Competência do IBAMA para licenciar empreendimento que intercepta terra indígena

A Lei Complementar n. 140/2011 alterou substancialmente a sistemática de divisão de competências entre os entes federativos para o licenciamento ambiental, bem como exigiu um instrumento de cooperação para a delegação de competência. Esse é o teor da Orientação Jurídica Normativa (OJN) n. 33/2012 da Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (PFE/IBAMA).

Referida OJN assentou que, antes da entrada em vigor desse diploma legal, a regra geral para definição da competência para o licenciamento ambiental era a abrangência do impacto, sendo o órgão federal competente para o licenciamento de empreendimentos ou atividades de significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional. Entretanto, com a edição da LC 140/2011, o critério preponderante passou a ser a localização do empreendimento ou atividade, e não mais a abrangência do seu impacto, sendo que os casos de competência da União foram expressamente previstos.

A partir dessa premissa, a PFE/IBAMA determinou que a competência para a condução de licenciamento ambiental de empreendimento que intercepte terras indígenas é da União, mesmo que ele não cause impacto ambiental de âmbito nacional ou regional. Ainda reiterou que, nesses casos, é necessária observância das exigências apresentadas pela FUNAI, órgão interveniente do processo de licenciamento. Por fim, afastou a argumentação da Procuradoria do Estado, assentando que o fato de o empreendimento (pavimentação e duplicação de rodovia) se localizar em faixa de domínio de via já existente não exclui a sua inserção em terra indígena demarcada.

Apesar de configurada a competência da União, a PFE/IBAMA destacou a possibilidade de sua delegação a outros entes federativos, desde que respeitados os requisitos da LC n. 140/11, especialmente que o órgão tenha capacidade técnica para assumir a ação administrativa que lhe está sendo delegada. As exigências estabelecidas em outros diplomas legais, como a lei que regula os contratos administrativos (Lei n. 8.666/93), também precisam ser atendidas. Assim, a delegação de competência deve ser formalizada por um instrumento bilateral de cooperação, que será um: (a) convênio, se houver repasse de recursos, ou (b) acordo de cooperação, caso não haja previsão de transferência de recursos.

Caso o licenciamento ambiental já tenha sido iniciado por órgão ambiental incompetente, a PFE/IBAMA registrou que caberá ao IBAMA decidir sobre a validade dos atos já praticados, podendo convalidá-los, por meio de uma ratificação ou exigindo reformas, ou então anulá-los. A convalidação poderá ser feita tanto se o órgão federal assumir o licenciamento, quanto no caso de delegar a competência. Nesta última situação, as condições de validade ou exigências de correção devem constar de forma expressa e motivada do ato de delegação.

A OJN n. 33/2012 ainda aborda os casos em que existem situações jurídicas consolidadas (ex.: a licença emitida pelo órgão incompetente tenha esgotado seus efeitos legais). Nessa hipótese, considera mais adequado que o IBAMA exija correções nas fases posteriores do licenciamento ou previamente à renovação da licença.

Embora trate especificamente de projetos que interceptam terras indígenas, a referida orientação jurídica normativa repercute também em outros casos, pois analisa o novo sistema de distribuição de competências para o licenciamento ambiental, inaugurado pela LC n. 140/2011. De acordo com esse diploma, que adotou a localização como critério para definição do órgão competente, se os impactos ambientais de um empreendimento ultrapassar os limites estaduais, mas este estiver localizado integralmente no interior de um único Estado, seu licenciamento ambiental será de competência do órgão estadual, e não do IBAMA, como acontecia anteriormente.

Por fim, considerando que o critério adotado pela lei complementar é objetivo (localização do empreendimento ou atividade), em oposição ao então vigente, abrangência do impacto ambiental, de índole eminentemente subjetiva, esta interpretação da PFE/IBAMA sobre a LC n. 140/2011 deve conferir maior segurança jurídica a novos empreendimentos.

Por: Buzaglo Dantas