Diante de dificuldades de manter as atividades de coleta e quebra de coco babaçu no Piauí, Maranhão, Tocantins e Pará – os principais produtores desse fruto – as quebradeiras reivindicam a aprovação da Lei Federal de livre acesso aos babaçuais, no Congresso Nacional desde 2009. Querem também a aprovação de leis no âmbito Estadual e Municipal.

Hoje as mulheres que vivem da atividade de babaçuais – utilizados em diversas atividades econômicas, principalmente na fabricação de dendê – são impedidas de fazer a coleta do fruto nas áreas rurais produtoras. Geralmente elas são agredidas por fazendeiros que vendem a matéria-prima a indústrias de carvão vegetal, utilizado pelas empresas de ferro gusa, por exemplo.

“A luta pelo acesso livre aos babaçuais” foi tema de conferência promovida ontem (25) na 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para Progresso da Ciência (SBPC), que acontece na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), em São Luís.”

O babaçu representa a vida de muitas famílias nos estados produtores”, afirmou a conferencista Maria de Jesus Bringelo, dirigente do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco de Babaçu (MIQCB). Criado no início da década de 1990, o movimento busca evitar conflitos de terras com fazendeiros e uma das vias é a aprovação de Leis no âmbito Federal, Estadual e Municipal.

O babaçu, uma das oleaginosas mais importantes do mundo, exerce função social importante, reunindo 400 mil quebradeiras de coco babaçu nos quatro estados produtores, principalmente Maranhão e Piauí, concentradores da produção. No caso do Maranhão, que detém um dos menores índices de desenvolvimento humano do País, essa atividade representa 50% da agricultura familiar.

Além de enfrentar a concorrência da coleta do babaçu com fazendeiros – que queimam totalmente o produto – as mulheres são envolvidas em conflitos com o agronegócio que avança nas regiões produtoras de palmeiras de babaçu. O plantio de soja e florestas de eucalipto, principalmente, vem ocupando o espaço de terra até então ocupado pelos babaçuais que são derrubados e geram prejuízos ao meio ambiente.

Lamentando a derrubada das palmeiras e a queima total do fruto pelos fazendeiros, Maria de Jesus alerta sobre a importância de preservar as palmeiras de babaçu. Segundo ela, os babaçuais podem ser 100% aproveitados. A palha da palmeira é utilizada na fabricação de produtos artesanais, a casca na fabricação de carvão; e a amêndoa extraída do coco em azeite, óleo e mesocarpo. Inclusive, ela recomenda às mulheres evitar o corte dos cachos de babaçus para não enfraquecer a palmeira.

Visão científica – Mediadora da conferência, a bióloga Rute Maria de Andrade, secretária-geral da SBPC, analisa que a extinção dos babaçuais representa tanto um problema socioeconômico para regiões produtoras da matéria-prima quanto para o meio ambiente. Ou seja, “é um problema para sociedade de forma geral”.

Com esse olhar, Rute, também pesquisadora do Instituto Butantan, em São Paulo, destacou o tema central da 64ª Reunião Anual da SBPC “Ciência, cultura e saberes tradicionais para enfrentar a pobreza”, selecionado exatamente para permitir a interação entre as comunidades científica e tradicional a fim de mostrar os problemas comuns a todos os brasileiros.

Folclore regional – Apresentando dados na conferência, Maria de Jesus destacou a existência de 400 mil quebradeiras de coco babaçu nos quatro principais estados produtores, cuja imagem delas já foi incorporada ao folclore regional. Os babaçuais hoje ocupam uma extensão de área de 18 mil hectares, segundo disse. O fruto está em plena safra que vai de abril a setembro.

Políticas públicas – Apesar de enfrentar conflitos com fazendeiros e empresas, Maria de Jesus disse que a situação das quebradeiras de coco babaçu tem melhorado nas regiões produtoras. Há, porém, muitos desafios a serem enfrentados.

Dentre as melhoras na atividade, a dirigente do MIQCB citou o acesso a políticas de comercialização de babaçu para algumas prefeituras e o acesso às linhas de crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Com isso, as mulheres passaram a contar com a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) – emitida pelo Movimento que foi autorizado a fazer a certificação. Alguns projetos do movimento têm, também, apoio de outros órgãos governamentais, de empresas e fundações internacionais.

Maria de Jesus acrescenta a criação de uma cooperativa para auxiliar a comercialização do produto, além de parcerias com empresas nacionais em andamento para a compra do produto.

Óleo e dendê são os principais produtos fabricados pelas próprias quebradeiras de coco babaçu. É um trabalho artesanal. Elas coletam o coco e o quebram com o machado para extrair a amêndoa do babaçu, depois elas produzem o dendê ou óleo, agregando valor ao fruto em uma área do MIQCB e da cooperativa, sediados em São Luís, ou nas unidades regionais.

Legislação pontual – Algumas normas que beneficiam as quebradeiras de coco babaçu avançaram na esfera municipal. Estima-se que mais de 10 municípios onde o Movimento atua aprovaram a “lei do babaçu livre”. Mesmo assim, Maria de Jesus alerta que essa lei requer aprimoramento, porque há dificuldade em seu cumprimento e o acesso aos babaçuais é permitido apenas às quebradeiras com carteira de certificação. “Proprietários rurais não respeitam o direito conquistado pela quebradeira de coco. É por isso que estamos na luta também pela Lei Estadual e Federal”, disse Maria de Jesus.

Ela reconhece também como um avanço a aprovação da Lei Estadual no Maranhão em que cria o Dia das Quebradeiras de Coco – comemorado em 24 de setembro. A expectativa é de que essa medida seja também estendida para a esfera Federal.

Gargalos – Como desafios, além da aprovação da Lei de livre acesso aos babaçuais nas três esferas de governo, ela defende a implementação de políticas públicas para acabar com a violência no campo contra as mulheres; e a retirada de cercas elétricas nas áreas de coleta dos babaçus impostas para impedir a entrada de quebradeiras, dentre outros.

Fonte: Jornal da Ciência