O licenciamento ambiental de termelétricas

Com a provável retomada do carvão mineral nos leilões da ANEEL, devido ao risco de racionamento de energia que novamente assustou o país, os projetos de termelétricas que estavam parados tendem a sair do papel, com vistas a garantir a segurança energética nacional.

Nesse contexto, é importante notar que, ao avaliar um projeto de investimento, o empreendedor assume tanto riscos referentes ao negócio propriamente dito, quanto riscos decorrentes do ambiente macroeconômico no qual se insere. Em ambos os casos se coloca frente a situações que está acostumado a avaliar, administrar e até mesmo mitigar as fontes de incerteza. Ocorre, entretanto, que algumas atividades requerem a aprovação do ente estatal por afetarem de forma significativa o meio ambiente. Nesses casos, o chamado risco jurídico insere no fluxo de caixa dos projetos uma aleatoriedade que muitas vezes têm o pior impacto possível nos retornos esperados: a paralisação ou atraso do empreendimento.

A avaliação, a mitigação e, por que não, a possível blindagem dessas ocorrências danosas se colocam como fatores fundamentais ao retorno esperado do empreendimento. Com efeito, é de suma importância a análise, acompanhamento e gerenciamento do risco jurídico ao longo do curso de um projeto.

Tendo em vista que para construção de uma termelétrica, o empreendedor deve, obrigatoriamente, submeter-se a um prévio processo de licenciamento ambiental, em que se identifica se a é viável ou não sob o ponto de vista dos impactos ao meio ambiente, nesse cenário é que se devem concentrar os cuidados do empreendedor.

Nem mesmo o fato de a licença ambiental já ter sido emitida afasta a importância da análise e do gerenciamento do risco jurídico do projeto. Isso porque, dadas as diversas alterações por que passou a legislação ambiental nos últimos tempos, como a entrada em vigor do Novo Código Florestal, da Lei de Competências Ambientais e de diversos outros diplomas normativos. Assim sendo, projetos que estavam parados diante da falta de leilões envolvendo o carvão mineral, devem ser reavaliados não apenas sob o ponto de vista econômico-financeiro, mas também sob uma perspectiva jurídico-ambiental. Isso é importante para se quantificar adequadamente o investimento necessário nos estudos e programas ambientais, quanto para se ter uma previsão confiável a respeito do cronograma de implantação e, dessa forma, evitar o risco de que sejam aplicadas multas pelo órgão regulador ou, até mesmo, a revogação de licença, como aconteceu recentemente com uma termelétrica no Espírito Santo.

Nesse contexto, atenção especial deve ser dada à definição do órgão ambiental competente para a condução do processo de licenciamento ambiental. A competência comum para licenciar, compartilhada pela União, Estados, e Municípios, ocasiona diversos conflitos de atribuição no curso desse processo. Isso pode, muitas vezes, acarretar a paralisação do empreendimento, com o consequente atraso no cronograma das obras e outros prejuízos ao empreendedor, trazendo-lhe uma incômoda falta de segurança jurídica.

Além da competência, merece também ser tomada com bastante cuidado a decisão sobre qual estudo técnico será elaborado pelo empreendedor para o licenciamento ambiental, se estudo prévio de impacto ambiental e seu respectivo relatório (EIA/RIMA) – mais complexo, moroso e custoso – ou outros estudos simplificados.

Destacam-se, ainda, as cautelas que devem ser adotadas quando se discute a necessidade de supressão de vegetações para instalação do projeto termelétrico. As novas regras introduzidas pelo Novo Código Florestal são aplicáveis, assim como outros diplomas legais e normativos que regulam a matéria, como a Lei da Mata Atlântica, dependendo do caso. A supressão, que necessita ser autorizada pelo órgão competente, na grande maioria dos casos, envolve questões complexas, como a definição correta da compensação ambiental e a necessidade ou não de anuência de outros órgãos ambientais, que, se bem gerenciados, podem reduzir custos e prazos na implantação de um projeto.

