MINERAÇÃO: STJ DEFINE QUE É NECESSÁRIA AUTORIZAÇÃO FEDERAL PARA USO DE ÁGUA MINERAL EM PROCESSOS INDUSTIRAIS

Não é novidade que é necessária autorização federal para a extração de recursos minerais, a ser outorgada pela Agência Nacional de Mineração (ANM), considerando que são bens pertencentes à União, nos termos do que define o artigo 20, inciso IX, da Constituição Federal.

Nessa perspectiva, de um modo geral, a exploração e o aproveitamento das substâncias minerais devem seguir os regimes e procedimentos estabelecidos no Decreto-Lei 227/1967, na Lei n. 6.567/1978, bem como em seu regulamento, Decreto n. 9.406/2018.

Todavia, através do Código de Águas Minerais (Decreto-Lei n. 7.841/1945), a legislação trata de maneira diferenciada o aproveitamento comercial das fontes de águas minerais, que são aquelas provenientes de fontes naturais ou de fontes artificialmente captadas que possuam composição química ou propriedades físicas ou físico químicas das águas comuns, com características que lhes confiram uma ação medicamentosa (artigo 1º).

Trata-se de um tema de grande relevância nacional, considerando que o Brasil é uma potência mundial no mercado de água engarrafada, sendo que em apenas em 2017, foram consumidos 21,9 bilhões de litros em seu mercado interno, segundo dados da Beverage Marketing Corporation (BMC), ocupando, à época, o 5º lugar no mercado global.

Daí, portanto, a importância da compreensão do procedimento regulatório para extração e aproveitamento de água mineral, cuja produção interna apresenta abundância e alta concorrência.

Sendo assim, é fundamental destacar que a obtenção da autorização federal não é suficiente para legitimar a operação de atividades relacionadas à extração de recursos minerais. Dado o potencial de causar poluição ambiental, é essencial que o empreendimento seja submetido a um processo de licenciamento ambiental, momento em que serão avaliados os impactos ambientais e as medidas adequadas à sua mitigação.

Ocorre que, no contexto da extração de água mineral, frequentemente surgem controvérsias sobre a exigência de autorização federal, visto que a legislação aborda especificamente o aproveitamento comercial das fontes de água, mas não o seu uso de forma geral. Este cenário levanta questionamentos sobre a regulamentação aplicável ao uso não comercial desses recursos.

Recentemente, a temática veio à tona, em julgamento da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que definiu que a utilização de água mineral obtida diretamente do solo como insumo em processos industriais requer autorização federal, mesmo que não seja destinada ao consumo humano.

O caso julgado envolveu uma indústria de café que utilizava água termomineral em um de seus processos de produção, tendo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) entendido que o licenciamento conferido pelo órgão ambiental estadual seria suficiente, sob fundamento de que apenas para as hipóteses de extração para envase ou para fins balneários far-se-ia necessário obter autorização da ANM.

No entanto, o STJ reformou o referido acórdão, estabelecendo que o que define a necessidade de autorização da ANM é a composição dos recursos minerais (propriedades físico-químicas), e não a finalidade para qual são utilizados.

De acordo com o relator, Min. Paulo Sérgio Domingues, a “legislação de regência tutela o possível interesse da União, a proteção a um ativo econômico natural do Ente Público, que, por essa razão, não pode ser livremente explorado sem a devida autorização e análise da pertinência pelo Estado”.

Para acesso à íntegra da decisão clique aqui.

Por: Otávio Augusto do Espírito Santo Neto

2024-04-17T17:45:16+00:0017 de abril de 2024|

A MINERAÇÃO E A POSSIBILIDADE DE SE IMPOR LIMITES SOB PROPRIEDADES DE TERCEIROS PARA PESQUISA E LAVRA

Apesar de muitas pessoas, em um primeiro contato com a matéria, ao lerem ou ouvirem a palavra “mineração”, imaginarem uma atividade altamente causadora de poluição ambiental – principalmente considerando os precedentes históricos de acidentes no Brasil, a exemplo de Brumadinho ou do recente caso ocorrido em Maceió, que diga-se de passagem, são exceções de grande relevância –, há de se ressaltar que esta é uma atividade basilar da economia mundial.

