Promontórios: área de preservação permanente, ou de uso especial?

Segundo conceitos técnicos, “promontório” é, em síntese, acidente geográfico formado por uma massa de terra que se estende ao oceano ou ao mar.

As Leis Estaduais de SC n. 14.675/2009 e n. 16.342/2014 definem promontório ou pontão como sendo um “maciço costeiro individualizado, saliente e alto, florestado ou não, de natureza cristalina ou sedimentar, que compõe a paisagem litorânea do continente ou de ilha, em geral contido em pontas com afloramentos rochosos escarpados que avançam mar a dentro, cujo comprimento seja maior que a largura paralela à costa”.

Esse acidente geográfico é  previsto na Lei n. 7.661/88 (Lei do Gerenciamento Costeiro), que assim determina:

Art. 3º. O PNGC deverá prever o zoneamento de usos e atividades na Zona Costeira e dar prioridade à conservação e proteção, entre outros, dos seguintes bens:

I – recursos naturais, renováveis e não renováveis; recifes, parcéis e bancos de algas; ilhas costeiras e oceânicas; sistemas fluviais, estuarinos e lagunares, baías e enseadas; praias; promontórios, costões e grutas marinhas; restingas e dunas; florestas litorâneas, manguezais e pradarias submersas;

II – sítios ecológicos de relevância cultural e demais unidades naturais de preservação permanente;

III – monumentos que integrem o patrimônio natural, histórico, paleontológico, espeleológico, arqueológico, étnico, cultural e paisagístico.

Pois bem. Trazendo tais conceitos para a seara jurídica, mais especificamente para o Direito Ambiental, tem-se que esse acidente geográfico, apesar de receber proteção diferenciada, nos termos as legislação acima, não é (e não pode ser!) considerado como Área de Preservação Permanente.

Isso quer dizer que o uso desse ecossistema é absolutamente possível – sobretudo porque não há, na legislação federal em vigor, definição que o eleve à categoria de Área de Preservação Permanente – embora seu uso seja, de certa forma, limitado, justamente pela função ecológica que desempenha.

E se fala em um uso limitado porque os promontórios são, de fato, áreas de prioritária conservação e proteção, nos termos do que estabelece o art. 3º da já citada Lei n. 7.661/88, ou seja, o uso desses ecossistemas deve se dar de forma planejada e de modo a se integrar aos ambientes da própria Zona Costeira.

Assim, não se olvida que, ao se tratar dos promontórios, está-se diante de ecossistema que exige uma especial proteção; não, porém, integral.

Ocorre que muitos Municípios têm legislado no sentido de elevar tal acidente geográfico à posição de Área de Preservação Permanente, de modo a restringir por completo o seu uso, dado que, como se sabe,  estas apenas podem ser utilizadas em excepcionalíssimas ocasiões – basicamente, nos casos de utilidade pública, interesse social e eventual ou baixo impacto ambiental.

Diante disso, órgãos ambientais, demais entes do Poder Público e o próprio Judiciário têm exigido, não raro, a proteção integral a esse ecossistema, retirando, por completo, o potencial construtivo e/ou de uso dos imóveis situados nesses espaços.

Repita-se que, apesar desse entendimento que vinha/vem se enraizando, a legislação federal não elevou esse espaço à posição de Área de Preservação Permanente, de modo que normas municipais também não poderiam fazê-lo, por manifesta incompetência do Município para legislar sobre a matéria.

E foi exatamente nesse sentido que o eg. Tribunal Regional da 4ª Região entendeu, ao julgar a Apelação Cível n. 5011059-30.2010.4.04.7200/SC, tratando de empreendimento erigido em promontório rochoso, no Município de Governador Celso Ramos/SC.

Segundo a referida decisão,  além de a Legislação Federal e/ou a Constituição Federal não terem contemplado os promontórios como biomas protegidos, a Lei do Gerenciamento Costeiro apenas incentiva o uso especial desses espaços, mas não sua intangibilidade, ou seja, outorgou-lhes certo grau protetivo, mas não a necessidade de que sejam preservados em sua integralidade.

No caso, o atual Plano Diretor do Município de Governador Celso Ramos estabelece zoneamento específico ao uso/atividades nas regiões que sejam compostas por promontórios (zoneando-as como Área de Proteção Limitada – APL), de modo que, entendeu o TRF4, a proteção mínima que deve se dar a esses acidentes geográficos teria sido devidamente atingida.

E de fato o foi, pois as áreas zoneadas como APL, apesar de terem certo grau de disponibilidade, pressupõem uso absolutamente restrito/limitado por parte do particular.

A propósito, dá-se destaque para as seguintes passagens do julgado:

DIREITO AMBIENTAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROMONTÓRIOS. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO. BALIZAS PARA SUA UTILIZAÇÃO EM MATÉRIA AMBIENTAL. INAPLICABILIDADE NO CASO CONCRETO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE SITUAÇÃO DE MANIFESTA AUSÊNCIA DE PROTEÇÃO DO NÚCLEO DO DIREITO FUNDAMENTAL TUTELADO PELA ORDEM JURÍDICA.