Outra questão que merece uma análise mais detida é a interface com os órgãos públicos que intervém no processo de licenciamento ambiental, como Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI). É necessário avaliar se, de fato, tais órgãos possuem competência para atuar no caso concreto e, se sim, quais são os limites e os efeitos de suas manifestações. Além disso, não se pode perder de vista a relação com o Ministério Público que, com cada vez mais frequência, instaura inquéritos civis para acompanhar os processos de licenciamento ambiental.

O cuidado com a adoção dos estudos e medidas para mitigar e/ou compensar a emissão dos gases de efeito estufa também é fundamental. Além da legislação federal, muitos Estados já regularam essa matéria, sendo indispensável que o teor desses diplomas legais seja levado em consideração no licenciamento ambiental de uma usina termelétrica. Desse modo, mantém-se o equilíbrio do projeto, reduzindo sua contribuição para as mudanças climáticas. E, ao mesmo tempo, esvazia o discurso ideológico de determinados setores da sociedade, que veem com maus olhos a implantação de um projeto termelétrico, pois consideram que, já nesse momento tecnológico, as usinas eólicas e solares podem, sozinhas, dar conta da demanda energética brasileira.

A participação de todos esses atores, somada às imperfeições da legislação de regência, infelizmente, podem acarretar a judicialização dos processos de licenciamento, principalmente quando são empreendimentos com grande repercussão social, a exemplo das termelétricas. Para evitar a discussão judicial de um licenciamento ambiental, que não é interessante para ninguém – nem para o empreendedor, nem para o meio ambiente, e muito menos para a sociedade – e que outros riscos se concretizem (como a aplicação de multas e embargos por órgãos públicos), torna-se de extrema importância que haja a avaliação, o acompanhamento e o gerenciamento dos riscos jurídicos ao longo de todo o processo de implantação do empreendimento, para que o projeto tenha sólida sustentação técnico-jurídica e os stakeholders sejam identificados e gerenciados em tempo oportuno, de modo a evitar ou, pelo menos, minimizar os riscos do licenciamento ambiental, contribuindo para o desenvolvimento sustentável do país.

Por: Buzaglo Dantas

2013-05-02T15:09:18+00:002 de maio de 2013|

Superação das barreiras ambientais à expansão das energias alternativas limpas

O Brasil orgulha-se por possuir uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, constituída por 88% de fontes renováveis, das quais se destaca o aproveitamento hidrelétrico (75% da atual capacidade instalada). Contudo, diante do esgotamento dos recursos hidráulicos próximos aos centros urbanos, das dificuldades nos licenciamentos ambientais de hidrelétricas e de linhas de transmissão, das barreiras logísticas à expansão dessa matriz em regiões remotas, o país viu-se obrigado a buscar outras fontes de energia, para possibilitar a manutenção de seu desenvolvimento econômico.

Nesse contexto, o Brasil enfrentou uma questão fundamental: a necessidade de expansão da capacidade instalada de energia de 5 GW ao ano (equivalente a construção de uma usina hidrelétrica de Belo Monte a cada dois anos), permitindo assim o crescimento do seu PIB anualmente a uma média de 5%, sem comprometer a matriz limpa e sem exigir a execução de obras que causem graves impactos e riscos ao meio ambiente e elevadas dificuldades logísticas.

A resposta para essa questão tem sido encontrada nas pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), usinas de biomassa e eólicas. Essas fontes alternativas, além de serem renováveis e colaborarem com a redução da emissão de gases de efeitos estufa, contribuem para a diversificação da matriz energética brasileira, reduzindo a dependência em relação à matriz hídrica. Desse modo, diminui-se o risco de novos apagões, como o ocorrido em 2001, e de racionamentos de energia, que afligem outros países da América do Sul, a exemplo da Bolívia.

A perspectiva das fontes alternativas de energia é de expansão. O Plano Decenal de Expansão de Energia (PDEE) 2020 prevê crescimento médio anual de 12% dessas fontes. Isso faz com que a participação delas no parque de geração da energia nacional passe dos atuais 8% (9 GW) para 16% (27 GW) no ano de 2020. Para se ter uma ideia da importância das fontes alternativas, esse crescimento equivalerá à construção de uma usina 50% maior que Itaipu.

