CAMPOS DE ALTITUDE: MAIS UM CASO DE AUTUAÇÃO CONTRÁRIA À LEGISLAÇÃO POSTA POR PARTE DOS ÓRGÃOS PÚBLICOS

O equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental é garantido por um robusto arcabouço jurídico no Brasil. Empresas dos mais variados setores são obrigadas a cumprir normas ambientais rígidas, obtendo licenças e autorizações, bem como adotando medidas de mitigação e controle, como ocorre no setor da silvicultura. Para essa atividade, no bioma Mata Atlântica, a supressão de vegetação possui regramentos específicos previstos na Lei 11.420/2006 e no Decreto 6.660/2008, como também na Lei 12.651/2012 (Código Florestal).

No entanto, há situações em que empresas mesmo atuando de maneira regular e em conformidade com a legislação ambiental, são autuadas pelos órgãos públicos. Essas autuações indevidas podem ocorrer, por exemplo, por falhas na análise técnica, por divergências na interpretação das normas e divergências na aplicabilidade do Código Florestal no bioma Mata Atlântica.

De forma a ilustrar isso, recentemente a Justiça Federal de Santa Catarina noticiou[1] em seu sítio que foi concedida liminar para suspender o pagamento de multas aplicadas pelo IBAMA a uma empresa de reflorestamento por suposta supressão de vegetação de Mata Atlântica para plantio de pinus, em áreas consideradas “campos de altitude”. Tal formação florística integra o bioma Mata Atlântica, embora a lei federal (Lei 11.420/2006) não tenha definido o que são “campos de altitude”.

Acontece que em razão dessa omissão, o Estado de Santa Catarina teria exercido a competência legislativa plena prevista no art. 24, §3º, da CRFB/88 ao editar o art. 28, XV, da Lei Estadual n. 14.675/2009 (Código Estadual do Meio Ambiente) atual art. 28-A, XV da lei estadual, o qual estabeleceu que “campos de altitude” são áreas situadas acima de 1.500 metros de altitude, em âmbito estadual, assim dispondo:

Art. 28-A Para os fins previstos nesta Lei entende-se por:

[…]

XV – campos de altitude: ocorrem acima de 1.500 (mil e quinhentos) metros e são constituídos por vegetação com estrutura arbustiva e/ou herbácea, predominando em clima subtropical ou temperado, definido por uma ruptura na sequência natural das espécies presentes e nas formações fisionômicas, formando comunidades florísticas próprias dessa vegetação, caracterizadas por endemismos, sendo que no Estado os campos de altitude estão associados à Floresta Ombrófila Densa ou à Floresta Ombrófila Mista;

Referido dispositivo foi impugnado em Ação Direta de Inconstitucionalidade[2] ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MPSC), que questionou sua constitucionalidade perante o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). O MPSC alegou que a Lei Estadual tratou de modo inovador o conceito de campos de altitude, de modo a reduzir a sua hipótese de incidência se comparada a Resolução 10/1993 do CONAMA, que “não vincula campo de altitude à vegetação típica que ocorre em altitudes acima de 1.500 metros”. Ao julgar a ADI, em 05/06/2019, o TJSC entendeu pela constitucionalidade do referido dispositivo legal e a decisão foi mantida pelo STF, que conferiu efeito vinculante e eficácia contra todos.

Desse modo, no Estado de Santa Catarina, vigora o conceito de “campos de altitude” definido no art. 28-A, XV, da Lei Estadual n. 14.675/2009, que se refere às áreas localizadas acima de 1.500 metros de altitude, desde o trânsito em julgado em 23/04/2022.

Ainda assim, em 28/06/2024, mesmo após declarada a constitucionalidade do dispositivo sobre campos de altitude da lei estadual, bem como a atividade estar devidamente licenciada pelo órgão ambiental estadual, a empresa de reflorestamento sofreu autuações, com multa e termo de embargo por parte do IBAMA, que alegou que a fiscalização nas áreas objeto das autuações teria sido realizada a pedido do MPSC, que solicitou informações para elucidar denúncias relativas à supressão de vegetação nativa de áreas superiores a 50 hectares, em razão de atribuições da União (art. 14, § 1º, da Lei 11.428/2006 e art. 19, inciso I, do Decreto 6.660/2008).

