Prescrição no processo administrativo ambiental: O entendimento do conselho estadual do meio ambiente do Estado de Santa Catarina (CONSEMA)

Um dos institutos que mais gera polêmica no âmbito do processo administrativo ambiental é a prescrição. Não pela existência de muitas divergências, mas por ser um tema que acaba sendo salvo conduto para quem, efetivamente, concorreu para a prática de alguma infração administrativa-ambiental.

A prescrição das ações da Administração Pública Federal, direta ou indireta, foi regulamentada pela Lei n. 9.873/1999 e, posteriormente, pelo Decreto n. 6.514/2008. Segundo as normas, prescreve em 5 anos (prescrição quinquenal), contados da data da prática do ato ou, em sendo infração permanente, do dia em que tiver cessado, a ação da administração para apurar a prática dos atos infracionais (art. 1º da Lei n. 9.873 e art. 21 do Decreto n. 6.514/08).

Há também a chamada prescrição intercorrente, aplicável aos processos paralisados por mais de três anos, pendentes de julgamentos ou despachos (art. 1º, §1º, da Lei n. 9.873 e art. 21, §2º, do Decreto n. 6.514/08). Sobre esse assunto, muito comum vivenciar na prática a movimentação do processo de um “setor ao outro” apenas para que não incida a prescrição. No nosso entender, uma simples movimentação interna, sem cunho decisório ou justificável, não é motivo suficiente para interromper o lapso prescricional.

Em Santa Catarina, diferentemente do que acontece em outros estados, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA) entende, respaldado por decisões judiciais, que, por se tratar de normas vinculadas à atuação exclusiva da Administração Pública Federal, não se aplicam aos processos em âmbito estadual, devendo ser utilizado, por isonomia, o Decreto n. 20.910/32.

Assim sendo, tem-se que da lavratura do auto de infração ambiental até o julgamento pelo CONSEMA (julgamento de 2ª instância) não pode transcorrer mais de 5 anos, caso contrário a pretensão punitiva do Estado se encontra prescrita. A prescrição, no entanto, atinge tão somente sobre o valor da multa, não em relação a eventual obrigação de reparação ambiental, esta imprescritível pelas decisões do Superior Tribunal de Justiça.

Por conta disso, mostra-se de grande importância um trabalho efetivo e acompanhamento contínuo dos processos administrativos ambientais, pois, em não havendo chance de êxito na autuação (a depender da conduta praticada), ao menos a multa poderá deixar de ser cobrada.

Por: Lucas Dantas Evaristo de Souza

 

2019-08-28T16:04:56+00:0028 de agosto de 2019|

A demolição como pena na lei dos crimes ambientais

A Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 9.605/98) dispõe sobre os tipos penais considerados crimes e as sanções para cada uma das condutas. Ao final, também trata superficialmente das condutas administrativas. As penas previstas são aplicadas conforme a gravidade do delito.

Em um determinado momento, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ainda que a lei não preveja, acaba por admitir a demolição como uma pena acessória, interpretando de forma teleológica o artigo 20 do mesmo diploma legal.

Por esse entendimento, a condenação de qualquer um dos tipos penais previstos na lei poderia ter como pena acessória a demolição, não se limitando apenas às penas de detenção ou reclusão e multa ou ambas cumuladas.

Logo entendia-se, no passado, que a obrigação pecuniária a que prevê o art. 20 poderia ser substituída pela obrigação específica (recuperação) e, por isso, admitia-se a demolição como efeito da sentença penal.

Com o passar dos anos, o entendimento do próprio Tribunal Regional Federal da 4ª Região veio sofrendo alterações e, hoje, a posição consolidada, retratada em diversos julgados (com a qual, concordamos), é que a pena de demolição é um efeito extra penal, não previsto como sanção criminal ambiental.

Ou seja, passou-se a não admitir a demolição como uma pena criminal, sendo esta de cunho eminentemente administrativo, aplicável tão-somente aos casos de cometimento de infrações ambientais, também administrativas, que devem ter sua apuração em âmbito administrativo, após regular processo naquela esfera, nos termos do parágrafo 4º do artigo 70 da referida Legislação.

Portanto fica evidenciado que nos dias de hoje o entendimento sobre a demolição da obra não está sendo mais visto como um efeito da condenação, como era anteriormente. Somente no caso de se tratar de produto de crime é que a pena de demolição pode ser entendida como acessória nos casos criminais.

