ANÁLISE DA SUSPENSÃO DE LICENÇA AMBIENTAL EM RAZÃO DE LITIGÂNCIA CLIMÁTICA NO RIO GRANDE DO SUL
Tramita na Justiça Federal do Estado do Rio Grande do Sul uma ação civil pública (5050920-75.2023.4.04.7100/RS) que contesta a licença de operação da Usina Termelétrica Candiota III e da Mina de Carvão Mineral Candiota, com fundamento na crise climática e no caráter obrigatório da Política Nacional de Transição Energética (PNTE), Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC e do Acordo de Paris, recepcionado no Decreto n. 9.073/2017.
Além das indústrias, a ação é proposta também em face de entes públicos Estado do Rio Grande do Sul, FEPAM, IBAMA, ANEEL e União, em que se contesta a inação dessas entidades em face das normas que orientam a transição energética.
Em sentença recente proferida no âmbito dessa ação, entre diversas outras medidas, foi determinada a suspensão da licença de operação da Usina e da Mina e da inclusão de condicionantes climáticas a serem acompanhadas pelo IBAMA e pela FEPAM.
É fato que a transição energética caminha a passos lentos, em descompasso com as mudanças no clima já sentidas no País, e a propositura de ações coletivas em busca de incentivar a atuação governamental é uma ferramenta cada vez mais buscada nos tribunais, a chamada litigância climática.
Contudo, a dificuldade de implementação das políticas públicas de transição energética, como a Política Nacional de Transição Energética, não pode ser atribuída a uma falha do setor produtivo ou do procedimento licenciatório, que é conhecidamente rigoroso, mas sim da ausência de uma norma federal que regulamente de que forma se dará a compensação, abatimento e ou mitigação as emissões de GEE no licenciamento ambiental.
Apesar de já exigirem medidas compensatórias aos empreendimentos impactantes, de acordo com a Instrução Normativa IBAMA n. 12 de 23 de novembro de 2010, não se pode exigir uma conduta específica tão complexa quanto a compensação de gases de efeito estufa sem que haja uma norma regulamentadora.
Nesse sentido, a transição energética trata-se justamente disso, de uma transição de um modelo produtivo mais gerador de gases de efeito estufa para um modelo de menor impacto. Caso se encerre sumariamente todas as operações produtivas no país por inobservância da PNMC, da PGMC e do Decreto Estadual número 56.347/2022, não se tratará mais de transição.
Como o próprio réu na ação civil pública, IBAMA, asseverou que a extinção desses tipos de empreendimentos, de um modo abrupto, poderia levar o país a uma crise minerária e energética, sem atingir resultados relevantes na redução da emissão de gases do efeito estufa e que o que deveria ser realizado seria a expansão da oferta de outras fontes de energia e o incremento da utilização do carvão vegetal originário de florestas plantadas.
Ou seja, a suspensão de operações como a das termelétricas inclusive pouco representa quando comparado a outros processos industriais.
Por outro lado, incluir condicionantes climáticas no licenciamento ambiental futuro de empreendimentos poluidores, pode sim ser uma saída estratégica para o atendimento dos planos climáticos em vigor, desde que haja previsão normativa para tanto. Assim como a elaboração de planos de transição energética estratégicos pelos estados da federação, como proposto na ação civil pública como obrigação do Estado do Rio Grande do Sul.
Além disso, o que se entende como grave na sentença proferida na presente ação civil pública é a imposição de multa diária aos órgãos ambientais públicos, União e o Estado do Rio Grande do Sul que não atenderem às determinações da sentença no prazo estabelecido. A transição energética é urgente, não há dúvidas quanto a isso, mas a separação de poderes exige no mínimo diálogo entre os poderes quando se trata de um tema tão relevante quanto o planejamento climático estratégico.
Por fim, reitera-se que a existência de uma indústria devidamente licenciada de acordo com as normas em vigor, seja ela qual for, não pode ter sua licença cassada por normas alheias ao processo de licenciamento, como as políticas de transição energética. Cabe ao legislador determinar, ou não, as condicionantes ambientais relacionadas às políticas climáticas.
Por: Luna Rocha Dantas