No cenário nacional, a sua importância advém principalmente do fornecimento de matéria-prima para a indústria da construção civil, que por sua vez representa uma das mais significativas parcelas do Produto Interno Bruto (PIB) do país, sendo um dos maiores pilares da economia brasileira.

Tamanha é a importância da mineração, que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 176, § 1º, definiu a matéria como de amplo interesse nacional, sendo também considerada como de interesse público e social nos termos do que dispõem o art. 5º, “f”, do Decreto-lei 3.365/41, e o art. 3º, VIII, “b” do Novo Código Florestal (Lei 12.651/2012).

Para o exercício da atividade minerária, além de exigir-se o licenciamento ambiental, faz-se necessária a obtenção de autorização da União que permitirá que o particular exerça a pesquisa da área e posteriormente a lavra da substância mineral.

Nesse contexto, com intuito de realizar a pesquisa mineral, ou seja, “a execução dos trabalhos necessários à definição da jazida, sua avaliação e a determinação da exequibilidade do seu aproveitamento econômico” (art. 14 do Código de Mineração, Decreto-Lei n, 227/1967), o interessado deverá realizar o requerimento da área perante a Agência Nacional de Mineração (ANM), com vistas a obter a autorização de pesquisa e futuramente a concessão de lavra, esta última que permitirá o efetivo aproveitamento industrial da jazida (art. 36 do Código de Mineração).

A partir de então são diversas as possibilidades e peculiaridades que envolvem o tema, mas com certeza uma das que mais gera polêmicas é a possibilidade de intervenção na propriedade de terceiros para a realização da pesquisa ou lavra mineral através do instituto da servidão minerária, a qual se passa a analisar.

A servidão minerária está expressamente prevista no art. 59 do Código de Mineração, sujeitando-se às servidões de solo e de subsolo não apenas as propriedades onde se localizam as jazidas, mas também aquelas limítrofes. Em outras palavras: admite-se a imposição de limites ao uso da propriedade de terceiros para a realização de pesquisa ou lavra mineral, desde que mediante indenização prévia do valor do terreno a ser ocupado e dos prejuízos que resultarem a interferência.

Nessa perspectiva, como dito, a mineração é considerada atividade de amplo interesse nacional, de modo que a fixação desta limitação à propriedade alheia, de caráter tão oneroso a um terceiro, apenas é permitida devido à aplicabilidade do Princípio da Primazia do Interesse Público sobre o Privado.

A vista disso, ou seja, de tamanha onerosidade, não é raro a ascensão ao Poder Judiciário de embates acerca da instituição da servidão minerária. Todavia, há de se ressaltar que ao particular não é facultada escolha em suportar ou concordar com o ônus da servidão e nem mesmo opinar perante a ANM sobre sua conveniência.

Foi nesse exato sentido que já decidiu o Tribunal Regional da 4ª Região, em acórdão de lavra do e. Desembargador Federal Rogério Favreto na Apelação Cível n. 5004917-03.2021.4.04.7110/RS, ressaltando que “não dependerá da concordância do proprietário do terreno ocupado, cujo direito consistirá apenas na ‘indenização prévia do valor do terreno ocupado e dos prejuízos resultantes dessa ocupação’, sendo, pois, essa a exata medida da discussão que poderá ser levada a juízo (…)”

Nesse sentido, é relevante ressaltar que a valoração da indenização ao terceiro cujo ônus lhe foi imposto pode ser estabelecida mediante acordo entre as partes ou judicialmente, mas em ambos os casos deve-se seguir os parâmetros e regras estabelecidos no art. 27 do Código de Mineração.

A importância do tema mineração é tamanha que se admite a concessão de tutela antecipada em ações judiciais com o fim de garantir o acesso às jazidas minerais antes mesmo do fim do processo, desde que comprovada a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, evitando-se assim que empresas mineradoras tenham prejuízo no exercício de atividade de tão elevado interesse nacional.