Por: Marcela Dantas Evaristo de Souza

 

2019-08-21T20:09:05+00:0021 de agosto de 2019|

Acordo Setorial de eletroeletrônicos está em consulta pública

Em tempos de obsolescência programada, criada para atender às necessidades do sistema econômico capitalista, o Brasil caminha a passos lentos na implementação de uma logística reversa para os resíduos eletroeletrônicos .

Como se sabe, a Lei Federal n. 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (“PNRS”), estabelece, em seu art. 33,  que são obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: (i) agrotóxicos; (ii) pilhas e baterias;  (iii) pneus; (iv) óleos lubrificantes; (v) lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; e (vi) produtos eletroeletrônicos e seus componentes.

Leia-se Segundo o artigo 13 da PNRS, a logística reversa nada mais é do que um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.

Ações estas que deverão ser adotadas por meio de um acordo, regulamento ou termo de compromisso a ser celebrado entre todos os envolvidos.

Trata-se, portanto, de importante instrumento para minimizar os danos derivados do descarte de resíduos eletroeletrônicos que perderam sua funcionalidade. No entanto, em que pese a sua importância para o descarte de resíduos no Brasil, só agora o Acordo Setorial de Eletroeletrônicos parece ter saído do papel!

Com efeito, após anos e debates e discussões, no último dia 30 de julho de 2019, finalmente foi publicada a Portaria MMA nº 464, que  coloca em consulta pública o Acordo Setorial para implantação de Sistema de Logística Reversa de Produtos Eletroeletrônicos de Uso Doméstico e seus Componentes.

Segundo o referido acordo, o seu objetivo é estruturar, implementar e operacionalizar o sistema de logística reversa dos resíduos eletroeletrônicos, estabelecendo os deveres e obrigações de cada uma das empresas e entidades envolvidas. Leia-se resíduos eletroeletrônicos como os equipamentos de uso doméstico cujo adequado funcionamento depende de correntes elétricas com tensão nominal não superior a 240 volts.

Esta estruturação ocorrerá em duas fases. A primeira consiste, dentre outras condutas, na adoção das seguintes medidas: (i) criação de um Grupo de Acompanhamento de Performance (“GAP”) ; (ii) adesão das empresas às entidades gestoras por meio de instrumento jurídico aplicável; (iii) instituição de mecanismo financeiro para assegurar a sustentabilidade econômica da operacionalização do sistema; (iv) reconhecimento do IBAMA de que os produtos não serão considerados perigosos; e, por fim, (v) implementação de medidas fiscais de simplificação da operacionalização do sistema de logística reversa.

A segunda fase, por sua vez, compreende: (i) na habilitação de prestadores de serviço que poderão atuar no sistema de logística reversa de Produtos Eletroeletrônicos; (ii) na divulgação da implementação do sistema por meio não formal; e (iii) na instalação de Pontos de Recebimento e/ou Consolidação.

Antes, no entanto, de entrar em vigor, o acordo setorial ainda passará por consulta pública até o dia  30 de agosto de 2019, oportunidade na qual a sociedade como um todo poderá oferecer contribuições e sugestões fundamentadas para aprimoramento do instrumento.

Para ter acesso a sua íntegra e opinar, acesse: http://consultaspublicas.mma.gov.br.

Por: Otávio Augusto do Espírito Santo Neto

2019-08-15T12:39:21+00:0015 de agosto de 2019|

Desafios do setor de floresta plantada no licenciamento ambiental

O setor de florestas plantadas vem, ao longo dos anos, recebendo cada vez mais incentivos financeiros do governo federal, que pretende ampliar até 2030 a área de produção florestal em 2 milhões de hectares, representando um aumento de 20% sobre a área atual.

Essa meta está prevista no Plano Nacional de Florestas Plantadas do Ministério da Agricultura, criado pelo Decreto Federal n. 8.375/2014, que estabelece os princípios e os objetivos da Política Agrícola para Florestas Plantadas em relação às atividades de produção, processamento e comercialização dos produtos, subprodutos, derivados, serviços e insumos.

Em que pese ser um setor por demais relevante para o país em termos de desenvolvimento social e econômico, e que, inclusive, contribui significativamente para a diminuição da pressão sobre florestas nativas, ainda há muitas barreiras para aumento e atração de investimentos.