No caso, a empresa ajuizou medida perante a Justiça Federal de Florianópolis para suspender a exigibilidade de multa e embargos contra o IBAMA. O juízo, após a manifestação do IBAMA, deferiu a suspensão da exigibilidade da multa e embargo por entender que: a) a atividade estava sendo realizada em área situada abaixo de 1.500 metros de altitude, não se amoldando ao conceito de campos de altitude; b) a área não era coberta por vegetação nativa de especial preservação, o que dispensa autorização do IBAMA para supressão para uso alternativo do solo; e c) o artigo da lei estadual foi declarado constitucional, não sendo dado ao IBAMA negar-lhe vigência.

De longa data, essas autuações vêm preocupando o setor empresarial, em razão do uso abusivo de ações e autuações indevidas por órgãos públicos, mesmo quando as empresas operam dentro dos parâmetros legais e possuem todas as licenças necessárias. Essas condutas podem ser caracterizadas como temerárias e de abuso de direito, por violação aos princípios da boa-fé e da segurança jurídica, trazendo insegurança jurídica, bem como gerando prejuízos ao setor produtivo. Além de causar impacto econômico imediato, essas autuações podem macular a reputação da empresa, resultando em perda de contratos e dificuldades na obtenção de crédito.

Em muitos casos, os órgãos públicos desconsideram as licenças válidas emitidas pelos próprios órgãos ambientais, questionando seu mérito de forma genérica, sem apresentar provas concretas de danos ao meio ambiente ou qualquer indício de ilegalidade. Isso já resultou até na condenação do Ministério Público do Distrito Federal por litigância de má-fé[3].

As empresas que cumprem as exigências legais, obtêm licenças e seguem as normas ambientais precisam ter a garantia de que suas atividades não serão interrompidas injustificadamente por autuações abusivas ou ações sem fundamento sólido. Sem essa previsibilidade, o ambiente de negócios torna-se instável e desestimulante para investimentos, especialmente em setores que demandam grande capital e planejamento de longo prazo.

Portanto, embora a fiscalização e a atuação judicial sejam fundamentais para a preservação ambiental, o exercício abusivo desses poderes, por meio de ações temerárias e autuações indevidas, prejudica o setor produtivo e compromete o desenvolvimento de atividades produtivas sustentáveis. O respeito à segurança jurídica e à boa-fé é essencial e para que empresas que operam dentro da legalidade e adotam práticas sustentáveis tenham a confiança de que não serão punidas injustamente, sendo portanto, necessário buscar um equilíbrio nas ações fiscalizatórias e judiciais, de modo a garantir a continuidade da atividade devidamente licenciada, crescimento econômico do setor e competitividade no mercado mundial.

[1] https://www.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=noticia_visualizar&id_noticia=28511

[2] ADI 8000030-60.2017.8.24.0000

[3] https://direitoambiental.com/ministerio-publico-condenado-por-ma-fe-em-acao-civil-publica/

Por: Elisa Ulbricht

2024-10-22T22:05:56+00:0022 de outubro de 2024|

IBAMA PUBLICA NORMATIVA PARA ESTABELECER PROCEDIMENTOS PARA ELABORAÇÃO DE PRAD

No dia 03 de julho, foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) a Instrução Normativa IBAMA nº 14, de 1º de julho de 2024, que “estabelece procedimentos para elaboração, apresentação, execução e monitoramento de Projeto de Recuperação de Área Degradada ou Área Alterada (PRAD) pelo administrado” com o fim de cumprimento da legislação ambiental.

Confira a íntegra da Instrução no link: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa-ibama-n-14-de-1-de-julho-de-2024-569632282

2024-07-03T18:03:42+00:003 de julho de 2024|

A POSSIBILIDADE DE ANULAÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL NA VIA JUDICIAL

A partir da lavratura de auto de infração ambiental inicia-se o processo administrativo destinado à apuração dos fatos, que finda com o julgamento pela autoridade julgadora ambiental. Caso confirmada a sanção aplicada, o autuado tem a prerrogativa de, caso sinta-se lesado, desconstituir o auto de infração lavrado por meio do ajuizamento, na esfera judicial, de Ação Anulatória de Auto de Infração Ambiental.