E este entendimento foi exposto recentemente em acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo de lavra da e. Desembargadora Beatriz Braga, nos autos do Agravo de Instrumento n. 2000570-15.2024.8.26.0000, confirmando a tutela requerida pela empresa mineradora para utilização de passagem em terreno pertencente a um terceiro.

É inegável, portanto, a importância da atividade minerária para a economia nacional razão pela qual, além da servidão minerária, a legislação estabeleceu uma série de mecanismos que buscam viabilizar o exercício desta relevante atividade.

Por: Otávio Augusto do Espírito Santo Neto

2024-01-18T12:48:02+00:0018 de janeiro de 2024|

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Tema: Assessoramento Jurídico no Licenciamento Ambiental

Nos últimos anos o licenciamento ambiental no Brasil foi muito aprimorado. Novas tecnologias, melhor aparelhamento dos órgãos ambientais e o surgimento de empresas altamente especializadas na confecção de estudos ambientais são fatores que colaboram para essa realidade atual.

De igual forma, diariamente os órgãos licenciadores editam normas regulamentando a sistemática do licenciamento. Diante desse cenário, bem como do acompanhamento dos processos pelo Ministério Público e de seus órgãos de assessoramento, torna-se muito importante que todo o processo de licenciamento ambiental seja acompanhado, gerido e revisado por uma assessoria jurídica.

Somente assim é possível evitar que haja interpretações equivocadas de leis e normas que acabem trazendo fragilidades ao processo ou, no mínimo, atrasos na tramitação do mesmo. Esse acompanhamento sendo feito por equipe com expertise no assunto também gera a possibilidade de um correto gerenciamento de riscos que auxiliará muito na tomada de decisões técnicas e empresariais.

O escritório vem desenvolvendo esse trabalho desde o ano de 2009, tendo assim um amplo banco de dados e um conhecimento prático muito grande em licenciamentos federais, estaduais e municipais nos seguimentos de parcelamento de solo, portos e construção naval, distritos industriais, empreendimentos energéticos (hidráulicos, térmicos e eólicos), O&G, mineração, entre outros.

2013-11-13T15:50:27+00:0013 de novembro de 2013|

Estamos preparados para o Pré-Sal e o Gás de Xisto?

Anuncia-se que em novembro vão a leilão áreas brasileiras onde se pretende explorar o gás de xisto, da mesma forma que estão sendo leiloadas áreas do pré-sal para exploração de petróleo no mar.

Deveríamos ser prudentes nas duas direções. No pré-sal, não se conhecem suficientemente possíveis consequências de exploração em áreas profundas. No caso do xisto, em vários países já há proibições de exploração ou restrições, por causa das consequências, na sua volta à superfície, da água e de insumos químicos injetados no solo para “fraturar” as camadas de rocha onde se encontra o gás a ser liberado.

Mas as razões financeiras, em ambos os casos, são muito fortes e estão prevalecendo em vários lugares, principalmente nos Estados Unidos.

No Brasil, onde a tecnologia para o fraturamento de rochas ainda vai começar a ser utilizada, há um questionamento forte da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e da Academia Brasileira de Ciências, que, em carta à presidente da República (5/8), manifestaram sua preocupação com esse leilão para campos de gás em bacias sedimentares. Nestas, diz a carta, agências dos EUA divulgaram que o Brasil teria reservas de 7,35 trilhões de metros cúbicos em bacias no Paraná, no Parnaíba, no Solimões, no Amazonas, no Recôncavo Baiano e no São Francisco. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) estima que as reservas podem ser o dobro disso. Mas, segundo a SBPC e a ANP, falta “conhecimento das características petrográficas, estruturais e geomecânicas” consideradas nesses cálculos, que poderão influir “decisivamente na economicidade de sua exploração”.