Em razão disso, o Plano Nacional de Florestas Plantadas tem por objetivo buscar maior competitividade do setor em relação a outras atividades agrícolas. No entanto, ainda há entraves legais que barram um maior crescimento do setor, dentre eles o seu licenciamento ambiental.

Com efeito, como se sabe, o licenciamento ambiental é um formidável instrumento de comando e controle da gestão ambiental e de implementação da Política Nacional do Meio Ambiente, mas que ainda carece de regulamentação por lei federal, como exigido pela Constituição da República (art. 225, parágrafo 1º, inciso IV), por essa razão tem gerado inúmeros problemas práticos, decorrentes de interpretações equivocadas e, por vezes, oportunistas das regras inferiores que regem o tema – especialmente, as Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).

Dentre tais problemas, merece destaque o descompasso por parte dos órgãos ambientais, que ora exigem o licenciamento ambiental das atividades de florestas plantadas, ora não, e que ora admitem a manutenção da atividade em áreas de preservação permanente, com base nas normas do Código Florestal (Lei Federal n. 12.651/12) que a autorizam nos casos de áreas rurais consolidadas, ora não permitem, criando uma situação de profunda insegurança jurídica.

Até mesmo a questão da compensação pelo uso da Área de Preservação Permanente (APP) tem sido tratada de maneira distinta em diferentes Estados, o que, para um investidor externo, é algo difícil de compreender e, mais ainda, de aceitar.

Isso acontece, por exemplo, quando alguns estados permitem que seja feito licenciamento simplificado em uma única etapa, por meio de cadastro eletrônico, com apresentação reduzida de documentos para áreas menores, retirando exigências, diferenciando o licenciamento para pequenos e grandes silvicultores, enquanto há estados que não diferenciam os procedimentos.

Por essa razão, a fim de desburocratizar a concessão de licenças para o setor, uma das propostas é a promoção da certificação florestal, de reconhecimento internacional, e a criação de instrumentos econômicos também previstos na Política Nacional do Meio Ambiente.

Ainda, assim, essa via enfrenta credibilidade por parte dos órgãos de controle (especialmente, o Ministério Público Federal e Estadual) e das organizações não governamentais de defesa do meio ambiente. Esses atores costumam dar pouca importância às certificações externas ou internas e/ou à opinião de auditores independentes, preferindo, não raro, seguir a opinião de seus próprios técnicos, que costumam ter posições exclusivamente voltadas à proteção ambiental irrestrita.

Mas isso não retira do instituto licenciamento ambiental a sua importância e o seu valor. O que há é uma distorção prática, em que alguns setores, valendo-se do vácuo legislativo, acabam por questionar o processo de licenciamento com fundamento em questões formais, levando à judicialização sistemática e indevida.

Diante disso, no atual cenário, as dificuldades criadas nos licenciamentos são um entrave, mas não o licenciamento em si. Por conta dessas incongruências, somada a ausência de métricas padronizadas para prever e quantificar os retornos financeiros e ambientais, bem como os riscos associados à atividade, exige-se, por via de consequência, que o empreendedor tenha o apoio de profissionais especializados e forte preparo para a condução dos processos de licenciamento ambiental.

Por: Elisa Ulbricht

 

2019-08-07T17:26:57+00:007 de agosto de 2019|

A necessidade da DUE DILIGENCE na aquisição de um imóvel

Nos últimos anos, o mercado tem exigido cada vez mais transparência e segurança na realização de investimentos e transações empresariais. Como assumir o risco de um passivo ambiental em eventuais negociações pode custar um preço muito alto, e, no pior cenário, até mesmo ocasionar a inviabilização do aludido negócio, muitos empreendedores têm se resguardado por meio da realização de auditorias.

Dentre estas auditorias, a Due Diligence Ambiental adquire um papel de destaque no mercado, uma vez que o processo atua como uma forma de precaução em relação aos possíveis riscos ambientais que podem advir de uma aquisição de imóvel.

O seu objetivo é, a partir de uma análise detalhada das características do imóvel e do atendimento à legislação ambiental vigente, imprimir garantias contratuais para o cenário econômico e jurídico, sobretudo no âmbito das aquisições, fusões e cisões empresariais.

Nesse sentido, importante observar que as restrições impostas pelas legislações ambientais brasileiras, principalmente após o advento da Lei Federal n. 9.605/98 – que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente – demonstram a preocupação do legislador em punir com graves sanções a destruição ambiental, fato que acaba por preocupar consideravelmente os eventuais investidores – cenário que, por óbvio, é sintomático.

