FINANÇAS SUSTENTÁVEIS E A RESOLUÇÃO CVM N. 193

Em um contexto de mudanças climáticas, empresas e organizações precisam estar atentas às necessidades e desafios de uma economia que busca a convergência com a agenda da sustentabilidade.

Os impactos ambientais, sociais e econômicos das mudanças climáticas também já são observados em todo o planeta, que atinge níveis de temperatura recordes a cada ano. Nesse sentido, a responsabilidade coletiva por um futuro possível motiva a necessidade de sustentabilidade no âmbito corporativo, a mudança do paradigma coletivo que estamos passando com a urgência da pauta climática impulsiona a transformação no modelo empresarial que deve se adaptar às exigências da pauta sustentável. Nesse contexto se insere o Environmental, Social and Governance (ESG), um conceito que busca observar as empresas e as relações comerciais com base nos seus compromissos e práticas no âmbito ambiental, social e de governança.

Para internalizar os objetivos ambientais e sociais alguns pontos são essenciais para as empresas, como a avaliação de riscos da cadeia de suprimentos e a atenção para as práticas de sustentabilidade com o objetivo final da criação de confiança com os stakeholders por meio de projeções a longo prazo da empresa.

Com a rápida evolução tecnológica e a exigência do mercado para que as empresas possuam propósito social e ambiental, somente entidades com propósito e visão de futuro trarão valor para seus investidores, parceiros e colaboradores.

Assim, surge o conceito das finanças sustentáveis, que possui como pressuposto a avaliação por parte dos investidores da gestão de risco ambiental e da consciência ecológica dos negócios investidos. Fomentando, portanto, a implementação de práticas de ESG na estratégia corporativa para atração e retenção de investimentos externos.

Os riscos relacionados às mudanças climáticas se tornam também oportunidade para as empresas que se comprometem com a pauta ambiental e ativamente aplicam as diretrizes do ESG.

Atualmente, diversos indicadores já são utilizados para avaliar o desempenho de empresas no quesito sustentabilidade e oferecem subsídios para investidores, consumidores e parceiros comerciais. Entre eles, os indicadores IFRS S1 (General Requirements for Disclosure of Sustainability-related Financial Information) e o IFRS S2 (Climate-related Disclosures, emitidos pelo International Sustainability Standards Board (ISSB) trazem transparência na elaboração de relatórios de sustentabilidade por serem standards globais. O objetivo desses indicadores é direcionar e facilitar a tomada de decisão de investidores e colaboradores na escolha de empresas com bons índices no aspecto ambiental.

Com base nesse padrão internacional da ISSB, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) emitiu a Resolução n. 193 que busca regulamentar os documentos de sustentabilidade produzidos pelas empresas brasileiras. Essa resolução não somente padroniza as divulgações de sustentabilidade, mas facilita a avaliação financeira das medidas sustentáveis corporativas, tais como metas de diminuição das emissões de gases poluentes na produção, gestão da cadeia de fornecedores, reflorestamento de áreas desmatadas, entre outras.

A CVM justifica essa resolução com base nos benefícios que as normas de divulgação de informações de sustentabilidade criadas trazem para os investimentos relacionados à sustentabilidade. Dessa forma, promove-se a publicação de relatórios confiáveis, consistentes e preparados para as exigências das melhores práticas comerciais internacionais.

Segundo a resolução que: “Dispõe sobre a elaboração e divulgação do relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, com base no padrão internacional emitido pelo International Sustainability Standards Board – ISSB” a divulgação das informações conforme o ISSB se tornará obrigatório para toda empresa brasileira de capital aberto a partir de 2026, sendo voluntária a adoção dos critérios propostos até a data prevista.

Percebe-se, portanto, que a nova regulamentação vai de encontro com o status atual do mercado brasileiro, que busca corporações ativamente envolvidas no estabelecimento de políticas internas condizentes com o desenvolvimento sustentável e a adaptação de sua produção ao modelo econômico ecologicamente consciente.

Por: Luna Dantas

2023-10-25T21:04:58+00:0025 de outubro de 2023|

A POSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DE ESTRUTURAS EM APP QUANDO A DEMOLIÇÃO NÃO COMPROVAR SER MEIO EFICAZ PARA RESTAURAÇÃO AMBIENTAL

Conforme conceito constante do Novo Código Florestal, Lei Federal n. 12.651/2012, considera-se Área de Preservação Permanente (APP) a “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” (art. 3º, II).

