ATP/MP/SP Nº 035/2010 – PGJ
O Procurador-Geral de Justiça, no uso de suas atribuições e a pedido do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Cíveis e de Tutela Coletiva (área de Habitação e Urbanismo e de Meio Ambiente), AVISA aos Membros do Ministério Público que:
Considerando o aumento progressivo dos desastres ocorridos nas últimas décadas no Estado de São Paulo, a exemplo dos recentes acontecimentos noticiados pela imprensa, associados aos deslizamentos de encostas e inundações, decorrentes de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, com graves consequências, envolvendo danos humanos, ambientais e/ou materiais com prejuízos econômicos e sociais;
Considerando que dentre as várias modalidades de espaços territoriais especialmente protegidos (artigo 225, § 1º, III, da CF) estão incluídas as Áreas de Preservação Permanente (Artigos 2º e 3º da Lei nº 4.771/65; Resolução CONAMA nº 303/2002; Resolução CONAMA nº 302/2002), definidas pelo Código Florestal; destinados a cumprir múltiplas funções ambientais (incluindo a manutenção da estabilidade geológica); e que a sua devida gestão, em todo território nacional, em respeito à legislação ambiental bem vigor, é indispensável para a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, da qualidade ambiental e da qualidade de vida;
Considerando que a Constituição do Estado de São Paulo, atentando de forma explícita ao princípio da segurança, dispõe em seu artigo 180 que no estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:
I – Pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantia do bem estar de seus habitantes;
IV – a criação e manutenção de áreas de especial interesse histórico, urbanístico, ambiental, turístico e de utilização pública;
V – A observância das normas urbanísticas, de segurança, higiene e qualidade de vida; e
VI – A restrição à utilização de áreas de risco geológicos;
Considerando que o desmatamento, a ocupação de áreas inapropriadas ou legalmente protegidas, a execução de cortes e aterros instáveis para construção de moradias e vias de acesso, a deposição de lixo em encostas, a ausência de sistemas de drenagem de águas pluviais e de esgotamento sanitário, a elevada densidade populacional e a fragilidade das moradias aumentam tanto a frequência das ocorrências como a magnitude dos acidentes;
Considerando a necessidade de prevenção das ocupações nas áreas frágeis e ambientalmente protegidas e a necessidade de acompanhamento dos licenciamentos ambientais e urbanísticos em tais áreas;
Considerando que foram desenvolvidas metodologias para o diagnóstico dos problemas regionais associados aos deslizamentos de encostas, inundações e a outros eventos adversos, assim como para o planejamento do uso e ocupação do solo, que geraram as cartas geotécnicas;
Considerando que a ausência ou má aplicação de políticas públicas de desenvolvimento urbano e habitacional, tem como uma de suas consequências mais notáveis levar parte da população a ocupar áreas ambientalmente não próprias, sobretudo para a habitação, especialmente em margens de rios e encostas, acarretando o agravamento do problema;
Considerando que a prevenção dos desastres associados a deslizamentos de encostas deve fazer parte da gestão do território e da política de desenvolvimento urbano, constituindo-se, portanto, em uma atribuição municipal, sem prejuízo da atuação dos demais entes federados no âmbito de suas atribuições;
Considerando que o agravamento do problema estimulou o Ministério das Cidades a implementar ações de apoio à prevenção e erradicação de riscos em assentamentos precários, com apoio técnico e financeiro para elaboração, pelo município, do Plano Municipal de Redução de Risco (PMRR), instrumento de planejamento que contempla o diagnóstico de risco, as medidas de segurança, a estimativa de recursos necessários e o estabelecimento de prioridades;
Considerando que o Plano é parte de uma política pública para redução de risco a qual que inclui o fortalecimento institucional das administrações municipais, por meio de programas de capacitação em escala nacional e suporte financeiro não só para a execução do PMRR, como também para a elaboração de projetos de engenharia destinados às intervenções nos setores de risco, classificados como prioritários pelo PMRR;
Considerando que no processo de elaboração do PMRR é prevista a realização de uma Audiência Pública para a validação política do PMRR; Considerando que e as ações de defesa civil são articuladas pelos órgãos do SINDEC (Decreto nº 5.376, de 17.02.2005), nas esferas federal, estadual e municipal, esta última representada pelas Coordenadorias Municipais de Defesa Civil – COMDEC ou órgãos correspondentes e Núcleos Comunitários de Defesa Civil – NUDEC, ou entidades correspondentes, responsáveis pela articulação e coordenação do Sistema em nível municipal;
Considerando que no Estado de São Paulo, foi criado o Plano Preventivo de Defesa Civil – PPDC específico para escorregamentos nas encostas da Serra do Mar, conforme Decreto Estadual n° 42.565/97, abrangendo os Municípios de Cubatão, Guarujá, Santos e São Vicente, localizados na Baixada Santista, e Caraguatatuba, Ilhabela, São Sebastião e Ubatuba, localizados no Litoral Norte;
Considerando que foram incorporadas ao sistema PPDC 16 cidades da região do Vale do Paraíba, 13 cidades da região de Campinas, 7 cidades da região de Sorocaba e mais 7 cidades da região do ABCD, no período de 2000 e 2003;