A previsão do PDEE 2020 é que o crescimento das fontes alternativas seja bem superior ao das hidrelétricas e termelétricas. A principal matriz brasileira, embora continue crescendo, terá sua participação reduzida dos atuais 75% (83 GW) para 67% (115 GW), e a participação das termelétricas diminuirá de 16% (16 GW) para 15% (25 GW) em 2020.

É importante registrar que o poder público tem se mostrado disposto em subsidiar essas fontes de energia, apesar da alta carga tributária que reduz a competitividade brasileira. Isso fica claro na participação exclusiva de usinas de biomassa e eólica no 4º Leilão de Energia de Reserva (agosto/2011) e no Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (PROINFA) – prorrogado por mais um ano. Outrossim, a existência de um setor específico no BNDES para financiamento de empreendimentos relacionados às energias alternativas e sua previsão de liberar nesse ano para atividades relacionadas à energia eólica o triplo do anterior, atingindo a quantia de R$ 2,5 bilhões, corroboram a disposição federal para incentivar o setor. Alguns governos estaduais também estão adotando medidas de incentivo às fontes alternativas. É o caso de São Paulo, que reduziu os tributos que incidem sobre equipamentos para geração de energia solar e eólica.

Nessa perspectiva, as oportunidades de negócios envolvendo as fontes alternativas de energia são extraordinárias, razão pela qual o setor atrai bilhões de reais em investimentos por ano.

Em que pese os incentivos e boa vontade da maioria dos entes públicos, os empreendedores devem estar atentos à ausência de um marco regulatório quanto às exigências ambientais prévias à instalação de novos empreendimentos, cercando-se de cuidados jurídicos que reduzam os riscos do investimento.

A complexa legislação ambiental, embora vasta, não preenche lacunas fundamentais (como a falta de regras claras para definição do órgão competente para o licenciamento ambiental), conferindo pouca sustentação legal aos projetos de desenvolvimento energético. Essa realidade não só causa conflitos entre empreendedor, Ministério Público, ONGs e entre os próprios órgãos públicos, como estimula uma excessiva judicialização do licenciamento ambiental. Até mesmo as normas que surgem para desburocratizar, como a que simplificou o licenciamento de empreendimentos de pequeno porte (Resolução CONAMA n. 279/01), resultam em ineficácia e insegurança aos envolvidos. Por sua vez, a duvidosa qualidade dos estudos técnicos contribuem pouco para suprir a falta de profissionais qualificados nos órgãos públicos. O resultado de tudo pode ser um procedimento caro, moroso, burocrático e – o pior de tudo – imprevisível, prejudicial aos interesses de empreendedores e do país.

O mercado, por sua vez, reflete essa realidade, mostrando-se, senão desconfiado, ao menos pouco confortável com os óbices impostos pelas leis ambientais à expansão das fontes alternativas. Isso fica claro, por exemplo, na avaliação realizada pelos analistas do Banco Santander, que entendem que um dos principais riscos para o investimento em uma empresa do setor eólico é a dificuldade de aquisição das licenças ambientais.

Por se tratar de um setor relativamente novo, ainda em desenvolvimento e consolidação, tanto em aspectos técnicos e de engenharia, como em sua regulação, é importante que o empreendedor considere a variável ambiental como um relevante fator estratégico. Essa variável deve ser considerada em todas as fases de um possível investimento, desde a definição da cidade e do imóvel onde será instalado o empreendimento, passando por toda a fase de licenciamento ambiental e obras de instalação, até a sua efetiva entrada em operação.

A estratégia na condução da variável ambiental e na relação com os stakeholders do licenciamento é indispensável para conferir segurança e previsibilidade ao empreendimento. Evita possíveis questionamentos judiciais, que podem paralisar obras e a atividade. Permite que as demandas de energia contratadas em projetos ainda em implantação sejam atendidas. Garante ao empreendedor a manutenção do cronograma do projeto e dos compromissos assumidos com terceiros. E, principalmente, assegura aos investidores retorno de seus investimentos. Dessa maneira, não ganha só quem empreende, mas também o país, que passa a ter energia garantida para seu desenvolvimento social e econômico. É uma opção técnica e confiável para superar esse paradoxo que são as barreiras ambientais à expansão das energias alternativas limpas.

Por: Buzaglo Dantas

2011-08-31T14:01:10+00:0031 de agosto de 2011|
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