A legislação ambiental brasileira estabelece que a lesão ao meio ambiente seja apurada de forma independente e simultânea nas esferas criminal, cível e administrativa, de modo que o infrator pode ser responsabilizado nessas três esferas.

Assim, ocorrida ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, é configurada a infração administrativa, que é lavrada por meio do Auto de Infração Ambiental e, como dito, dá início ao processo administrativo destinado a apuração da infração ambiental.

Após a apresentação de defesa e recurso administrativo pelo autuado, o auto de infração poder ser confirmado, modificado, revogado ou anulado pela autoridade ambiental. Caso homologado o auto de infração e confirmada as sanções aplicadas pela autoridade administrativa, inicia-se a fase de cobrança da multa com a notificação do autuado e reparação do dano, se determinada na decisão.

Conforme referenciado acima, em caso de discordância com o resultado do julgamento do processo administrativo, poderá ser ajuizada ação anulatória de auto de infração ambiental perante o Poder Judiciário. O auto de infração goza de presunção de veracidade e legitimidade, cabendo ao autuado comprovar vícios, ausência de autoria da conduta ou ilegalidade do auto de infração. Deste modo, a aplicação da sanção pode ser afastada em razão de diversos fundamentos, tais como ofensa aos princípios da Administração Pública, equívocos na lavratura do auto de infração que geram vícios materiais e formais, prescrição intercorrente e quinquenal, ilegitimidade da parte autuada, cerceamento de defesa, ausência de intimação para responder ao processo, entre outros.

Assim, demonstrada na via judicial a existência de vícios no auto de infração ou durante a tramitação do processo administrativo, deve ser declarada a nulidade ou anulação dos atos administrativos e do auto de infração ambiental em razão do descumprimento de regras procedimentais ou legais para aplicação da sanção administrativa.

Portanto, após o término do processo administrativo ambiental confirmando o auto de infração, que tramitou perante o órgão ambiental competente, o autuado tem a possiblidade de ajuizar a ação anulatória perante o Poder Judiciário para buscar a nulidade ou anulação do auto de infração ambiental.

Por: Elisa Ulbricht

2024-07-03T18:01:58+00:003 de julho de 2024|

A SUPRESSÃO DE ESPÉCIE EXÓTICA EM APP PRECISA DE AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO AMBIENTAL?

O código florestal estabelece normais gerais sobre a proteção da vegetação nativa e impõe prévia autorização do órgão ambiental competente para a supressão dessa vegetação para uso alternativo do solo.

Mas, em se tratando de supressão de vegetação exótica, também se exige a Autorização para Supressão de Vegetação – ASV do órgão ambiental?

A resposta não é tão simples, pois vai depender da situação.

Isso porque é importante verificar os vários aspectos: se se trata de fragmentos florestais ou árvores isoladas, área urbana ou rural, via pública ou dentro dos limites de uma propriedade, dentro de área ambientalmente protegida ou não, em qual bioma se encontra a vegetação, etc.

Assim, de forma geral, as espécies exóticas nem sempre estão condicionadas à ASV, principalmente nos casos em que seja efetuada de forma isolada, bem como não esteja localizada em área de preservação permanente – APP e não esteja vinculada a um processo de Licenciamento Ambiental.

Logo, em muitos estados e municípios, têm se exigido a autorização de corte para a supressão ou retirada de espécies florestais exóticas quando estiverem localizadas em área de preservação permanente – APP, por ser área protegida pelo Código Florestal, pois possuem a “função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” (art. 3º, II, Lei 12.651/2012).

Os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná possuem normativas que exigem a autorização para corte de vegetação exótica em APP, são elas: Resolução CETESB SMA nº 07/2017, Resolução INEA nº 89/2014, Resolução IAT Sedest nº 28/2021, respectivamente.

Em Santa Catarina, o §1º, do art. 99 da Lei 14.675/2009 (Código Estadual do Meio Ambiente), dispõe que a supressão ou retirada de espécies exóticas em APP “pode ser realizada independentemente de prévia autorização do órgão ambiental”, mas condiciona à necessidade de recuperação ambiental das áreas não consideradas consolidadas.

No entanto, a Instrução Normativa nº 43 do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) prevê pedido de Autorização de Supressão de vegetação exótica em APP, tanto em áreas rurais quanto em áreas urbanas.