Considerando que o PPDC tem por objetivo principal dotar as equipes técnicas municipais de instrumentos de ação, de modo a, em situações de risco iminente, reduzir a possibilidade de registro de perdas de vidas humanas decorrentes de escorregamentos;
Considerando que, embora não reconhecida, a redução dos desastres naturais esteja indiretamente associada a várias ações que se desenvolvem nas instâncias federal, estadual e municipal como parte de Políticas Públicas nas áreas de Habitação, Saneamento Básico, Recursos Hídricos, Educação e Meio Ambiente;
Considerando que a Constituição Federal reconhece o plano diretor como instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana e que compete às COMDEC analisar e recomendar a inclusão de áreas de riscos neste plano, conforme Decreto nº 5.376, de 17.02.2005;
Considerando que a Resolução nº 34, de 01 de julho 2005, do Ministério das Cidades, que contém as orientações quanto ao conteúdo mínimo do Plano Diretor, recomenda a demarcação das áreas sujeitas a inundações e deslizamentos, bem como as áreas que apresentem risco à vida e à saúde;
Considerando as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento básico dispostas na Lei nº 11.445/07 (art. 3º, inciso I, “d”), bem como a necessidade de que os municípios efetuem adequada gestão da drenagem e manejo das águas pluviais urbanas (conjunto de atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas); RECOMENDA aos Promotores de Justiça de Habitação e Urbanismo do Estado de São Paulo, sem caráter vinculativo, que nos respectivos municípios de suas comarcas investiguem junto ao poder público municipal:
1. Existência de Plano Municipal de Redução de Risco (PMRR), com apresentação do mesmo em caso positivo;
2. Justificativas da inexistência de Plano Municipal de Redução de Risco (PMRR);
3. Cronograma de implementação das medidas preventivas e corretivas do Plano Municipal de Redução de Risco (PMRR);
4. Demonstração da implementação das medidas preventivas e corretivas do Plano Municipal de Redução de Risco (PMRR);
5 Existência de Plano Preventivo de Defesa Civil (PPDC), com apresentação do mesmo em caso positivo;
6. Justificativas da inexistência de Plano Preventivo de Defesa Civil (PPDC);
7. Cronograma de implementação das medidas preventivas e corretivas do Plano Preventivo de Defesa Civil (PPDC), quando existente;
8. Demonstração da capacitação técnica para a implementação do Plano Preventivo de Defesa Civil (PPDC) e da articulação dos órgãos necessária para a eficácia do mesmo;
9. Demonstração da demarcação das áreas sujeitas a inundações e deslizamentos, bem como as áreas que apresentem risco à vida e à saúde em zonas especiais de interesse social (ZEIS), conforme inciso III do artigo 5º da Resolução nº 34, de 01 de julho 2005, do Ministério das Cidades;
10. No que se refere aos Planos Diretores Municipais, avaliação crítica e acompanhamento permanente, no sentido de garantir que no âmbito de sua elaboração sejam devidamente mapeadas e delimitadas espacialmente em cartografia georreferenciada, com escala adequada, as determinações já explicitadas na legislação pertinente, passíveis de serem espacialmente delimitadas, incluindo, no mínimo, aspectos como:
a) Áreas de Preservação Permanente (Lei nº 4.771/65; Resolução CONAMA nº 303/02; Resolução nº 302/02);
b) Remanescentes de ecossistemas naturais legalmente protegidos (inclui Ecossistemas da Mata Atlântica, Cerrado, entre outros);
c) Terrenos de Marinha (Decreto nº 9.760/46) ou outras áreas consideradas da União (quando for o caso);
d) Unidades de Conservação de Proteção Integral e de Uso Sustentável, segundo a Lei nº 9.985/2000;
e) Áreas de risco, incluindo áreas sujeitas a deslizamentos, inundações e enchentes;
f) Delimitação específica das áreas de características rurais e urbanas, promovendo-se a sua sobreposição com os limites oficiais de tais áreas;
g) Identificação das áreas com processos de ocupação humana irregular;
h) Áreas da Várzea.
11) Verificação da existência de Plano Diretor de Macrodrenagem, com apresentação do mesmo em caso positivo, com as devidas licenças e situação de implementação.
RECOMENDA, também, aos Promotores de Justiça do Meio Ambiente, sem caráter vinculativo, que nos respectivos municípios de suas comarcas investiguem e acompanhem junto ao poder público estadual e/ou municipal:
1. Os licenciamentos ambientais e/ou urbanísticos que envolvam a intervenção nas áreas frágeis e ambientalmente protegidas citadas nos itens “a”, “b”, “d”, e “h”, supra, acompanhando-os;
2. A preservação do Patrimônio Cultural e Natural, incluindo as Áreas Naturais Tombadas, os bens culturais, os sítios Arqueológicos, comunidades tradicionais, quilombolas, entre outros.
Por fim, RECOMENDA, sem caráter vinculativo, aos Promotores de Justiça de Habitação e Urbanismo e do Meio Ambiente, que adotem as providências necessárias para a devida aplicação, em sua esfera de atribuições, dos comandos gravados na Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, que instituiu o Código Florestal, notadamente os limites das áreas de preservação permanente previstas no ser artigo 2º, alínea a, cujo cômputo se inicia a partir do nível mais alto do corpo d’água, nele se compreendendo o leito maior sazonal e/ou a planície de inundação, cujo complexo (ecossistema) é compreendido pelas áreas de várzea, leito menor e diques marginais.