(…)

Foi mantido um grau de proteção aos promontórios que, registre-se, não estão contemplados como biomas protegidos, seja na legislação de caráter nacional; muito menos na Constituição Federal. Trata-se o promontório de acidente geográfico, ou seja, uma distinta forma de relevo, como o são, por exemplo, uma ilha ou um istmo.

É verdade que a Lei do Gerenciamento Costeiro (Lei nº 7.661/1988) em seu artigo 3º assim estatui: 

Art. 3º. O PNGC deverá prever o zoneamento de usos e atividades na Zona Costeira e dar prioridade à conservação e proteção, entre outros, dos seguintes bens:

I – recursos naturais, renováveis e não renováveis; recifes, parceis e bancos de algas; ilhas costeiras e oceânicas; sistemas fluviais, estuarinos e lagunares, baías e enseadas; praias; promontórios, costões e grutas marinhas; restingas e dunas; florestas litorâneas, manguezais e pradarias submersas;

(…)

Trata-se, entrementes, de norma geral, que incentiva a preservação de alguns biomas e acidentes geográficos; da norma não decorre que os biomas e acidentes geográficos relacionados sejam ipso jure intangíveis. Ao legislador é imposto apenas que na sua atuação tenha a necessária ponderação ao estabelecer o zoneamento de usos e atividades,  priorizando a proteção e, certamente, um standard mínimo de conservação em relação aos biomas e acidentes geográficos relacionados. (grifos nossos)

Desse modo, fica claro que os promontórios, apesar de exigirem especial proteção (essa sim a ser viabilizada pela legislação municipal), não são intangíveis e não podem ser elevados à categoria de Área de Preservação Permanente, justamente nos temos da legislação federal, e do entendimento do TRF4.

Por: Fernanda de Oliveira Crippa

2018-10-31T08:39:54+00:0031 de outubro de 2018|

Possibilidade de conversão das multas ambientais em serviços de preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente

A Lei dos Crimes Ambientais (Lei n. 9.605/98) foi a primeira norma a prever a possibilidade de conversão das multas aplicadas pelos órgãos ambientais em prestação de serviços de melhoria, recuperação e conservação do meio ambiente. Muito embora o tema já fosse objeto de algumas legislações estaduais, somente no ano de 2017, com a edição do Decreto n. 9.179, o assunto foi devidamente regulamentado.

De modo a definir os procedimentos necessários para a conversão, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) editou a Instrução Normativa n. 6/2018.

De início, ressalta-se a prorrogação do prazo da regra de transição, que passou a autorizar que os pedidos de conversão dos autos de infração anteriores à vigência da norma (15 de fevereiro de 2018), de 15 de agosto para 15 de outubro.

Pela sistemática definida, a conversão das multas por serviços ambientais pode se dar de duas maneiras: (i) direta; e (ii) indireta. Na direta, o autuado deve fazer o pedido até o prazo das alegações finais e já apresentar um projeto de natureza ambiental. Se não for possível finalizá-lo em tempo, deverá ser solicitada a prorrogação do prazo ou simplesmente se optar pela conversão indireta. Se nada for requerido, o auto de infração será julgado, não havendo mais a possibilidade da conversão.

Para aqueles que optarem por essa modalidade, o IBAMA irá elaborar um formulário padrão, que conterá todas as informações que devem constar do projeto. Nesse caso, haverá um desconto de 35% do valor da multa.

Na modalidade indireta, o autuado ficará responsável por adquirir uma cota em grandes projetos selecionados pelo IBAMA. O executor serão instituições (públicas ou privadas sem fins lucrativos), que ainda estão sendo definidas pelo órgão ambiental federal e, uma vez finalizado o processo, constarão de um rol taxativo. O agente financiador será a Caixa Econômica Federal.

Atualmente, existem dois projetos com chamamento público, cujas cotas podem ser adquiridas: Bacia do Rio São Francisco e Bacia do Rio Parnaíba. Para aqueles que optarem por aderir a essa modalidade, o desconto no valor da multa será de 60%.

Independentemente da escolha da modalidade, as obrigações do autuado e do órgão ambiental serão definidas em um termo de compromisso que, segundo o próprio IBAMA, será construído de maneira conjunta, de modo que não seja um contrato de adesão.

Importante destacar que a escolha pela conversão e assinatura do termo de compromisso não é vista como uma confissão de culpa, mas uma forma de resolver de forma célere e rápida o processo administrativo, evitando-se desdobramentos futuros desgastantes.

Ainda é muito cedo para se afirmar se o procedimento definido pelo IBAMA dará certo. Não obstante, a iniciativa é válida, pois visa trazer melhorias à  preservação ambiental, ao invés de se pensar apenas em arrecadação.