Diante disso, é recomendado que se faça uma consulta prévia ao órgão ambiental para que seja efetuada a supressão de espécie florestal exótica, principalmente em APP, pois realizar o corte sem autorização pode configurar crime ambiental, segundo a Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais).

Por: Elisa Ulbricht

2024-03-13T19:47:19+00:0013 de março de 2024|

LIMITAÇÕES À IMPUGNAÇÃO AO PEDIDO DE REGISTRO DE LOTEAMENTO PERANTE O REGISTRO IMOBILIÁRIO

A impugnação ao pedido de registro de loteamento é um procedimento legal em que um terceiro contesta o pedido de registro de um loteamento, geralmente feito por um empreendedor imobiliário, junto ao Cartório de Registro de Imóveis.

Essa impugnação pode ocorrer por diversas razões, tais como questões legais, ambientais, urbanísticas atinentes as exigências da documentação constante do rol do art. 18, da lei do Parcelamento do Solo Urbano (Lei 6.766/1979).

A referida lei prevê que após aprovado o projeto de loteamento junto à Prefeitura, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado da documentação necessária.

Posteriormente, o oficial do registro de imóveis, após examinar a regularidade da documentação, deverá encaminhar comunicação à Prefeitura e fará publicar edital do pedido de registro em 3 (três) dias consecutivos, o qual poderá ser impugnado no prazo de 15 (quinze) dias corridos, contado da data da última publicação. Caso seja apresentada impugnação, o Oficial enviará o processo ao juiz competente, que dará vista dos autos ao representante do Ministério Público.

Na prática, o procedimento para impugnação ao pedido de registro de loteamento pode variar dependendo da legislação específica da jurisdição local, de modo que é fundamental consultar as leis e regulamentos específicos do local onde está sendo feito o empreendimento e seguir as diretrizes estabelecidas pelas autoridades competentes.

Ocorre que, muitas vezes, esse instrumento tem sido utilizado para discutir outras questões alheias à legalidade e regularidade do ato registral tais como dominialidade, benfeitorias, danos ambientais entre outros. Nesses casos, a lei determina que a discussão dever ser remetida às vias ordinárias, mediante provocação ao Poder Judiciário, para defesa de seus interesses.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já proferiu entendimento, no Recurso Especial nº 1.370.524/DF, no sentido de que impugnação ao registro de loteamento tem natureza administrativa e não ostenta caráter jurisdicional. Segundo o tribunal, a “atuação do Judiciário, ao solver a impugnação ao registro de loteamento urbano apresentada por terceiros, não exara provimento destinado a pôr fim a um suposto conflito de interesses (hipótese em que se estaria diante do exercício da jurisdição propriamente dita), ou mesmo, a possibilitar a consecução de determinado ato ou à produção válida dos efeitos jurídicos perseguidos (caso em que se estaria no âmbito da jurisdição voluntária). Como enfatizado, o Estado-juiz restringe-se a verificar a presença de requisitos exigidos em lei, para a realização do registro, tão-somente.”

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios preferiu entendimento no autos do Processo Administrativo nº 0707685-79.2022.8.07.0000, de que “o julgamento da impugnação ao registro de parcelamento do solo urbano é delimitado por via de natureza administrativa de estreita cognição e demarcado pela verificação restrita do cumprimento dos requisitos contidos nos artigos 18 e 19 da Lei n.º 6.766/79 (‘Lei do Parcelamento do Solo Urbano’), configurado pelo controle de legalidade formal da observância dos pressupostos extrínsecos do ato administrativo e afastada a possibilidade de exame de matérias de alta indagação e complexidade que exijam elaborada instrução probatória”.

Portanto, para os tribunais, na impugnação de pedido de registro de loteamento, a apreciação do magistrado se restringe à aferição de regularidade e da conformidade do registro com a lei, ou seja, a averiguação se limita a analisar se o processo de registro de loteamento preenche os requisitos da lei de parcelamento do solo.

Por: Elisa Ulbricht

2023-09-20T21:29:25+00:0020 de setembro de 2023|

JULGAMENTO DO STF FIRMA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 140/2011

No último dia 17/03/2023, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4757) ajuizada pela Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (ASIBAMA) que questionava diversos dispositivos da Lei Complementar 140/2011, a qual fixa normas para cooperação entre União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção do meio ambiente.