Sendo assim, é vedado qualquer tipo de intervenção em APP, com exceção dos casos em que seja considerada de utilidade pública, de interesse social o de baixo impacto ambiental, devendo o proprietário, em regra, obter a respect5iva autorização junto ao órgão ambiental.

A falta de autorização para intervenção em APP pode ocasionar a lavratura de Auto de Infração Ambiental pelo órgão fiscalizador competente, bem como o particular ou empreendimento ter movida contra si ações judiciais nos âmbitos criminal e cível, que poderão requerer a determinação da demolição das construções.

Todavia, tratando aqui especificamente sobre a possibilidade/necessidade de demolição de construções inseridas em APP, ressalta-se que há de se considerar a individualidade e as peculiaridades de cada situação e cada espaço ambiental cuja proteção se discute.

O que ocorre é que, em diversas situações, o retorno do meio ambiente afetado por determinada infraestrutura ao seu status natural – leia-se, com a efetiva recuperação de suas funções ambientais originárias –, é praticamente ou totalmente impossível, razão pela qual deve-se analisar o caso concreto com a máxima razoabilidade e proporcionalidade, com o fim de não talhar determinado direito fundamental em detrimento de uma desproporcional pretensão demolitória que jamais alcançará seu objetivo.

Não se nega que há de se garantir à sociedade o seu direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, todavia há de se ponderar se a demolição isolada de determinada estrutura contribuirá ou não para a preservação ambiental ou se, de alguma forma, trará benefícios à coletividade.

Um caso muito similar foi decidido recentemente por Magistrada da 6ª Vara Federal de Florianópolis/SC, ao concluir pela viabilidade de manutenção de estrutura localizada próxima às margens do Canal da Barra da Lagoa, na capital catarinense.

No entender da Magistrada, embasada em informações obtidas através de laudo pericial produzido na ação civil pública em questão, o processo de antropização de todo o entorno do local evidencia a ineficácia da recuperação ambiental apenas no imóvel em que se pretende a demolição.

Ou seja, prevaleceu o entendimento de que o desfazimento das estruturas naquela situação não haveria finalidade ou utilidade já que “incapaz de restaurar o equilíbrio ecológico do ecossistema que se pretende preservar ou ao menos do seus atributos essenciais mínimos”.

Assim, é forçoso concluir que as decisões judiciais devem dotar-se de razoabilidade e proporcionalidade antes de se determinar a drástica medida de demolição de um imóvel sendo que, a depender do caso, benefício algum será trazido ao meio ambiente ou à coletividade.

Há de se ponderar os diversos valores envolvidos em cada caso concreto, seja paisagístico ou social, além de eventual consolidação de determinada infraestrutura ao longo dos anos ou mesmo a compatibilidade de sua manutenção com preservação ambiental e o paralelo exercício de atividades econômicas ou de moradia.

Link para acesso à referida sentença: Clique Aqui 

Por: Otávio Augusto do Espírito Santo Neto

2023-10-19T14:05:14+00:0019 de outubro de 2023|

COMISSÃO DO MEIO AMBIENTE DO SENADO APROVA PROJETO DE LEI QUE VISA A REGULAMENTAÇÃO DO MERCADO DE CRÉDITOS DE CARBONO NO BRASIL

Na última quarta-feira, dia 04/10/2023, à unanimidade de votos, foi aprovado pela Comissão do Meio Ambiente do Senado o Projeto de Lei n. 412/2022 que regulamenta o mercado de créditos de carbono no Brasil. Referido Projeto será encaminhado para tramitação final junto à Câmara de Deputados.

Já falamos anteriormente neste periódico que o mercado de créditos de carbono, de um modo geral, busca controlar e diminuir o aumento da emissão dos gases de efeito estufa, provocadores de significativos impactos ambientais em escala global, em sua grande maioria associados às mudanças climáticas. Trata-se, portanto, de importante instrumento para que sejam cumpridas as metas de redução de emissões assumidas não só pelo Brasil, como por diversos outros países nas no Acordo de Paris (COP21), além das determinações estabelecidas na Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC, Lei n. 12.187/2009.

O Projeto de Lei prevê a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que servirá de regulador e fiscalizador do mercado através da previsão de cotas de emissão anual a serem distribuídas aos operadores.