Por: Lucas Dantas Evaristo de Souza

2018-10-31T08:38:08+00:0031 de outubro de 2018|

Seria possível a instalação de linha de transmissão de energia por entre uma unidade de conservação?

É de conhecimento de todos que no dia 28 de junho do corrente ano foi realizado pela ANEEL leilão de 20 lotes de energia, compostos por 21 linhas de transmissão e 23 subestações espalhadas por 16 estados brasileiros.

Dentre eles, destaca-se o Lote 01, situado em Santa Catarina, que prevê a implantação de cerca de 57,2 km de linhas de transmissão entre o Município de Biguaçu/SC e o Bairro Ratones – em Florianópolis/SC, alcançando investimentos no patamar de R$641,3 milhões de reais.

Apesar do considerável número de candidatos na ocasião, as dificuldades que deverão ser enfrentadas pelo empresariado vencedor não são novidade para ninguém. Excesso de burocracia, demora, elevados investimentos acompanhados de alta tributação, delicado momento em que atravessa a economia do país.

Além desses percalços, existem ainda outros fatores que não raras vezes configuram-se como passivos quase que intransponíveis aos empreendimentos, capazes de desmotivar iniciativas promissoras e necessárias para a coletividade, especialmente quando aliadas a todas as dificuldades colocadas no parágrafo anterior, como por exemplo, a existência de unidade de conservação – UC e/ou área de preservação permanente- APP no âmbito do projeto.

É de se dizer que essa é justamente a realidade do caso em comento (Lote 01).

É que o Município Biguaçu ganhou, em meados de 2017, uma unidade de conservação de proteção integral composta por 1.226 hectares situados na área rural do município (Parque Natural Municipal Serra de São Miguel). A localidade, diga-se de passagem, mostra-se o caminho mais adequado para a instalação das linhas de transmissão. Todavia, considerando se tratar de unidade de conservação, seria possível se valer desse caminho – estrategicamente adequado e economicamente viável- para o fim de implantar estruturas de total interesse da coletividade?

Como dito, a existência dessa nuance, por si só, já seria motivo para muitos se desmotivarem, quiçá desistirem do projeto. Em nosso sentir, todavia, o desanimo deve ser mitigado.

Não se olvida que unidades de conservação de proteção integral, rigorosamente, não são passíveis de intervenção, assim como não o são as áreas de preservação permanente, instituto jurídico diferente, com regime e tratamento distinto, porém, flagrantemente afim àquele.

Partindo dessa premissa, é de se dizer que o regime das APPs prevê expressamente algumas hipóteses permissivas à intervenção na área de especial proteção, quais sejam, atividades de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental (art. 3º, VIII, IX e X da Lei 12.651/2012), dentre elas, destacando-se as obras de energia, contempladas as linhas de transmissão (art. 3º, VIII, b).

Muito embora não haja previsão expressa no mesmo sentido para as unidades de conservação de proteção integral, parece-nos não apenas razoável, mas possível, que se estendam a elas as hipóteses permissivas à intervenção, especialmente em se tratando de atividade de plena utilidade pública e/ou interesse social, como o seria a implantação das linhas de transmissão por entre o Parque Natural de Biguaçu.

Resta-nos agora aguardar a condução do caso.

Por: Lucas São Thiago Soares

2018-07-18T19:57:35+00:0018 de julho de 2018|

Unidades de Conservação no Brasil: um grande passo, mas ainda longe do ideal

Desde sempre, a efetiva implantação de Unidades de Conservação no Brasil foi um problema. Um dos principais fatores que pode ser apontado como responsável por essa circunstância foi a constante falta de recursos financeiros destinados a implementar esses espaços territoriais ambientalmente protegidos (CF/88, art. 225, p. 1o, III), seja no que toca à indenização dos proprietários, seja no que se refere ao investimento na criação da indispensável infraestrutura.

Quanto ao primeiro, diga-se que a Constituição Federal, em seu art. 5o, XXIV, estabelece que a desapropriação deve se dar mediante justa e prévia indenização em dinheiro, mas, na prática, raríssimas vezes isso acontecia em situações reais. Em relação ao segundo aspecto, o fato é que as UCs no Brasil normalmente eram criadas e abandonadas à sua própria sorte, fato que gerou a expressão “parques de papel”, para designar os espaços protegidos criados pelo Poder Público, mas que nunca chegavam efetivamente a ser implantados.

A Lei n. 9.985/00, que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação no Brasil – SNUC, tentou, de alguma forma, mudar este quadro, ao estabelecer a necessidade de uma compensação ambiental em dinheiro a ser paga pelo empreendedor de atividades potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental, que seria destinada justamente à criação e à implantação de UCs (art. 36). O Supremo Tribunal Federal, conquanto tenha alterado em parte o dispositivo (no que se refere aos parâmetros da compensação), considerou-o constitucional, por ocasião do célebre julgamento da ADI n. 3.378-6/DF, Rel. Min. Carlos Ayres Britto.