E ainda seria preciso considerar os altos volumes de água no processo de fratura de rochas para liberar gás, “que retornam à superfície poluídos por hidrocarbonetos e por outros compostos”, além de metais presentes nas rochas e “dos próprios aditivos químicos utilizados, que exigem caríssimas técnicas de purificação e de descarte dos resíduos finais”. A água utilizada precisaria ser confrontada “com outros usos considerados preferenciais”, como o abastecimento humano. E lembrar ainda que parte das reservas está “logo abaixo do Aquífero Guarani”; a exploração deveria “ser avaliada com muita cautela, já que há um potencial risco de contaminação das águas deste aquífero”.

Diante disso, não deveria haver licitações imediatas, “excluindo a comunidade científica e os próprios órgãos reguladores do país da possibilidade de acesso e discussão das informações”, que “poderão ser obtidas por meio de estudos realizados diretamente pelas universidades e institutos de pesquisa”. Além do maior conhecimento científico das jazidas, os estudos poderão mostrar “consequências ambientais dessa atividade, que poderão superar amplamente seus eventuais ganhos sociais”. É uma argumentação forte, que, em reunião da SBPC no Recife (22 a 27/7), levou a um pedido de que seja sustada a licitação de novembro.

Em muitos outros lugares a polêmica está acesa – como comenta o professor Luiz Fernando Scheibe, da USP, doutor em Mineração e Petrologia (12/9). Como na Grã-Bretanha, onde se argumenta que a tecnologia de fratura, entre muitos outros problemas, pode contribuir até para terremotos. A liberação de metano no processo também pode ser altamente problemática, já que tem efeitos danosos equivalentes a mais de 20 vezes os do dióxido de carbono, embora permaneça menos tempo na atmosfera. E com isso anularia as vantagens do gás de xisto para substituir o uso de carvão mineral. O próprio Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) tem argumentado que o gás de xisto pode, na verdade, aumentar as emissões de poluentes que contribuem para mudanças do clima.

Na França os protestos têm sido muitos (Le Monde, 16/7) e levado o país a restrições fortes, assim como na Bulgária. Alguns Estados norte-americanos proibiram a tecnologia em seus territórios, mas o governo dos EUA a tem aprovado, principalmente porque o gás de xisto não só é mais barato que o carvão, como reduziu substancialmente as importações de combustíveis fósseis do país, até lhe permitindo exportar carvão excedente. E a Agência Internacional de Energia está prevendo que até 2035 haverá exploração do gás de xisto em mais de 1 milhão de pontos no mundo. Nos EUA, este ano, a produção de gás de xisto estará em cerca de 250 bilhões de metros cúbicos – facilitada pela decisão governamental de liberar a Agência de Proteção Ambiental de examinar possíveis riscos no processo e pela existência de extensa rede de gasodutos (o Brasil só os tem na região leste; gás consumido aqui vem da Bolívia).

Também a China seria potencial usuária do gás, pois 70% de sua energia vem de 3 bilhões de toneladas anuais de carvão (quase 50% do consumo no mundo).Embora tenha 30 trilhões de metros cúbicos de gás de xisto – mais que os EUA -, o problema é que as jazidas se situam em região de montanhas, muito distante dos centros de consumo – o que implicaria um aumento de 50% no custo para o usuário, comparado com o carvão. Por isso mesmo, a China deverá aumentar o consumo do carvão nas próximas décadas (Michael Brooks na New Scientist, 10/8).

E assim vamos, em mais uma questão que sintetiza o dilema algumas vezes já comentado neste espaço: lógica financeira versus lógica “ambiental”, da sobrevivência. Com governos, empresas, pessoas diante da opção de renunciar a certas tecnologias e ao uso de certos bens – por causa dos problemas de poluição, clima, consumo insustentável de recursos, etc. -, ou usá-los por causa das vantagens financeiras imediatas, que podem ser muito fortes.

Cada vez mais, será esse o centro das discussões mais fortes em toda parte, inclusive no Brasil – com repercussões amplas nos campos político e social. Preparemo-nos.

Por: Washington Novaes,  jornalista.  Canal energia

2013-09-20T18:09:18+00:0020 de setembro de 2013|
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