As metas nacionais para redução das emissões serão estabelecidas através de um Plano Nacional de Alocação (PNA), a ser elaborado pelo próprio SBCE, que definirá a quantidade de emissões permitidas a cada operador, sendo que cada Cota Brasileira de Emissões (CBEs) equivalerá a 1tCO²e. Ou seja, cada cota equivale a um ativo disponível à comercialização.

Estarão sujeitos às regras as empresas que emitirem acima de 10 mil toneladas de gás carbônico por ano, sendo que aqueles que tiverem emissões acima de 25 mil toneladas, estarão sujeitos a um regramento mais rígido. O descumprimento das regras poderá ocasionar na aplicação de uma multa de até 5% no faturamento bruto da empresa, além de outras medidas como: a) o embargo de atividade; b) a perda de benefícios fiscais e linhas de financiamento; c) a proibição de contratação com a administração pública por três anos; e d) o cancelamento de registro.

É crucial destacar que, caso aprovado, o projeto estabelecerá um prazo de transição para entrada em vigor do regramento, havendo um período de até dois anos para que seja regulamentado o sistema e, posteriormente, mais dois anos para que os operadores sejam obrigados a respeitar as metas de emissões.

Vale dizer que a grande crítica que envolve a aprovação do Projeto de Lei diz respeito à exclusão das atividades de produção primária agropecuária, além de produção de insumos ou de matérias-primas agropecuárias, da regulação de emissões. E a justificativa para tal “exclusão” é: a dificuldade em se mensurar o nível de emissão das atividades específicas, além da importância do setor para a segurança alimentar do país.

Ao que se observa, embora “atrasado” em relação a diversos outros países, o Brasil finalmente caminha para a regulação do mercado de créditos de carbono, que só em 2022, movimentou cerca de 100 bilhões de dólares no mundo. Isso demonstra a importância do incentivo econômico para que sejam efetivamente reduzidos os impactos ambientais, principalmente quanto às mudanças climáticas.

Por: Bianca Silva

2023-10-11T19:45:39+00:0011 de outubro de 2023|

INTERPRETAÇÃO DISTORCIDA DAS ÁREAS TRADICIONAIS DO DIREITO EM MATÉRIA AMBIENTAL

Já não é mais novidade que, em matéria ambiental, as regras básicas dos tradicionais ramos do direito – que se aprende lá no início da faculdade – têm sua interpretação distorcida em prol do que se considera um “interesse” maior.

Como exemplo, pode-se citar, do direito administrativo, os atos vinculados da administração pública, que somente poderiam ser anulados em caso de flagrante ilegalidade ou interesse público superveniente. A licença ambiental, no entanto, que deveria gozar de presunção de veracidade, por vezes, é anulada sem que nenhuma das hipóteses estejam presentes. Isto sem falar na indevida interferência do Poder Judiciário no mérito administrativo, frequentemente identificada em demandas jurídicas-ambientais.

O mesmo se diga do direito constitucional. Há garantia expressa acerca da garantia do direito adquirido, ato jurídico perfeito e fato consumado. Na matéria ambiental, porém, há súmula do Superior Tribunal de Justiça acerca da inexistência do direito adquirido de “poluir”, como se tudo que envolvesse o meio ambiente fosse degradante.

Ainda, quase considerada como cláusula pétrea, tem-se do direito criminal que, na dúvida, o réu deve ser absolvido. Contudo, já se observou na prática situações em que se aplicou o in dubio pro natura, ou seja, na dúvida, condena-se por crime ambiental.

Por fim, do direito civil, a famosa responsabilidade civil. No direito ambiental, flexibiliza-se os elementos configuradores do dever de indenizar, não se exigindo a presença de todos. Assim, na matéria ambiental, aplica-se a teoria do risco integral, diretamente ligada a chamada responsabilidade objetiva, ou seja, não importa se houve dolo ou culpa, quem estiver direta/indiretamente envolvido, tem o dever de reparar o meio ambiente degradado, ainda que não tenha dado causa ou dele tenha concorrido.

As distorções são flagrantes e cada vez mais temerárias. Não se olvida a importância do meio ambiente, alçado pela Constituição Federal de 1988, como direito fundamental. Não obstante, há outros direitos fundamentais de igual ou até maior relevância, de modo que não se pode/deve admitir (como vem acontecendo) que as teorias gerais das áreas do direito sejam desvirtuadas para privilegiar a matéria ambiental, como se esta fosse hierarquicamente superior a qualquer outra.