Por longos anos, contudo, a destinação da verba compensatória sempre ficou a cargo dos órgãos públicos, variando de Estado para Estado a maior ou menor dificuldade em investir na criação e na implementação efetiva de UCs, sendo certo que, de uma maneira geral, a situação inicial em pouco ou em nada mudou.

No último mês de maio, foi aprovada no Plenário do Senado a Medida Provisória n. 809/2017, hoje convertida na Lei n. 13.668/18 que, dentre outros assuntos, autoriza o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a selecionar, dispensando licitação prévia, uma instituição financeira oficial para criar e administrar um fundo privado a ser integralizado com recursos oriundos da compensação ambiental. O mesmo se diga dos demais órgãos estaduais e municipais gestores de UCs em seus respectivos territórios.

Depositado o valor no banco escolhido, o empreendedor tem considerada cumprida a sua obrigação e a instituição financeira irá gerir diretamente os recursos, podendo inclusive realizar a desapropriação de imóveis indicados pelo ICMBio ou pelo gestor estadual/municipal. A novidade é promissora.

Com efeito, estima-se que bilhões de reais que hoje encontram-se represados em fundos de compensação ambiental em todo o país, à espera da desburocratização e da retirada de entraves, possam ser direcionados à desapropriação e à boa gestão das UCS.

Na Exposição de Motivos, que acompanhou a Medida Provisória (EMI n. 00036/2017 MMA MP), afirma-se que o potencial turístico das Unidades de Conservação, apesar de imenso, é subaproveitado, o que se deve justamente a burocracias jurídicas e alguns operacionais específicos. Afirma ainda que, no ano de 2016, foram registrados por volta de oito milhões e trezentos mil visitantes nas Unidades de Conservação federais, principalmente em dois Parques Nacionais (Tijuca e Iguaçu), que possuem infraestrutura para uso público e para serem objeto de parceria com a iniciativa privada.

Aliás, este é outro grande avanço da lei, qual seja a possibilidade – agora expressamente prevista – de concessão, via processo licitatório, de serviços, áreas ou instalações de UCs para a exploração de atividades de visitação voltadas à educação ambiental, à preservação e à conservação do meio ambiente, turismo ecológico, etc. A experiência tem revelado que, uma vez transferidas à iniciativa privada, essas atividades em geral passam a ter eficácia e qualidade superiores.

Como se sabe, o nosso modelo de UCs inspirou-se, em grande medida, nos Estados Unidos, país onde foi criado o primeiro Parque Nacional do planeta (Yellowstone, que alcança o território de três Estados daquela Federação) e exemplo de gestão desses espaços. Contudo, na prática, estamos muito distantes de atingir os níveis desejáveis de desenvolvimento das UCs. A lei que acaba de ser editada pode representar um importante passo na busca da possibilidade de permitir o desenvolvimento destes importantes espaços protegidos brasileiros, que muito têm a contribuir para a conservação da natureza.

Por: Marcelo Buzaglo Dantas

2018-07-18T19:48:04+00:0018 de julho de 2018|

O que é REURB?

Com o objetivo de resolver importantes problemas do ordenamento territorial brasileiro, em 11 de julho de 2017, foi promulgada a Lei Federal nº 13.465, resultante da conversão legal da Medida Provisória 759/16, e, no último dia 15 de março de 2018, o Decreto Federal nº 9.310, que dispõem sobre o processo de regularização fundiária urbana, estabelecendo procedimentos e diretrizes a serem seguidos pelos Poderes Públicos e particulares.

Dentre as principais inovações, a Lei e o Decreto se destacam por terem criado o instrumento jurídico da Regularização Fundiária Urbana, denominado REURB, que nada mais é do que um conjunto de normas gerais que estabelecem as medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais a serem adotadas para incorporação dos núcleos urbanos informais (núcleos em situação irregular e sem titulação dos ocupantes) ao ordenamento territorial.

Ainda, as normas se destacam por terem criado duas modalidades de REURB: (i) Regularização Fundiária Urbana de Interesse Social (“REURB -S”), que corresponde à regularização fundiária aplicável aos núcleos urbanos informais ocupados predominantemente por população de baixa renda; e a (ii) Regularização Fundiária Urbana de Interesse Específico (“REURB -E”), que objetiva a regularização fundiária de núcleos informais ocupados por população não qualificada na hipótese da primeira modalidade.

Tanto no caso da REURB-S, como na REURB-E, poderão requerer a sua instauração: os proprietários dos imóveis ou dos terrenos, os loteadores ou os incorporadores; os seus beneficiários, individual ou coletivamente, diretamente ou por meio de cooperativas habitacionais, associações de moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público ou outras associações civis; a Defensoria Pública; o Ministério Público; e a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, diretamente ou por meio de entidades da administração pública indireta.

E não é só. A Lei Federal nº 13.465/2017 também inovou ao trazer a aplicação desses instrumentos jurídicos à Lei Federal nº 12.651/2012 (artigos 64 e 65 do novo Código Florestal), regulamentando, assim, a possibilidade de regularização das áreas urbanas consolidadas que ocupam áreas de preservação permanente.

