Seis décadas depois da criação da Petrobras, o Brasil se prepara para uma das maiores licitações já realizadas na indústria do petróleo em todos os tempos. O bônus de assinatura para a outorga de blocos no Campo de Libra, no pré-sal da Bacia de Santos, foi fixado em R$ 15 bilhões pelo Conselho Nacional de Política Energética. A exploração em larga escala das reservas do pré-sal é considerada decisiva para consolidar o país como um grande produtor de petróleo, num cenário em que a commodity seguirá como a principal fonte de energia global.
O objetivo é elevar a produção diária do país, de 2,5 milhões de barris para 5,43 milhões em 2020, segundo projeções da Empresa de Pesquisa Energética. Com isso, o Brasil terá o maior acréscimo na produção de petróleo e gás nesta década, fora do âmbito da Organização dos Países Produtores e Exportadores de Petróleo (Opep). Isso vai exigir investimentos bilionários na cadeia produtiva do setor. Só em exploração e produção, a soma pode chegar a US$ 309,7 bilhões no período de 2012 a 2021.
Para concretizar os projetos, a Petrobras vai colocar em operação 38 novas plataformas de produção, 28 sondas, 89 navios de transporte de petróleo e derivados e 198 novos barcos de apoio de grande porte. No processo, a indústria naval empregará até 2016, 100 mil pessoas. Um salto gigantesco desde 2003, quando o setor empregava 2,5 mil trabalhadores. A Petrobras também promete quatro novas refinarias em operação, que elevariam a capacidade de processamento dos atuais 2,1 milhões de barris por dia para 3,7 milhões.
Segundo Alberto Machado, coordenador do MBA de Gestão em Petróleo e Gás da FGV, a meta é factível, pois tem como base reservas já descobertas e não conta descobrimentos de jazidas futuras, no pré-sal ou fora dele.
“Tudo vai depender, no entanto, do cronograma de investimentos e também da velocidade de desenvolvimento da indústria”, diz. “Para o Brasil, não adianta se tornar apenas um exportador de petróleo sem impulsionar a indústria local”.
Para atingir esse objetivo, a Agência Nacional do Petróleo impôs metas de adoção de conteúdo nacional nas encomendas vinculadas a novas licitações. Na 11ª Rodada, realizada em maio, o conteúdo local médio para a fase de exploração foi de 62,32% e, para a fase de desenvolvimento, chegou a 75,96%. No primeiro leilão do pré-sal, o índice nos contratos de partilha será de 37% para a fase de exploração e de 15% para os testes de longa duração. Para os módulos da fase de desenvolvimento iniciados até 2021, o percentual exigido será de 55%. A partir de 2022, o número sobe para 59%.
A Petrobras avalia que a indústria nacional tem demonstrado boa capacidade de resposta, que poderia melhorar ainda mais com o aporte de tecnologias de fabricação e montagem para a industrial e naval e com investimentos em engenharia – projetos básicos e executivos, engenharia industrial e de produto. Essa evolução poderia vir da associação entre empresas e universidades, para incorporar conhecimentos genuinamente nacionais; ou da parceria com empresas estrangeiras.
Jean Paul Prates, diretor-geral do Centro de Estratégias e Recursos Naturais em Energia (Cerne), diz que, embora seja desejável impulsionar a indústria nacional, esse objetivo não pode ser um obstáculo para a atividade de exploração. “O desafio é integrar essa indústria gigantesca que é o setor de petróleo à economia brasileira”, diz. “Não podemos adotar um laissez-faire total, com baixa geração de empregos e sem desenvolver a indústria, como aconteceu em países como Venezuela e Angola; mas também não podemos cair em um protecionismo radical”.
Segundo o professor de Planejamento Energético Alexandre Szklo, da Coppe-UFRJ, cita a construção de navios-plataforma como um dos maiores desafios para o cumprimento da meta de produção prevista para 2020. Os chamados FPSO são fundamentais para exploração em águas distantes da costa, como o pré-sal, pois integram produção, armazenagem e transporte em uma só unidade. Atualmente, a frota mundial de navios-plataforma é composta por 160 unidades em operação. Desse total, 34 operam no Brasil.
Além desses, a Petrobras tem encomendados mais 24 navios para entrega até 2020. Dez são novas unidades, e os demais são embarcações que serão reformadas para uso como FPSO. Esse volume representa mais de 50% do total de encomendas da indústria naval global nesse segmento específico.
“Calculamos que sejam necessários 72 navios-plataforma para atender ao pré-sal, portanto ainda faltariam 14 unidades que nem sequer foram encomendadas para suprir a demanda. Supondo que não haja atraso na entrega dessas embarcações”, diz Szklo. Por outro lado, afirma, atualmente há capacidade ociosa na frota mundial de navios petroleiros.
Outro desafio importante é a capacitação da mão de obra. Para Gary Ward, diretor da empresa britânica de recrutamento Hays, o desafio da mão de obra não é uma exclusividade brasileira. Segundo ele, todos os países que desenvolveram uma indústria de petróleo forte enfrentaram esse problema durante o processo.
Fonte: Valor Econômico
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