É bem verdade que haverá situações em que o meio ambiente deve se sobressair sobre outras questões. Muitas das vezes, inclusive. Não obstante, isto não pode ser a máxima como atualmente o cenário jurídico aponta.  Há um desiquilíbrio da tutela jurisdicional muito grande: parte-se da premissa da responsabilização ao menos que se prove o contrário, ou seja, inverte-se a ordem processual – a chamada inversão do ônus da prova, aplicada indistintamente nas demandas coletivas ambientais.

Já se perdeu muito tempo, mas ainda há esperanças de reverter o cenário jurídico atual. Sempre há uma luz no fim do túnel.

Por: Lucas Dantas Evaristo de Souza

2023-10-04T16:45:24+00:004 de outubro de 2023|

BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA (REURB)

Entende-se a Regularização Fundiária como o processo que inclui medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais, com a finalidade de integrar assentamentos/núcleos irregulares ao contexto legal do espaço urbano.

Na prática, a REURB é um conjunto de medidas que tem por objetivo a integração de núcleos irregulares ao funcionamento do espaço citadino, de modo a torna-los regulares aos olhos do poder público, sobretudo nos aspectos registral, urbanístico e ambiental. É que tais assentamentos, embora muito comuns, trazem insegurança permanente aos seus ocupantes, uma vez que estes não dispõem dos títulos aptos a defender sua posse e/ou propriedade sobre os imóveis em que habitam.

Nesse sentido, foram criados dois tipos de enquadramentos para as regularizações: a) de interesse social, destinado as pessoas de baixa renda e com finalidade residencial, com a gratuidade das taxas de registro e de toda a infraestrutura básica; e b) de interesse especifico, custeado na sua totalidade pelo particular.

Em ambas situações descritas acima, o órgão competente para aprovação é o Município, por decisão administrativa, através de requerimento, por escrito de um dos interessados. E, em caso de indeferimento, o ente Municipal deverá indicar quais as medidas devem ser tomadas para atender a reavaliação do requerimento.

Além disso, em que pese o alvo precípuo da lei tenha sido o ambiente urbanizado, a regularização poderá ser aplicada a imóveis em áreas rurais – desde que a destinação da regularização seja para núcleos urbanos e/ou conjuntos habitacionais. Nesta situação, deverá ser custeada pelo poder público. Lembrando que, para estes imóveis, o módulo rural deve ser menor do que a fração mínima de parcelamento do local.

A justificativa dessa flexibilização é simples: a REURB representa um encontro entre diversas discussões sociais, dentre elas, o meio ambiente, o urbanístico, a mobilidade, o saneamento básico, acesso a serviços públicos, direito a cidade e etc. Ou seja, sendo esse instrumento um caminho para uma melhoria das condições dos núcleos urbanos informais e da qualidade de vida da população, sua aplicabilidade deve ser estendida a todos os ambientes em que seus efeitos positivos possam ser devidamente implementados.

Dessa forma, mais pessoas poderão ter os seus direitos devidamente registrados em cartório, através da certidão de conformidade à REURB, garantindo assim uma segurança jurídica aos ocupantes do território urbano e, consequentemente, um melhor funcionamento da cidade.

Por: Renata d’Acampora Muller

2023-09-27T17:54:06+00:0027 de setembro de 2023|

LIMITAÇÕES À IMPUGNAÇÃO AO PEDIDO DE REGISTRO DE LOTEAMENTO PERANTE O REGISTRO IMOBILIÁRIO

A impugnação ao pedido de registro de loteamento é um procedimento legal em que um terceiro contesta o pedido de registro de um loteamento, geralmente feito por um empreendedor imobiliário, junto ao Cartório de Registro de Imóveis.

Essa impugnação pode ocorrer por diversas razões, tais como questões legais, ambientais, urbanísticas atinentes as exigências da documentação constante do rol do art. 18, da lei do Parcelamento do Solo Urbano (Lei 6.766/1979).

A referida lei prevê que após aprovado o projeto de loteamento junto à Prefeitura, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado da documentação necessária.

Posteriormente, o oficial do registro de imóveis, após examinar a regularidade da documentação, deverá encaminhar comunicação à Prefeitura e fará publicar edital do pedido de registro em 3 (três) dias consecutivos, o qual poderá ser impugnado no prazo de 15 (quinze) dias corridos, contado da data da última publicação. Caso seja apresentada impugnação, o Oficial enviará o processo ao juiz competente, que dará vista dos autos ao representante do Ministério Público.