Segundo os dispositivos inseridos no novo Código Florestal, é autorizada a regularização fundiária de áreas urbanas consolidadas em áreas protegidas, mas desde que seja elaborado estudo técnico demonstrando a melhoria das condições ambientais do imóvel em relação à situação anterior a ser apresentado em procedimento administrativo próprio, de acordo com as fases estabelecidas pelo Decreto Federal nº 9.310/2018.

No entanto, em que pesem os importantes avanços da novel legislação no que tange à regularização dos espaços urbanos, assim como no caso do novo Código Florestal, a sua validade ficará condicionada à declaração de constitucionalidade do Supremo Tribunal Federal (“STF”).

De fato, antes mesmo da promulgação do Decreto Federal nº 9.310/2018, três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI 5771, 5787 e 5883) foram propostas perante o STF, questionando, desde o processo de criação da Lei Federal nº 13.465/2017 (via Medida Provisória quando inexistia urgência), até vícios materiais como a afronta ao princípio da proibição do retrocesso social.

Dessa forma, embora REURB surja como importante instrumento de desburocratização do procedimento de regularização fundiária urbana, resta-nos, agora, aguardar o posicionamento do STF sobre a sua constitucionalidade para ver esse instrumento aplicado na prática.

Por: Otávio Augusto do Espírito Santo Neto e Gabriela Giacomolli

2018-06-06T14:53:52+00:006 de junho de 2018|

Súmula 613 do STJ e a Teoria do Fato Consumado

Não é de hoje que a teoria do fato consumado em matéria ambiental vem sendo sumariamente rechaçada pelos Tribunais de todo o país.

Na visão dos aplicadores do direito, admitir-se referida teoria equivaleria a consentir com o “direito de poluir”, ou, nas palavras do Min. Herman Benjamim, a “teoria do fato consumado em matéria ambiental equivale a perpetuar, a perenizar suposto direito de poluir, que vai de encontro, no entanto, ao postulado do meio ambiente equilibrado como bem de uso comum do povo essencial à sadia qualidade de vida” (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.447.071)

Mas, afinal, o que significa a teoria do fato consumado?

A ideia de “fato consumado” iniciou por situações de inércia do Estado, por longo lapso temporal, que passaram a ensejar uma espécie de “direito adquirido” do jurisdicionado, no sentido de se permitir que este continue atuando nos moldes que vinham sendo “tolerados”, ainda que eventualmente de forma precária ou até mesmo contra legem.

Exemplo clássico de aplicação da Teoria do Fato Consumado está no célebre acórdão de relatoria do Ministro Humberto Martins, que, no REsp 709934, assim entendeu sobre o tema:

Impõe-se, no caso, a aplicação da Teoria do Fato Consumado, segundo a qual as situações jurídicas consolidadas pelo decurso do tempo, amparadas por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais. Recurso especial conhecido em parte e improvido. (REsp 709.934/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/06/2007, DJ 29/06/2007, p. 531, grifos nossos)

Diante dessa tendência, a “teoria do fato consumado” passou a ser arguida como tese de defesa nos Tribunais em diversas situações, como, por exemplo, para processos envolvendo concursos públicos, ingresso em universidades, colação de grau, etc.

A tese acabou ganhando respaldo também no Direito Ambiental. Profissionais da área passaram a utilizá-la – vulgarizando-a, diga-se de passagem – para dar guarida a situações consumadas, ainda que ilegais: prédios que eram ultimados mesmo com embargos administrativos e/ou judiciais, construções em áreas cujo zoneamento jamais permitiu aquela atividade, dentre tantas outras.

De certa maneira, ainda que de forma excepcionalíssima, os Tribunais vinham aceitando essa tese, a fim de, em determinados casos, salvaguardar situações consolidadas no tempo.

Mas, referida teoria pode/deve ser aplicada indiscriminadamente em demandas que envolvam o Direito Ambiental?

A fim de solucionar essa controvérsia, e extirpar o chamado “direito adquirido de poluir”, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 613, com a seguinte redação: “Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito Ambiental”.

Ocorre que, da interpretação literal do texto sumular, situações genericamente consolidadas/consumadas em matéria ambiental, não mais poderão ser arguidas como tese de defesa e/ou reconhecidas para salvaguardar eventuais direitos.

Mas será que é esse o intuito da Súmula?

Ora, o que são os chamados núcleos urbanos informais, nos termos do art. 11, II e III, da recentíssima Lei de Regularização Fundiária (Lei 13.465/2017), senão situações jurídicas consolidadas pelo decurso do tempo?

Ou ainda, os ditames dos artigos 23 e 24 da também recentíssima Lei Federal nº 13.655/2018 que, ao alterar dispositivos da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, previu expressamente a necessidade de observância a situações plenamente constituídas/consolidadas/consumadas?