Em síntese, a ASIBAMA entende que a LC 140 instituiu sistema normativo que fragiliza de forma significativa a proteção do meio ambiente pois: a) restringe a atuação da União, uma vez que atribui competência para órgãos ambientais carentes de infraestrutura e preparo para o desempenho de funções; b) impede a União de fixar limites e critérios para o exercício de atividades poluidoras, em caráter supletivo; e c) transforma competências comuns em privativas.

O Advogado-Geral da União manifestou-se pelo não conhecimento da ação, pois entende que os artigos impugnados não têm o condão de transformar a competência comum em competência privativa, já que favorecem a cooperação institucional entre os entes federativos no exercício das competências comuns. Além disso, a LC 140/2011 confere plena efetividade à garantia prevista no art. 225, caput, da CF/88, pois permite a conjugação das atividades desenvolvidas pelo órgão licenciador com a atuação supletiva dos demais entes federados.

Foi admitida no feito, a Associação Nacional dos Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA), na condição de amicus curiae, que argumentou, em síntese, que a ASIBAMA parte de premissas equivocadas, uma vez que a LC 140/2011 está em perfeita consonância com os arts. 23 e 225 da CF/88, e se trata de marco legal que implementa o federalismo cooperativo, sem conflitos ou sobreposições de atuações administrativas, em respeito à autonomia dos entes federativos, à eficiência na preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado e à segurança jurídica dos administrados.

Tratou-se também no decorrer do julgamento sobre a validade das licenças ambientais enquanto o órgão ambiental competente não conclui o processo de renovação e o exercício do poder de polícia fiscalizador concomitante entre os entes federativos.

Diante disso, o Plenário do STF manteve a validade de dispositivos questionados, sob o entendimento de que a LC 140/2011 assegura a cooperação entre os órgãos administrativos ambientais, e estabeleceu (deu interpretação conforme) que a omissão ou mora administrativa imotivada e desproporcional na manifestação definitiva sobre os pedidos de renovação de licenças ambientais instaura a competência supletiva, bem como que a prevalência do auto de infração lavrado pelo órgão originalmente competente para o licenciamento ou autorização ambiental não exclui a atuação supletiva de outro ente federado, desde que comprovada omissão ou insuficiência na tutela fiscalizatória.

Segundo os ministros do STF, pode haver atuação supletiva entre União, Estados, DF e Municípios em caso de omissão ou demora de renovação de licenças ambientais e de fiscalização ambiental no Brasil, dado que “não cabe ao legislador formular disciplina normativa que exclua o exercício administrativo de qualquer dos entes federados, mas sim que organize a cooperação federativa, assegurando a racionalidade e a efetividade nos encargos constitucionais de proteção dos valores e direitos fundamentais”

Portanto, o STF ratificou a constitucionalidade da LC 140/2011, de modo que validou a dinâmica das competências comuns atribuídas aos entes federativos e aos deveres de proteção adequada e suficiente ao meio ambiente.

Por: Elisa Ulbricht

2023-03-28T19:35:01+00:0028 de março de 2023|

AS NOVAS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS INTRODUZIDAS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO AMBIENTAL FEDERAL

Nos primeiros dias do novo governo, foram anunciadas diversas medidas que alteram ou revogam regras estabelecidas pelo governo anterior, como a recriação de planos contra o desmatamento, a retomada do Fundo Amazônia, a retomada da estrutura e funcionamento originais do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), bem como a alteração de procedimentos para as multas e o processo administrativo ambiental.

Dentre as novidades citadas, o que se destaca é a publicação do Decreto Federal 11.373/2023, que altera o Decreto 6.514/2008, o qual dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e trata do processo administrativo federal para apuração das sanções ambientais.

Em suma, as principais mudanças introduzidas pelo Decreto 11.373/2023 dizem respeito a: a) Alteração de 20% para 50% dos valores arrecadados em pagamento de multas aplicadas pela União que deve ser revertido ao Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA); b) Extinção do Núcleo de Conciliação Ambiental, criado pelo governo anterior, por meio do Decreto n. 9.760/2019 e regulamentado pela IN Conjunta MMA/Ibama/ICMBio 01/2021; c) Criação da Câmara Consultiva Nacional; e d) Alteração no programa de conversão de multas, com modificação dos descontos concedidos às modalidades diretas e indiretas e do momento de solicitação de adesão ao programa.