Na prática, o procedimento para impugnação ao pedido de registro de loteamento pode variar dependendo da legislação específica da jurisdição local, de modo que é fundamental consultar as leis e regulamentos específicos do local onde está sendo feito o empreendimento e seguir as diretrizes estabelecidas pelas autoridades competentes.

Ocorre que, muitas vezes, esse instrumento tem sido utilizado para discutir outras questões alheias à legalidade e regularidade do ato registral tais como dominialidade, benfeitorias, danos ambientais entre outros. Nesses casos, a lei determina que a discussão dever ser remetida às vias ordinárias, mediante provocação ao Poder Judiciário, para defesa de seus interesses.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já proferiu entendimento, no Recurso Especial nº 1.370.524/DF, no sentido de que impugnação ao registro de loteamento tem natureza administrativa e não ostenta caráter jurisdicional. Segundo o tribunal, a “atuação do Judiciário, ao solver a impugnação ao registro de loteamento urbano apresentada por terceiros, não exara provimento destinado a pôr fim a um suposto conflito de interesses (hipótese em que se estaria diante do exercício da jurisdição propriamente dita), ou mesmo, a possibilitar a consecução de determinado ato ou à produção válida dos efeitos jurídicos perseguidos (caso em que se estaria no âmbito da jurisdição voluntária). Como enfatizado, o Estado-juiz restringe-se a verificar a presença de requisitos exigidos em lei, para a realização do registro, tão-somente.”

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios preferiu entendimento no autos do Processo Administrativo nº 0707685-79.2022.8.07.0000, de que “o julgamento da impugnação ao registro de parcelamento do solo urbano é delimitado por via de natureza administrativa de estreita cognição e demarcado pela verificação restrita do cumprimento dos requisitos contidos nos artigos 18 e 19 da Lei n.º 6.766/79 (‘Lei do Parcelamento do Solo Urbano’), configurado pelo controle de legalidade formal da observância dos pressupostos extrínsecos do ato administrativo e afastada a possibilidade de exame de matérias de alta indagação e complexidade que exijam elaborada instrução probatória”.

Portanto, para os tribunais, na impugnação de pedido de registro de loteamento, a apreciação do magistrado se restringe à aferição de regularidade e da conformidade do registro com a lei, ou seja, a averiguação se limita a analisar se o processo de registro de loteamento preenche os requisitos da lei de parcelamento do solo.

Por: Elisa Ulbricht

2023-09-20T21:29:25+00:0020 de setembro de 2023|

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VAI DEFINIR SE A OBRIGAÇÃO EM MATÉRIA AMBIENTAL É DE NATUREZA PROPTER REM

O eg. Superior Tribunal Justiça procedeu à afetação dos Recursos Especiais ns. 1.962.089 e 1.953.359 para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, por meio da edição do Tema 1.204. O intuito é que se defina se “as obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores ou, ainda, dos sucessores, à escolha do credor“.

Diante da problemática instalada, foi determinada a suspensão do processamento de todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre a temática em questão.

Tudo começou porque os acórdãos recorridos, que ensejaram o Tema 1.204, vinham de certa forma contrariando o entendimento consolidado no Poder Judiciário.

Vale dizer que, ainda que com ressalvas, a orientação dominante da jurisprudência (que decorre de normativa constante do próprio Código Florestal) é no sentido de que a obrigação de proteção ao meio ambiente, assim como de reparar os danos ambientais é propter rem, possuindo caráter acessório à propriedade, sendo irrelevante que o causador da degradação ambiental não seja o atual proprietário, pois aquele adere ao título de domínio ou posse. Ou seja, a obrigação de reparar o dano ambiental independe do fato de ter sido o proprietário o autor da degradação ambiental.

No entanto, o mais razoável seria somente aplicar esse entendimento [de que o proprietário atual é o responsável, independentemente de ter ou não dado causa ao dano ambiental] quando não se sabe quem foi o efetivo autor da conduta ilícita ou quando o causador não toma qualquer providência.

Assim, estando identificado o causador do dano ambiental, não parece legítimo que o proprietário atual que não praticou qualquer conduta, tenha de responder pelos danos causados por terceiros.

É evidente que não é uma matéria simples de ser equacionada, de modo que, parece-nos, a questão deve sempre ser apreciada sob a ótica da razoabilidade e proporcionalidade, bem como à luz do caso concreto e não aplicada indiscriminadamente. Diante disso é que o julgamento do Tema 1.204 é uma grande oportunidade para rever esse posicionamento.

