correlação percentual de área comum em relação à área útil do empreendimento, afastando o excesso de limitação do direito de propriedade, como também, protege a área de preservação permanente do seu uso indevido, por exemplo, como área verde ou institucional.

Outra situação que permite o uso da analogia para a hipótese presente, que condiz com o mesmo critério ora defendido, isto é, de contabilizar apenas as áreas aproveitáveis, é aquele utilizado pelo STJ para fins de classificação do porte dos imóveis rurais passíveis de reforma agrária. Isto porque, o Superior Tribunal de Justiça caracteriza as propriedades rurais (como pequenas, médias ou grandes), conforme a área aproveitável do imóvel e não a área do imóvel.

Os órgãos licenciadores, portanto, não podem atrelar a concessão do licenciamento de empreendimentos que não apresentem significativa degradação ambiental à elaboração de um oneroso e demorado estudo somente devido ao fato de que a área na qual se pretende implantar o empreendimento é superior a 100 hectares. Isto não impede, contudo, que os órgãos licenciadores requeiram o estudo ambiental adequado para embasar o licenciamento, quando a atividade assim requerer.

Por: Guilherme Berger Schmitt

2015-05-27T17:38:07+00:0027 de maio de 2015|
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