Dessas mudanças, a que tem sido considerada bastante polêmica é o fim da etapa de audiência de conciliação. Foram revogados todos os dispositivos referentes à conciliação ambiental, com a consequente extinção do Núcleo de Conciliação Ambiental, criado pelo governo Bolsonaro, por meio do Decreto n. 9.760/2019 e regulamentado pela IN Conjunta MMA/Ibama/ICMBio 01/2021, com o objetivo de dar agilidade e eficácia aos instrumentos de gestão e evitar que os processos se arrastem indefinitivamente.

Já falamos aqui que ao Núcleo de Conciliação Ambiental competia fazer análises preliminares que podiam anular ou convalidar autos de infração, bem com decidir sobre a manutenção, o cancelamento ou converter o dever de pagar uma multa ambiental em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.

Dessa forma, não há mais interrupção do prazo de 20 dias para apresentação da defesa administrativa em virtude da realização de audiência de conciliação. Nesse caso, deve o autuado: apresentar defesa ou impugnação no prazo de 20 dias ou realizar o pagamento da multa com desconto, parcelamento ou conversão em serviços ambientais.

Já em relação a Câmara Consultiva Nacional, que ainda deverá ser instituída, objetiva subsidiar a estratégia de implementação do Programa de Conversão de Multas Ambientais, além de opinar sobre temas e áreas prioritárias a serem beneficiadas com os serviços decorrentes da conversão e sobre as estratégias de monitoramento.

Quanto ao programa de conversão de multa em serviços ambientais, não há mais possibilidade de desconto para conversão de multa caso o processo chegue à segunda instância. Além disso, foram alterados os percentuais de desconto aplicados aos pedidos de conversão de multa, que assim passam a ser: a) De 60% para 40%, em se tratando de requerimento de conversão pela modalidade direta juntamente com a defesa; b) De 50% para 35%, em se tratando de requerimento de conversão pela modalidade direta até o prazo de alegações finais; c) De 60% em se tratando de requerimento de conversão pela modalidade indireta juntamente com a defesa; e d) De 50% em se tratando de requerimento de conversão pela modalidade indireta até o prazo de alegações finais.

Portanto, as medidas trazem significativas mudanças no processo administrativo ambiental federal, e muitas vezes, não somente em âmbito federal, uma vez que as normas federais servem de referência para os órgãos ambientais estaduais e municipais.

Por fim, cabe esclarecer que o novo decreto já se encontra em vigor e a lei processual aplica-se de imediato aos processos em andamento, mas devem ser respeitados os atos processuais já realizados.

Por: Elisa Ulbricht

2023-01-18T17:46:44+00:0018 de janeiro de 2023|

ATIVIDADE EMPRESARIAL POLUIDORA QUE PROVOCOU RISCOS À SAÚDE DE CONSUMIDOR GERA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

Em julgamento recente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial interposto pela empresa JBS Aves Ltda., que buscava afastar condenação ao pagamento de danos morais à vítima de dano ambiental, gerado por atividade empresarial poluidora a qual provocou riscos à saúde do consumidor.

O caso em análise começou com o ajuizamento da ação contra a JBS, em sua unidade no município de Passo Fundo (RS), requerendo indenização por danos morais e a cessação da atividade poluente, sob o argumento de que a empresa atuava de forma irregular e estaria causando poluição sonora e atmosférica, com produção de ruído intenso, emissão de fuligem, gases e odores fétidos.

Em virtude das emissões geradas, o autor alegou problemas de saúde decorrentes do ambiente insalubre: sintomas de intoxicação causada pela falta de oxigênio, fortes dores de cabeça, fadiga, ardência nos olhos, náusea, diarreia, vômito e mal-estar.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) entendeu que o autor da ação poderia ser equiparado a consumidor e aplicou ao caso as normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC), inclusive a inversão do ônus da prova, já que foi constatada sua hipossuficiência.