Acrescente-se, ainda, que as multas administrativas decorrentes de infrações ambientais trazidas pela referida lei, são bastante inibidoras, podendo variar de R$ 50,00 (cinquenta reais) a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), conforme dispõe o seu artigo 75.

Ademais, cabe ressaltar que a mencionada legislação possibilita a incriminação tanto da pessoa jurídica, quanto a corresponsabilidade da pessoa física. Isso quer dizer que, inclui-se na possibilidade de responsabilização criminal a pessoa do diretor, administrador, órgão técnico e demais cargos responsáveis que tenham contribuído direta ou indiretamente para os danos ambientais causados a determinado empreendimento (arts. 2º e 3º da Lei n. 9.605/98).

Todo esse cenário punitivo, torna a Due Diligence extremamente necessária para a avaliação de cenários quando da aquisição de imóveis, a fim de que seja observada, também nessas negociações, a incidência de alguma questão ambiental relevante, como, por exemplo, eventuais níveis de contaminação do solo, da água subterrânea, de águas superficiais e demais estruturas, existência de áreas de preservação permanente no imóvel, dentre outros aspectos.

Nesse contexto, em que a conduta assertiva ambiental torna-se cada vez mais relevante, pode-se verificar a importância e significância da Due Diligence Ambiental, visto que permite um maior monitoramento por parte das empresas ou adquirentes de imóveis em relação ao passivo ambiental, além do mapeamento e contingenciamento dos riscos inerentes ao negócio pretendido. Tais informações são demasiadamente estratégicas para a solidez da empresa e para o próprio negócio, bem como para a fruição de futuros investimentos, que é o que deseja todo o mercado.

Por: Monique Demaria

2019-07-31T18:42:53+00:0031 de julho de 2019|

A PROIBIÇÃO DA SUBSTÂNCIA AMIANTO NO BRASIL

O início do corrente mês foi marcado pela realização de audiência promovida pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, cujo tema em destaque foi a famigerada proibição do uso de amianto no Brasil (https://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/SAUDE/579194-AUDIENCIA-DISCUTE-PROIBICAO-DO-USO-DE-AMIANTO-NO-BRASIL.html?utm_campaign=boletim&utm_source=agencia&utm_medium=email).

A discussão envolvendo a substância é antiga e envolve setores da sociedade civil relacionados à saúde, vigilância sanitária, indústria, construção civil, profissionais do direito, dentre muitos outros.

O tema chegou ao STF há alguns anos, e hoje são diversas ações que discutem essa problemática, que envolve não apenas questões relacionadas à periculosidade da referida substância, como também, aspectos constitucionais das normas federais/estaduais/municipais relacionadas.

Isso porque, ao passo que o texto federal (Lei 9.055/95) autoriza certo grau de tolerância na utilização do amianto, quando classificado como sendo da variedade crisotila (asbesto branco), diversos estados e municípios passaram a publicar Leis proibindo todo e qualquer uso da substância, independentemente de sua variação.

Solucionando essa controvérsia, em fevereiro do corrente ano, foi publicado acórdão de relatoria do Min. Dias Toffoli que, ao julgar a ADI 3356 relacionada à legislação do estado de Pernambuco, reconheceu a inconstitucionalidade superveniente da Lei Federal n. 9.055/95 (que tratava da utilização e comercialização do amianto no Brasil), e deixou assentado que não cabe à “(…) legislação estadual disciplinar matéria de forma contrária à lei geral federal”. http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15339421424&ext=.pdf

Ou seja, em que pese tenha declarado a inconstitucionalidade da Lei Federal que trata da comercialização do amianto, o mesmo julgado deixou assentado entendimento no sentido de que as legislações estaduais/municipais não podem adentrar à competência da União e disciplinar matérias de maneira “contrária à norma geral federal, desvirtuando o mínimo de unidade normativa almejado pela Constituição Federal”.

Sob o ponto de vista da competência dos entes federativos para tratar do tema, tem-se que a premissa estabelecida no acórdão se deu de maneira absolutamente acertada, na medida em que, de fato, o art. 24 da CF/88 estabeleceu que a competência para legislar é concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal, de modo que compete à União fixar normas gerais e, aos Estados, suplementar a legislação federal no que couber (art. 24, §§1º e 2º).

Ora, suplementar as normas gerais significa legislar sobre temas não esgotados pela legislação federal, jamais contrariá-la.

