Abstraída a polêmica sobre se o atual Plano Diretor de Florianópolis está mesmo em vigor – considerando o TRF da 4ª Região determinou a realização de novas audiências públicas e a votação de um novo projeto de lei – o tema que mais tem chamado a atenção nos últimos dias na cidade diz respeito às sucessivas negativas a consultas de viabilidade para construção em áreas inteiramente urbanizadas (algumas até já loteadas), ao argumento de que estariam situadas em “acrescidos de marinha, natural ou artificial”.
É que a tal LC, em seu art. 119, §1º – se é que vigente, repita-se – estabelece que “os acrescidos de terrenos de marinha, formados por acessão natural ou artificial, serão destinados ao uso público ou coletivo”. Com base nesta disposição é que a Prefeitura Municipal vem sistematicamente indeferindo pretensões de construir de vários munícipes.
É flagrante o equívoco. A uma porque a linha de marinha em que o Município vem se baseando é aquela que está em debate no Serviço do Patrimônio da União, ou seja, ainda não está homologada e, portanto, o ato que a demarcou ainda não pode produzir efeitos – nem para a União nem, menos ainda, para o Município.
A duas, porque a leitura do parágrafo deve ser feita em consonância com a cabeça do artigo, este que diz expressamente que “os terrenos de marinha que estiverem no uso comum do povo se constituem em logradouros públicos municipais,…”. Ou seja, somente aquelas áreas que não sejam objeto de aforamento ou ocupação por particulares é que poderiam ser atingidas pela restrição legal, se esta fosse válida. Não quaisquer terrenos de marinha, portanto.
Demais disso, no que tange a loteamentos aprovados pelo Poder Público no passado e já devidamente implementados, a aplicação da referida norma, como vem sendo feita, ofende o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, caracterizando, ainda, retroatividade indevida.
Isto sem falar na ofensa ao princípio da razoabilidade, na medida em que, se levada a extremos esta postura, áreas inteiras do Município passariam a ser de uso público ou coletivo, com flagrante repercussão sobre o direito de propriedade, o que, por evidente, não é de se admitir.
Outros argumentos contrários a esta atitude do Poder Público Municipal podem ainda ser aduzidos, mas, por brevidade, fica-se por aqui, na expectativa de que esta política seja revista ou, então, no novo plano a ser votado por determinação da Justiça, esta verdadeira “aberração jurídica” não seja reproduzida.
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