E, por fim, o recente julgamento do STF sobre a constitucionalidade do Novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), que anuiu com 32 dos 40 dispositivos impugnados (http://buzaglodantas.adv.br/2018/03/stf-encerra-o-julgamento-sobre-o-novo-codigo-florestal/), donde incluem-se os artigos relativos à regularização urbana, reserva legal, dentre outros?

Ora, embora absolutamente louvável a intenção da Súmula n. 613 do STJ, cotejando-a com as recentíssimas normas em vigor, tem-se por certo que referido enunciado sumular não poderá ser aplicado indistintamente, mas de acordo com o caso concreto, nas hipóteses em que haja, de fato, má-fé por parte do jurisdicionado e/ou absoluta ilegalidade dos atos.

Não se pode ignorar que situações – seja no âmbito do direito civil, penal, e até mesmo ambiental –, muitas vezes com o aval do próprio Poder Público e sem má fé do jurisdicionado, acabam se consolidando no tempo, como por exemplo: empreendimentos que são aprovados e licenciados, e têm seu zoneamento alterado no interregno das obras; mudanças repentinas de normativas e/ou entendimentos jurisprudenciais sobre determinados espaços; perda absoluta da função ambiental de algumas áreas; dentre tantas outras.

Essas situações não podem ser simplesmente ignoradas ou extirpadas do ordenamento jurídico, devendo ser analisadas e balizadas em cada caso específico.

É claro que a edição da referida súmula é absolutamente salutar nos dias de hoje, como forma de coibir o desenfreado uso dos recursos naturais ainda existentes (principalmente no Brasil) e não dar guarida ao chamado “direito de poluir” – que, por óbvio, não existe.

No entanto, o novel enunciado deverá ser interpretado de forma genérica e de maneira a se amoldar aos contornos das também recentes normativas editadas, que parecem se contrapor ao teor da Súmula – se interpretada ao pé da letra.

O que se espera é que referidos enunciados (leis e súmula), possam ser interpretados da melhor maneira possível, e de forma a garantir o equilíbrio entre meio ambiente e a viabilidade das atividades econômicas.

Por: Fernanda de Oliveira Crippa

2018-06-06T14:47:43+00:006 de junho de 2018|

Novos procedimentos no licenciamento ambiental mineiro

O Governo de Minas Gerais publicou, no dia 03 de março, o Decreto Estadual nº 47.383/2018, substituindo integralmente o Decreto Estadual nº 44.844/2008 e trazendo mudanças significativas nos procedimentos ambientais, sobretudo no processo de licenciamento, na fiscalização ambiental e na aplicação das penalidades, tendo como objetivo a sua atualização e desburocratização.

O intuito da nova legislação é adequar as normas do licenciamento ambiental às recentes alterações lançadas na Deliberação Normativa n. 217/2017 e na Deliberação Normativa n. 219/2018, do Conselho Estadual de Política Ambiental – COPAM, no âmbito do processo de reformulação do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – SISEMA, que tem sido promovido desde a publicação da Lei Estadual nº 21.792/2016.

Dentre as principais alterações, merece destaque: (i) o detalhamento dos procedimentos de Licenciamento Ambiental Simplificado – LAS) e de Licenciamento Ambiental Concomitante – LAC; (ii) a definição de novos critérios para classificação dos empreendimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais; (iii) a delimitação de regras relativas à fixação das condicionantes ambientais; e, (iv) novas regras quanto à fiscalização e as penalidades ambientais.

No que toca à fiscalização ambiental, a legislação inova ao possibilitar a lavratura e processamento do auto de infração por meio eletrônico, em conformidade com o disposto no Decreto Estadual nº 47.222/2017.

Outra novidade é a criação do Termo de Compromisso para Conversão de Multa (TCCM), que possibilita a conversão das multas simples em serviços de preservação, melhorias e recuperação da qualidade ambiental.

Em relação às condicionantes ambientais, merece destaque a obrigatoriedade de fundamentação técnica por parte do órgão ambiental, inclusive apontando a relação direta com os impactos ambientais da atividade ou empreendimento.

E não é só. O Decreto Estadual nº 47.383/2018 também se destaca por estabelecer novos critérios para ampliação de atividades ou empreendimentos e para a renovação do licenciamento ambiental, estabelecendo regras gerais para o encerramento e paralisação temporária de atividades.

Outro ponto relevante diz respeito à instituição de regras gerais sobre penalidades e infrações ambientais, dispondo sobre autuação, aplicação de penalidades, apresentação de defesa, instrução processual, julgamento e interposição de recurso entre outros.

Desse modo, pode-se concluir que o objetivo da nova legislação mineira é modernizar o licenciamento ambiental estadual, conferindo-lhe maior celeridade na emissão de licenças e evitar condicionantes que não tenham relação com os impactos gerados pela atividade ou empreendimento.