Vale dizer que a ADI citada, que pende de análise de embargos declaratórios opostos, não é a única a tratar de questões relacionadas à utilização do amianto; diversas decisões do STF, envolvendo legislações de outros estados da federação, já vedaram a extração, o beneficiamento, o transporte, a industrialização e a exportação do amianto crisotila.

Em que pese a existência de opiniões para todos os lados (a favor e contra a utilização da substância amianto) o que se espera é que esse relevante tema, em breve, ganhe solução definitiva.

Por: Fernanda de Oliveira Crippa

2019-07-24T20:02:58+00:0024 de julho de 2019|

Municípios tem a obrigação de regularizar loteamentos clandestinos

É o que decidiu a Primeira Seção do eg. STJ, em julgamento realizado no início do corrente mês (REsp n. 1.164.893/SE).

Considerando a inexistência de entendimento pacifico quanto à obrigatoriedade, ou não, de os Municípios regularizarem loteamentos clandestinos ou irregulares implantados em seu território, o tema foi submetido a julgamento para uniformização da matéria.

Para a surpresa de muitos, a tese firmada foi justamente de que é obrigação dos Municípios promover as obras necessárias à regularização não apenas de loteamentos irregulares (autorizados, mas executados em desconformidade com o ato), mas também, de loteamentos clandestinos (não autorizados).

Em linhas gerais, entenderam os julgadores que não há discricionariedade por parte do Município em relação a promover, ou não, a regularização, mas sim, um poder-dever que deriva da própria Constituição Federal, que expressa ser encargo inafastável do Município promover a ocupação ordenada do solo urbano. Ou seja, em sendo o Município omisso no dever de fiscalizar, recai sobre si a responsabilidade de regularizar.

É bem verdade que não se trata de um dever absoluto, nem estanque. Compete aos Municípios observar as demais legislações incidentes, além das necessidades de seu espaço urbano na definição das prioridades, especialmente observando-se os critérios sociais. Ou seja, a omissão do loteador não gera prioridade em relação às outras obras e necessidades municipais.

Além disso, a obrigação restringe-se às obras essenciais, como malha urbana, ruas, esgoto, energia e iluminação pública, privilegiando e atendendo aos moradores já instalados. Ou seja, a tese firmada não impõe aos Municípios a obrigação de construir os empreendimentos, mas sim, de providenciar aos munícipes residentes naqueles locais a infraestrutura mínima que lhes é garantida pela Lei Maior.

De outro lado, é de se frisar que não se está a falar na concessão de carta branca para a construção e implantação desenfreada de loteamentos sem autorização, ou em desconformidade com essas. A tese firmada pela corte superior deixa também claro que, se de um lado há o dever de regularização por parte dos Municípios, de outro há também o poder de cobrar dos responsáveis os custos inerentes à sua atuação.

Resta, agora, acompanhar os reflexos práticos da decisão.

Por: Lucas São Thiago Soares

 

2019-07-17T16:44:45+00:0017 de julho de 2019|

Licenciamento ambiental volta ao debate na Câmara

Em um momento que a Câmara dos Deputados vota importantes reformas, o presidente da Câmara, Deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), cria um Grupo de Trabalho para analisar o Projeto de Lei (“PL”) n. 3.729/2004, conhecido como Lei Geral de Licenciamento Ambiental, que ganhou regime de urgência sob a coordenação do Deputado Kim Kataguiri e com a participação de mais nove deputados.

Trata-se de uma proposta legislativa que tramita há mais de 15 (quinze) anos na Câmara dos Deputados e que ganhou regime de urgência nos últimos dias para análise da subemenda substitutiva global apresentada pelo Deputado Kim Kataguiri nas 10(dez) audiências públicas que foram convocadas antes da votação final pela plenária.

O objetivo da proposta é garantir maior segurança jurídica aos processos de licenciamento ambiental e/ou auxiliar aqueles que exercem atividades sujeitas a ele, de modo a traçar regramento específico a ser seguido mediante lei, antes, durante e depois do procedimento, e em âmbito nacional.

Por essa razão, as discussões parlamentares desenvolvidas até o momento são de suma importância, visto que aprovar-se-á um marco regulatório próprio e adequado para o trato de tão relevante matéria, que, como se sabe, há anos vem sendo regulamentada por inúmeros decretos e resoluções.