Por: Marcela Dantas Evaristo de Souza

2023-09-06T17:34:16+00:006 de setembro de 2023|

APENAS AS ATIVIDADES DE UTILIDADE PÚBLICA E INTERESSE SOCIAL DEVERÃO SER SUBMETIDAS À ANUÊNCIA PRÉVIA DO IBAMA NOS CASOS DE CORTE/SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO DE MATA ATLÂNTICA, DIZ O TRF4

Há muito se discute sobre a necessidade de anuência do IBAMA para os procedimentos de corte/supressão de vegetação de Mata Atlântica que envolvem edificações/loteamentos em áreas urbanas ou regiões metropolitanas dos municípios (arts. 30 e 31 da Lei 11.428/2006 – Lei da Mata Atlântica).

A controvérsia surgiu por conta do art. 19 do Decreto 6.660/2008 que determina:

“Além da autorização do órgão ambiental competente, prevista no art. 14 da Lei no 11.428, de 2006, será necessária a anuência prévia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, de que trata o § 1o do referido artigo, somente quando a supressão de vegetação primária ou secundária em estágio médio ou avançado de regeneração ultrapassar os limites a seguir estabelecidos:

I – cinqüenta hectares por empreendimento, isolada ou cumulativamente; ou

II – três hectares por empreendimento, isolada ou cumulativamente, quando localizada em área urbana ou região metropolitana.”

Como a norma acima refere-se textualmente aos desígnios do art. 14 da Lei 11.428/2006 (que trata unicamente das atividades de utilidade pública e interesse social), pairava a dúvida: o corte/supressão da vegetação de Mata Atlântica para fins de edificação/loteamento (permitid0, repita-se, pelos arts. 30 e 31 da Lei) também se submete à regra da anuência?

A partir de 2016 o próprio órgão ambiental federal (IBAMA) passou a entender pela desnecessidade de sua anuência nos casos dos arts. 30 e 31 acima especificados, mas, apesar disso, a questão continuou sendo alvo de dúvidas e questionamentos, seja no âmbito do Poder Judiciário, seja perante alguns órgão ambientais.

Nessa ordem de ideias e de maneira a desmistificar os impasses acima relatados, o TRF4, ao julgar demanda que tratava do tema em específico, entendeu que “a anuência do órgão federal é exigível somente nas hipóteses de licenciamento ambiental de empreendimentos/atividades de utilidade pública e interesse social”.  Além disso, esclareceu que

“[…] Em se tratando de supressão de vegetação secundária em estágio médio ou avançado de regeneração, em área urbana ou região metropolitana, para fins de loteamento e edificação, a competência é do órgão estadual, observados o Plano Diretor do Município e demais normas urbanísticas e ambientais aplicáveis (artigos 30 e 31 da Lei n.º 11.428/2006).”

O entendimento estabelecido é de todo acertado e louvável. Além de aplicar os desígnios estabelecidos pela própria Lei, o Tribunal acabou por esclarecer didaticamente questão há muito discutida – o que certamente auxiliará na resolução de controvérsias outrora existente relativas ao tema.

REFERÊNCIA: TRF4, AC 5012378-54.2015.4.04.7201, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 19/08/2022

Por: Fernanda de Oliveira Crippa

2023-08-31T14:15:06+00:0030 de agosto de 2023|

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA RECONHECE A DESCARACTERIZAÇÃO DE CURSO D’ÁGUA PELA PERDA DA FUNÇÃO AMBIENTAL

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu, através da técnica conhecida como ““distinguishing”, pela inaplicabilidade do distanciamento de cursos d’água natural definido pelo Código Florestal (30 a 500 metros), que caracterizam áreas como de preservação permanente, em imóveis inseridos em ambiente consolidado, em que há muitos anos já houve a perda da sua função ambiental.

Com base nesse entendimento, a 4ª Câmara de Direito Público afastou a aplicação do Tema Repetitivo n. 1010, no qual o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu que a extensão da faixa de áreas de preservação permanente a partir das margens de cursos d’água naturais, ainda que localizados em áreas urbanas consolidadas, deve ser aquela prevista na legislação federal (Lei n. 12.651/2012).