Por: Elisa Ulbricht

2018-04-11T14:32:41+00:0011 de abril de 2018|

A importância da Lei Geral do Licenciamento Ambiental

Não é segredo para ninguém que tramita no Congresso Nacional, há mais de 13 anos, o Projeto de Lei n. 3.729/2004, cujo objetivo é criar uma lei geral para o licenciamento ambiental. De fato, a iniciativa é absolutamente válida, pois um tema dessa importância não pode ser definido por decretos e/ou resoluções, como historicamente aconteceu e ainda acontece.

A própria Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, §1º, IV, determinou ao Poder Público exigir, mediante lei, o licenciamento ambiental para as atividades/empreendimentos potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental. Lei, por certo, não se equipara às resoluções do CONAMA (01/86 e 237/97), que eram/são as principais normas a tratar do tema.

Se tanto não bastasse, trata-se de normas que datam, pelo menos, de mais de duas décadas. Daqueles períodos até os dias de hoje, o Brasil passou por diversas e significativas mudanças. A legislação ambiental precisa estar adequada à realidade atual, sob pena de se tornar defasada, não ser aplicada ou simplesmente descumprida. Dai a importância da nova legislação que está para surgir.

O texto, que já passou pela análise de algumas comissões e, ao longo do tempo, sofreu diversas alterações, seja por sugestões políticas, seja por manifestações oriundas da iniciativa privada, do Ministério Público ou dos órgãos ambientais, hoje se encontra praticamente pronto para ser votado, o que deve acontecer dentro em breve.

Sem adentrar no conteúdo propriamente dito, que, como normalmente acontece, não agradará a todos, até porque envolve diferentes atores e distintos interesses, o fato é que o projeto representa um significativo avanço, não só porque regulamentará o tema mediante lei (antes era disciplinado por resoluções do CONAMA), mas também porque, após todo o período de tramitação, a versão final possui muito mais pontos positivos do que negativos.

Vale ressaltar ainda que o projeto tende a dar maior segurança jurídica aqueles que pretendem empreender no País. Inclusive, é isso que os empreendedores corretos buscam e sempre buscaram: segurança para trabalhar, sem se preocupar com surpresas ou percalços.

De um modo geral, portanto, o projeto de lei a ser votado é satisfatório e se aprovado será um marco regulatório próprio, adequado e de grande relevância para o trato da matéria, até porque o licenciamento ambiental é o instrumento mais eficaz para a promoção do desenvolvimento sustentável.

Por: Lucas Dantas Evaristo de Souza

2018-04-11T14:31:30+00:0011 de abril de 2018|

O MEIO AMBIENTE EM PRIMEIRO LUGAR

A possibilidade de conversão de multas simples, aplicadas por conta de infrações ambientais, em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente é instrumento já previsto no ordenamento jurídico ambiental desde os idos de 98 (Lei Federal 9.605/98).

Muito embora a sua utilização tenha sido recentemente regulamentada pelo Dec. 9.179/2017, a normativa exigiu expressamente que, para que pudesse utilizar do instrumento, o órgão federal emissor da multa deveria também editar normativa própria regulamentando o procedimento.

Especialmente no âmbito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, foi publicada, em 15 de fevereiro de 2018, a Instrução Normativa n. 06/2018, responsável justamente por estabelecer as regras e critérios para, de fato, se proceder a conversão da multa simples em serviços pró-meio ambiente no âmbito de sua competência.

Além de indicar as hipóteses, ações, atividades e obras caracterizadas como “ de preservação, melhoria e recuperação”, merece destaque o fato de que a normativa foi taxativa ao proibir a convolação dos valores arbitrados na infração em bens e serviços entregues diretamente ao IBAMA.

Nesse ponto, percebe-se que, muito embora tenham sido previstas 03 exceções para a vedação da prática (fornecimento de alimentos, medicamentos e apoio cientifico às atividades de reabilitação de animais acolhidos pelo Centro de Triagem de Animais Silvestres- CETAS), merece aplausos a tentativa do ente administrativo de impedir o mau uso do instrumento, ou seja, obstaculizando que ele seja utilizado para qualquer fim que não o atendimento ao seu objetivo precípuo (compensar diretamente o meio ambiente).

Nessa mesma linha, fica também evidenciada a busca por vedar qualquer tentativa de utilização do mecanismo para benefícios e interesses particulares, escusos, o que por certo também merece deferência.

Sobre o procedimento em si, vale comentar que a discricionariedade do órgão para decidir pelo deferimento, ou não, da concessão do “benefício”, encontra-se preservada.

Da parte do autuado, basta apenas que cumpra os requisitos dispostos na normativa. Vale frisar que é imprescindível que o requerimento seja realizado até o momento processual das alegações finais, ou seja, quando o processo ainda está sob a tutela do 1º grau de jurisdição administrativa. Na mesma ocasião, o autuado deverá informar a modalidade de conversão a que pretende se valer (se direta ou indireta, ambas regulamentadas pela própria Instrução Normativa).