Desse modo, ainda que a subemenda substitutiva global apresentada pelo Deputado Kim Kataguiri não vá agradar a todos – e certamente não irá pelas polêmicas envolvidas – a proposta representa um significativo avanço no trato da matéria até o momento, já que buscou consolidar os diversos substitutivos apresentados até hoje pelas diversas autoridades ambientais envolvidas (IBAMA, Ministério do Meio Ambiente, Ministério Público Federal, dentre outros).

Com efeito, ao tratar da Avaliação Ambiental Estratégica (“AEE”) e das audiências públicas, bem como ao detalhar (e até mesmo criar) os procedimentos a serem adotados para adoção de um licenciamento ambiental mais célere, como o licenciamento único, o licenciamento por adesão e compromisso e o licenciamento corretivo, a subemenda substitutiva global consolida importantes discussões que vêm sendo tratadas nos últimos anos para a adequada regulamentação da matéria.

No entanto, há questões que voltaram a constar nesta última versão e que, por serem controvertidas, poderão ocasionar polêmicas e, inclusive, dificultar a sua aprovação.

A título de exemplo, merece destaque o rol de atividades isentas de licenciamento ambiental (artigo 7º), no qual se estabelece que atividades agropecuárias e instalações necessárias ao abastecimento público  de água.

Outro exemplo é a possibilidade dos entes federativos estabelecerem as tipologias de atividades ou empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental no âmbito de sua competência (artigo 3º, §1º), o que, como se sabe, poderá ocasionar a excessiva flexibilização das normativas para atrair investimentos, o que os americanos chamam de “race of the bottom”, guerra fiscal ambiental.

Ora, se o objetivo é a unificação das normas a fim de se criar um regramento geral e de nível federal, a excessiva liberdade aos Estados e Distrito Federal apenas gerará debates intermináveis no Poder Judiciário, que é o que se pretende evitar.

Por certo, não se olvide da necessidade de desburocratizar esse importante instrumento de política pública que é o licenciamento ambiental. Contudo, para se garantir o efetivo estímulo à liberdade econômica e, consequentemente, desenvolvimento do País, é imprescindível que a norma seja clara e estabeleça diretrizes de âmbito nacional a serem seguidas, a fim de se evitar as excessivas judicializações e os consequentes cenários de insegurança jurídica.

Por essa razão, embora a subemenda substitutiva tenha consolidado importantes instrumentos do licenciamento ambiental, o texto-base apresentado pelo Deputado Kim Kataguiri ainda terá que passar por alguns ajustes redacionais para garantir a sua aprovação pelo plenário.

Por: Gabriela Giacomolli

 

2019-07-17T17:49:10+00:0010 de julho de 2019|

É possível alterar a reserva legal mesmo após averbada na matrícula do imóvel?

O Código Florestal determina que todo imóvel rural deve designar percentual de área com cobertura de vegetação nativa a título de Reserva Legal para a conservação da vegetação ou para a recomposição, caso tenha ocorrido desmatamento.

O registro da Reserva Legal, antes do advento do novo Código Florestal, era feito por meio de termo de compromisso com a autoridade ambiental e averbada na matrícula do respectivo imóvel. A partir da vigência do atual Código Florestal, a inscrição da reserva legal passou a ser realizada no Cadastro Ambiental Rural (CAR) (art. 18, caput, e § 4º, da Lei 12.651/2012).

Após o registro no órgão ambiental competente, a alteração de destinação da reserva legal é vedada pelo Código Florestal. Entretanto, a legislação de alguns estados permite que seja feita correção ou alteração da localização da reserva legal já averbada, mediante aprovação do órgão ambiental.

O Estado de Santa Catarina estabeleceu procedimentos e critérios para a retificação, a readequação e a realocação da Reserva Legal por meio da Portaria nº 311/2015 da FATMA, hoje IMA. O diploma conceitua Readequação da Reserva Legal como a “alteração da localização da Reserva Legal dentro do próprio imóvel, em função de erro técnico ou administrativo na localização da reserva Legal original”. A Retificação é entendida “como a correção de área do imóvel e/ou de Área de Reserva Legal em função de medições georreferenciadas de maior precisão, dentro do próprio imóvel”. Por sua vez, a Realocação é a “alteração da localização da Reserva Legal para outro imóvel, entendida como a substituição da área originalmente designada, em casos excepcionais, onde ocorra comprovado ganho ambiental pela mudança, sendo proibido o desmatamento ou o uso alternativo do solo, bem como a sua redução”.

