Impactos decorrentes da extração da rocha afetam reservas subterrâneas de água e podem causar doenças. Nos EUA, operação segue a todo vapor

Impulsionado pela revolução econômica que promoveu nos Estados Unidos nos últimos anos, o gás de xisto foi alçado à posição de nova promessa na geração de energia. Mas os impactos ambientais conhecidos até agora são preocupantes e muitos ainda são ignorados. Além de gerar resíduos tóxicos e ameaçar reservas subterrâneas de água, a potencial exploração de gás de xisto no Brasil também pode desviar o foco de esforços em busca de alternativas energéticas renováveis.

Boa parte da polêmica está relacionada ao processo de extração, chamado de fraturamento hidráulico (fracking, em inglês), como pode ser observado no infográfico abaixo. Também chamado de shale gas, em inglês, ou gás não convencional, a exploração do gás de xisto usa grandes quantidades de água. A estimativa é que um poço use 15 milhões de litros de água, e a metade retorna à superfície contaminada por produtos químicos.

Nos Estados Unidos, onde a operação segue a todo vapor, vários pontos de contaminação foram encontrados. Virou um ícone daqueles que condenam à exploração de gás de xisto a imagem de torneiras que vertem água e chamas. Os riscos ainda desconhecidos são os que mais assustam. Há suspeitas de que pessoas tenham desenvolvido doenças em função do consumo de água contaminada.

Geólogo e vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP), Colombo Tassinari acredita que o que falta é estudo sobre as possibilidades de exploração do gás de xisto. O gás pode vazar durante a extração, mas um processo correto de selamento dos poços poderia diminuir os riscos. Ele também ressalta que, às vezes, o gás vaza naturalmente, sem qualquer intervenção humana. “Há relatórios de instituições confiáveis que demonstram que não tem essa contaminação toda”, comenta.

Moratória

O Congresso Nacional discute a possibilidade de declarar moratória na exploração de gás de xisto no Brasil. Assim, a possibilidade de usar o recurso energético ficaria suspensa, por um período determinado, até que fossem realizados estudos suficientes para garantir a segurança da operação. Além da ausência de estudos científicos consistentes sobre a localização exata e a capacidade dos poços, com a moratória haveria mais tempo para testar novos procedimentos e até conseguir desenvolver tecnologias mais apropriadas para a exploração. França, Bulgária e alguns estados norte-americanos já declararam moratória.

Pós-crise

Com a economia fortemente abalada desde 2006, os Estados Unidos contaram com a exploração de gás de xisto no processo para se reerguer. Como libera o país de parte da importação de petróleo e é negociado bem mais barato do que os demais combustíveis fósseis, o gás impulsionou o período pós-crise. Ainda não se sabe bem como foi possível praticar preços tão baixos, se o sistema é deficitário e subsidiado por empresas que têm interesse em convencer o mercado sobre a viabilidade do negócio ou se nem todos os custos ambientais, como o tratamento da água contaminada, estão sendo devidamente contabilizados.

Leilão

A Agência Nacional de Petróleo (ANP) prevê para os dias 28 e 29 de novembro uma rodada de licitações para exploração de gás natural, convencional ou não. Questionada pela Gazeta do Povo, a ANP informou que está preparando as exigências que deverão ser seguidas pelas empresas que pretendam explorar o gás de xisto. Alegou ainda que provavelmente haverá áreas nas bacias terrestres dos rios Paraná, Parecis, Parnaíba, Recôncavo, Acre e São Francisco, em que estudos mostraram que há grande potencial para existência de jazidas de gás. A licitação precisa de aprovação do Conselho Nacional de Política Energética.

Regulação

Ainda não existe legislação específica para a exploração de gás de xisto no Brasil. Sem marco regulatório falta base jurídica para questões práticas, como o licenciamento ambiental das áreas e quem tem direito sobre o gás no subsolo. Por enquanto, o norte jurídico é estabelecido pela mesma regulamentação usada para petróleo e gás convencional. Em declarações recentes à imprensa, a Agência Nacional de Petróleo informou que não acredita que a exploração de gás de xisto comece a curto prazo no Brasil. No Paraná, a Petrobras mantém uma usina de xisto betuminoso, em São Mateus do Sul, mas o tipo de exploração é totalmente diferente.

Riscos

“É o maior problema ambiental que eu já vi nos 38 anos de experiência que tenho no setor”, afirma Ivo Pugnaloni, presidente da Associação Brasileira de Fomento às Pequenas Centrais Hidroelétricas e dono da Consultoria Enercons. Ele se baseia nas ocorrências registradas nos Estados Unidos e explica que cada poço gera uma piscina com água contaminada. Algumas têm 2 mil metros de raio. O tratamento é caro e nem sempre eficiente. A tecnologia é patenteada e dominada por uma única empresa. “Nos Estados Unidos, a decisão foi que perder o meio ambiente é o preço a pagar para depender menos de petróleo estrangeiro”, diz.

Fonte: Gazeta do Povo