É de se dizer, aliás, que caso o autuado não cumpra algum desses requisitos, pela redação dada pelo regramento, perecerá o seu direito de se valer do instrumento da conversão.

Saliente-se, ademais, que o deferimento do pedido de conversão suspende automaticamente o prazo de apresentação do recurso hierárquico, o que se mostra extremamente razoável, de vez que incentiva um acordo que só tem a beneficiar o meio ambiente, sem prejuízo na manutenção do amplo direito de defesa para o caso de insucesso na composição.

Vale lembrar que, aos casos ainda em andamento, mesmo que anteriores a data de publicação da normativa comentada, permitir-se-á o comparecimento no feito para pleitear o uso do instrumento, diga-se, independentemente de já se ter superado a etapa das alegações finais.

Por fim, ressalta-se que tal possibilidade apenas será permitida para aqueles que comparecerem aos processos dentro de até 180 dias da publicação da portaria, ou seja, até 15 de agosto de 2018. Do contrário, fica prejudicado o benefício em questão.

Por: Lucas São Thiago Soares

2018-03-06T21:27:01+00:006 de março de 2018|

STF ENCERRA O JULGAMENTO SOBRE O NOVO CÓDIGO FLORESTAL

No último dia 28 de fevereiro de 2018, o STF finalmente pôs fim à insegurança jurídica acerca da aplicação do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), e considerou constitucionais 32 dos 40 dispositivos impugnados pelas quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIns 4901, 4902, 4903 e 4937) e por uma Ação Declaratória Constitucionalidade (ADC 42).

Como se sabe, após a publicação da Lei nº 12.651/2012, que objetivava a conciliação da proteção ambiental com a viabilidade das atividades econômicas, uma verdadeira celeuma foi criada em torno do novo ordenamento ambiental.

Em meados 2013, a Procuradoria-Geral da República ingressou com as ADIns 4901, 4902, 4903 e, o Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, com a ADIn 4937 visando à declaração de inconstitucionalidade de diversos dispositivos, sob alegação de afronta ao chamado princípio da proibição do retrocesso ecológico. Tais dispositivos versam sobre três temas centrais: (i) reserva legal; (ii) mecanismos de sanção e reparação ambiental; e (iii) áreas de preservação permanente.

Dois anos depois, a fim de fortalecer o posicionamento da bancada ruralista, o Partido Progressista – PP também propôs a ADC 42, objetivando exatamente o oposto: a declaração de constitucionalidade dos mencionados dispositivos, diante da necessidade de garantir a instituição de uma política pública que, após a realização de diversas audiências públicas e anos tramitando no Congresso, finalmente acreditava-se consolidada.

Pois bem. Em julgamento tomado por apertada maioria de votos e que desde já pode ser considerado histórico para o Direito Ambiental, na tarde do último dia 28, o STF considerou constitucional a maior parte dos dispositivos do novo Código Florestal, por entender que as normas devem ser interpretadas de maneira sistêmica, não isolada, de modo que a nova normativa, se analisada como um todo, garante, sim, a tutela ambiental.

Apesar da divergência de posicionamento entre os Ministros, o decano Celso de Mello desempatou a votação, colocando uma pá de cal em pontos polêmicos do novo Código, como o instituto da anistia que, após muitas discussões pelo plenário, foi mantido em sua integralidade, por entender que não se trata de anistia ampla e irrestrita, já que o novo Código prevê a necessidade de compensação pelos danos ocasionados ao meio ambiente.

Outro ponto polêmico do novo Código Florestal também restou superado: a constitucionalidade da redução da reserva legal em municípios da Amazônia que tenham mais da metade de seu território ocupado por terras indígenas e unidades de conservação (de 80% para 50%).

Mas não é só. O julgamento também trouxe pontos importantes para a preservação do meio ambiente, como a impossibilidade de realizar obras de infraestrutura destinadas à “gestão de resíduos sólidos” e “instalações necessárias à realização de competições esportivas” em áreas de preservação permanente e o reconhecimento dos entornos de nascentes e olhos d´água intermitentes como áreas a serem protegidas.

Em que pesem as discussões e inúmeras controvérsias sobre o assunto, é fato que o julgamento trouxe um alento não só ao produtor rural, como às entidades ambientais envolvidas, que, nos últimos anos, muito têm se esforçado em busca da regularização ambiental no Brasil.

Aprove-se ou não o resultado, o fato é que o STF cumpriu o seu papel de Corte Constitucional e, com relativa celeridade (dada a complexidade da matéria debatida), enfrentou um dos temas mais candentes do Direito Ambiental Brasileiro na atualidade e afastou a insegurança jurídica que girava em torno da matéria desde a edição da nova lei.

Desse modo, embora a decisão ainda se encontre pendente de recurso (embargos de declaração), é incontroverso que o julgamento é um marco na interpretação jurídica ambiental no país.

Por: Marcelo Buzaglo Dantas e Gabriela Giacomolli

2018-03-06T21:26:16+00:006 de março de 2018|
Go to Top