No Estado do Paraná, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) editou a Portaria nº 55/2014 e, posteriormente, o Decreto nº 11.515/2018, visando também dispor sobre tais procedimentos de regularização ambiental. Em que pese haver conceitos próximos nas legislações, acrescente-se que no Paraná a Readequação pode ser feita para atender também os parâmetros do Código Florestal e a Realocação da reserva legal averbada poderá ocorrer quando esta esteja em área de utilidade pública ou tenha sido averbada em local sem vegetação nativa.

Em Minas Gerais, o art.  27, §1º, da Lei nº 20.922/2013, estabelece que para os casos de mudança de localização da reserva legal, a nova área deverá localizar-se em área com tipologia vegetacional, solo e recursos hídricos semelhantes ou em melhores condições ambientais que a área anterior, observados os critérios técnicos que garantam ganho ambiental, estabelecidos em regulamento.

Vale observar que o procedimento de Realocação é medida excepcional em todos os Estados e somente é permitida a mudança de localização da Reserva Legal onde ocorra comprovado ganho ambiental e desde que a solicitação seja aprovada pelo órgão ambiental.

Assim, os proprietários ou possuidores de imóvel rural podem optar pelos procedimentos da readequação, retificação e realocação para recompor a reserva legal ou alterarem sua localização dispondo-a de modo diferente do que está averbado na matrícula do imóvel para a regularização ambiental da propriedade rural.

Por: Elisa Ulbricht

 

2019-07-17T17:49:04+00:003 de julho de 2019|

A Normatividade Administrativa no Direito Penal Ambiental

O poder punitivo estatal é limitado pela taxatividade dos tipos penais, princípio o qual determina que as leis penais incriminadoras devam ser determinadas, inequívocas e precisas.

No entanto, a própria natureza dinâmica da vida em sociedade exige que na construção de certos tipos penais o legislador recorra à complementação advinda de outras espécies normativas extrapenais.

Isto acaba por levantar uma séria preocupação nos administradores de imóveis, pois é necessário manter-se sempre atento aos conceitos extrapenais, trazidos por normas administrativas, essenciais para o entendimento de algumas tipificações penais ambientais.

Destarte, para tratamento jurídico-penal de certas matérias, recorre-se à técnica da “lei penal em branco”, isto é, à criação de tipos penais imperfeitos, com preceitos primários indeterminados quanto ao seu conteúdo, porém determináveis através de outras normas existentes no ordenamento jurídico.

Destacadamente, na Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), estão presentes diversos tipos penais que empregam esta técnica legislativa e remetem o aplicador do direito à normatividade administrativa para sua complementação, estabelecendo-se, desse modo, uma área de confluência entre o Direito Penal Ambiental e o Direito Administrativo.

A título de exemplo, é possível citar da Lei de Crimes Ambientais:

  1. os arts. 38 e 39, que necessitam da complementação conceitual quanto à tipificação das condutas relacionadas à “floresta considerada de preservação permanente”. Conceitos estes, trazidos pelo art. 3º, II, da Lei Federal n.12.651/12 (Código Florestal) e pelas Resoluções CONAMA ns. 302, 303 e 369;
  2. o art. 40, caput, que faz referência aos danos causados às Unidades de Conservação como tal definidas no art. 27 do Decreto n. 99.274/90;
  3. o art. 45, que depois de tipificar como crime o corte ou transformação em carvão de madeira de lei, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, busca complementação em normas extrapenais, ao exigir que exista previsão acerca da natureza do objeto da infração penal em ato do Poder Público, definindo a elementar do tipo penal “madeira de lei” e o corte ou a transformação estejam “em desacordo com as determinações legais”.

Portanto, a dependência do Direito Penal Ambiental em relação ao Direito Administrativo sancionador se revela muitas vezes absoluta, ficando evidente que a proteção penal do bem jurídico “meio ambiente” apresenta um caráter subsidiário, gerando a necessidade quase sempre reenviar a matéria à normativa administrativa.

Assim, considerando que quase todas as atividades praticadas pelo homem geram certo impacto ambiental, é de extrema importância que o administrador do imóvel haja com a maior cautela possível, a fim de evitar uma possível responsabilização criminal.

Por: Otávio Augusto do Espírito Santo Neto

 

2019-06-26T15:25:00+00:0026 de junho de 2019|
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