Em grau de recurso, o STJ entendeu que “equipara-se ao consumidor para efeitos legais aquele que, embora não tenha participado diretamente da relação de consumo, sofre as consequências do evento danoso decorrente do defeito exterior que ultrapassa o objeto e provoca lesões, gerando risco à sua segurança física e psíquica”.

A empresa, que já tinha sido notificada em razão da poluição atmosférica por meio de inquéritos civis e processos administrativos, não conseguiu comprovar que o dano ambiental não existiria, pois deixou de realizar prova técnica apta a demonstrar que sua atividade não prejudica o meio ambiente.

Assim, em virtude da caracterização do acidente de consumo, decorrentes do exercício de atividade empresarial poluidora destinada à fabricação de produtos para comercialização, entendeu-se possível o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação, o que atraiu a incidência das disposições do CDC.

Desse modo, para o STJ, o acidente de consumo não decorre somente do dano causado pelo produto em si, mas também pode surgir do próprio exercício da atividade empresarial poluidora, de modo a caracterizar responsabilidade civil da empresa e a consequente condenação ao pagamento de indenização por danos morais.

Portanto, as empresas que exercem atividades potencialmente poluidoras precisam redobrar os cuidados para evitar acidente de consumo decorrente de falhas no processo produtivo a ponto de causar riscos à saúde da população e caracterizar responsabilidade civil.

Por: Elisa Ulbricht

2022-10-05T19:29:17+00:005 de outubro de 2022|

STF JULGOU CONSTITUCIONAL RESOLUÇÃO DO CONAMA SOBRE QUALIDADE DO AR E IMPÕE AO ÓRGÃO A EDIÇÃO DE NOVA RESOLUÇÃO SOBRE A MATÉRIA

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na sessão do dia 05 de maio de 2022, pela constitucionalidade da Resolução do Conama 491/2018, mas embora tenha descartado vício de constitucionalidade, determinou ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) a edição de nova resolução sobre a matéria em vinte e quatro meses.

A Resolução do Conama 491/2018 estabelece padrões de qualidade do ar considerando como referência, os valores guia de qualidade do ar recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2005, bem como os critérios para sua implementação.

Em razão de uma Ação Direta Inconstitucionalidade, ajuizada em 2019, pelo Vice Procurador da República, Luciano Mariz Maia, a validade da Resolução do CONAMA 491/2018 foi contestada. A PGR alegava que “Embora utilize como referência os valores guia de qualidade do ar recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2005, a resolução não dispõe de forma eficaz e adequada sobre os padrões de qualidade do ar, prevendo valores de padrões iniciais muito permissivos, deixando de fixar prazos peremptórios para o atingimento das sucessivas etapas de padrões de qualidade de ar e apresentando procedimento decisório vago”.

Aberta a sessão de julgamento, houve divergência de votos, os Ministros Cármen Lúcia (Relatora), Edson Fachin, Roberto Barroso e Rosa Weber, entendiam pela procedência da ação e os ministros André Mendonça e Nunes Marques divergiram da relatora, votando pela manutenção da norma.

Diante disso, decidiu-se que, embora a Resolução do Conama 491/2018 seja constitucional, ela deverá ser alterada no prazo de 24 meses, a fim de se adequar aos padrões internacionais de proteção do meio ambiente contra os efeitos da poluição.

Segundo a decisão do STF, o Conama deverá editar nova resolução sobre a matéria, a qual deverá levar em consideração: “(i) as atuais orientações da Organização Mundial da Saúde sobre os padrões adequados da qualidade do ar; (ii) a realidade nacional e as peculiaridades locais; bem como (iii) os primados da livre iniciativa, do desenvolvimento social, da redução da pobreza e da promoção da saúde pública”.

Além disso, no caso de o Conama não editar a norma no prazo estabelecido pelo STF, a Resolução 491/2018 deixa de valer e passarão a vigorar os parâmetros estabelecidos pela OMS enquanto perdurar a omissão administrativa na edição da nova Resolução.

Como já falamos aqui, o referido julgamento faz parte da chamada Pauta Verde, um conjunto de sete ações ambientais que foram pautadas e começaram a ser julgadas em sequência pela Suprema Corte no final de março.

Por: Elisa Ulbricht

2022-05-12T12:03:17+00:0012 de maio de 2022|
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