Como é sabido, por mais relevante que seja o direito fundamental protegido, tanto que erigido a nível constitucional, este não é absoluto e está sujeito a, conforme o caso concreto, ser superado por outro direito que se situa na mesma posição hierárquica, o qual, por sua vez, também poderá ser mitigado em determinadas situações.
Nesse norte, diferentemente do que se dá com o conflito de normas, que se resolve através da aplicação de critérios previamente estabelecidos, eliminando-se uma delas, o mesmo não se dá com os princípios, vez que estes não podem ser restringidos a priori.
Desse modo, se dois princípios colidem, não sendo possível a harmonização entre eles, só um pode prevalecer no caso concreto, afastando-se a incidência do outro.
Dito isso, em recente acórdão proferido por ocasião do julgamento da Apelação Cível n. 2012.030404-6, pela relatoria do e. Desembargador Francisco Oliveira Neto, entendeu o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina pela prevalência do direito à moradia sobre o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Ao caso, ingressou o Ministério Público com ação civil pública aduzindo teria um particular, com a anuência dos entes públicos municipais, construído residência em área de preservação permanente no entorno das dunas existentes no Bairro Ingleses, em Florianópolis. Requereu, assim, a condenação da pessoa física a desfazer a edificação e a recuperar o suposto dano ambiental, com a apresentação e execução de projeto de recuperação de área degradada (PRAD), cabendo ao órgão ambiental municipal (FLORAM) e ao Município envidar esforços e maquinário próprios para remoção de toda a edificação e materiais implantados no local.
Ao analisar a situação, verificou o Tribunal que a casa foi, em verdade, construída em área inequivocamente urbanizada, estando situada em rua pavimentada em toda sua extensão e servida por iluminação pública, coleta de lixo, abastecimento de água e outros serviços de infraestrutura aptos a suprir as necessidades das inúmeras residências lá instaladas, sendo fácil concluir que, devido às ações antrópicas ali implementadas, o local não apresenta mais os elementos de uma área de preservação permanente.
Ademais, o próprio órgão ambiental municipal emitiu parecer informando sobre a tramitação de Projeto de Lei com o objetivo de recategorizar a área para zoneamento mais permissivo, como já o fez o Poder Público Municipal ao editar a Lei Complementar n. 476/2013, que alterou parte da área de preservação permanente localizada na praia do Santinho para Área Residencial Exclusiva 5 (ARE 5), reconhecendo a vocação urbana do local.
Considerando tais circunstâncias, houve por bem a Corte catarinense em afastar a incidência do princípio do in dubio pro natura, com a prevalência do direito à moradia ao caso, mostrando-se inviável, assim, a aplicação das restrições ambientais apregoados pelo Código Florestal e das medidas pretendidas pelo Ministério Público.
* TJSC, Apelação Cível n. 2012.030404-6, da Capital, Rel. Des. Francisco Oliveira Neto, julgado em 01/04/2014.
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