Basicamente, aproveitando-se da ressalva trazida pelo acórdão do STJ, a conclusão do órgão colegiado catarinense foi no sentido de que para que seja mantida a proteção da área de preservação permanente necessária a caracterização de curso d’água natural que apresente função ambiental.

Como reforço argumentativo, bastante sensato, ao longo do voto do Relator, Desembargador André Luiz Dacol, destacou-se a grande ocupação e desenvolvimento dos Municípios catarinenses a partir de vales e margens de rios. Ou seja, não apenas prevaleceu o bom senso, mas também a especificidade e características das situações corriqueiras que são/serão enfrentadas em cidades como Blumenau, Itajaí, Joinville, Lages, Balneário Camboriú, Joaçaba, Tubarão entre outras, que se levadas a interpretação literal, culminam com a demolição integral.

Assim, respeitando posicionamentos em sentido contrário, mas principalmente o julgado proferido pelo STJ, parece que o entendimento adotado pelo Tribunal de Justiça Catarinense é o mais ponderado e coerente à realidade encontrada neste Estado, evidenciando que o Tema n. 1010 não pode/deve ter interpretação estanque, mas de acordo com à realidade fática de cada localidade.

Precedente: Clique aqui.

Por: Monique Demaria

2023-08-17T19:25:13+00:0017 de agosto de 2023|

DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA SUSPENDE PORTARIA DO IMA QUE TORNAVA IRREGULARES MILHARES DE IMÓVEIS NO LITORAL DE SANTA CATARINA

Na última quinta-feira, dia 27/07/2023, foi proferida pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina decisão suspendendo os efeitos da Portaria do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, que havia considerado como Área de Preservação Permanente – APP toda faixa litorânea de 300 metros a partir do ponto máximo da maré.

O arresto, de autoria do Desembargador 2º Vice-Presidente da Corte, Getúlio Correa, deferiu pedido de efeito suspensivo formulado pelo Estado de Santa Catarina. O ente federativo buscava sustar os efeitos do Acórdão que manteve a decisão da Vara Única da Comarca de Garopaba cujo dispositivo obrigou o IMA a reconhecer, por meio de portaria, como restinga, e por isso APP, toda a área compreendida pelos 300 metros contados da linha de preamar máxima.

No entendimento do desembargador, a Portaria gera efeitos imediatos com a sua publicação, de modo que sua redação tornaria irregulares centenas de milhares de ocupações regularmente aprovadas e exercidas há décadas no litoral catarinense.

Isso porque, conforme já afirmado aqui, a norma editada pelo órgão ambiental acabou por tornar não passível de uso uma grande porção do litoral catarinense, lar da maior densidade populacional do estado. Afinal, as APPs são a espécie de área ambientalmente protegida dotadas do mais alto grau de restrição de uso e ocupação do solo, nas quais só podem ser exercidas atividades de utilidade pública ou de interesse social. Ou seja, a antiga Portaria do IMA havia esvaziado  quase que completamente a possibilidade de uso das propriedades localizadas a menos de 300 metros da linha de maior alcance das marés – realidade que, em cidades como Florianópolis, Itajaí, Balneário Camboriú, etc, é bastante comum.

Com todo o respeito sempre devido, a verdade é que a decisão cujo dispositivo foi suspenso havia deixado de se atentar para a vida de um sem-número de catarinenses que habitam e desenvolvem suas atividades próximo ao mar, em ocupações que, muitas vezes, precedem a própria inauguração do ordenamento jurídico-ambiental brasileiro – mais energicamente, em 1981.

Além disso, o decidido em primeiro grau não levou em conta a proteção constitucional dada ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI). Isso porque desconsiderou, em certa medida, situações consolidadas há anos no mundo fático, muitas vezes ratificadas pelo poder público em processos de licenciamento finalizados, perfectibilizados.

Por esses motivos, ao que nos parece, fez bem o Desembargador Getúlio Correa em suspender os efeitos da Portaria publicada pelo IMA por decisão da Vara Única da Comarca de Garopaba, pelo menos até que sejam julgados os Recursos Especial e Extraordinário interpostos pelo IMA – e que a questão seja melhor delineada, sobretudo em termos técnicos. Dessa forma, impede-se que uma decisão interlocutória (ou seja, proferida antes de finalizado o processo e a produção das devidas provas) tenha o condão de imobilizar por completo a atividade econômica do litoral e a vida de milhões de catarinenses.

Por: João Pedro Carreira Jenzura

2023-08-02T22:08:44+00:002 de agosto de 2023|
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