A gestão ambiental no Brasil deu um passo significativo com a publicação da Resolução CONAMA n. 510, de 15 de setembro de 2025. Esta nova regulamentação surge com o objetivo de estabelecer critérios técnicos, condições de validade, transparência e integração para a emissão de Autorizações de Supressão de Vegetação (ASV) nativa em imóveis rurais.

Longe de ser apenas mais uma norma restritiva, a Resolução n. 510 representa uma evolução crucial, ampliando as possibilidades de manejo da vegetação e oferecendo maior clareza e previsibilidade para produtores rurais, ao mesmo tempo em que reforça os mecanismos de controle e publicidade.

A nova resolução propõe, portanto, uma abordagem mais abrangente e modernizada, reconhecendo a complexidade das atividades rurais e a necessidade de critérios mais adaptados à realidade do campo, sem comprometer a proteção ambiental.

Um dos pontos de partida da Resolução CONAMA n. 510 é a definição precisa de ASV nativa como um ato administrativo que estabelece critérios e condicionantes para a supressão legal de vegetação nativa e formações sucessoras. Isso porque, esse ato “poderá contemplar etapas de aproveitamento, vinculação de volume e comercialização de produtos florestais” (art. 2º), o que já sinaliza uma visão mais integrada e funcional do manejo da vegetação. É importante salientar que a resolução não se aplica a planos de manejo florestal sustentável ou queima controlada/prescrita, focando especificamente em outras modalidades de supressão, onde a clareza era mais necessária.

A grande inovação e o aspecto mais positivo da Resolução CONAMA n. 510 residem nas disposições que desburocratizam e ampliam as permissões para certas atividades rurais. Um exemplo paradigmático é a “limpeza de áreas rurais em pousio, destinadas ao uso alternativo do solo para atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais, cujo uso tenha sido interrompido por até cinco anos, independe de emissão de ASV nativa” (art. 3º).

Essa flexibilização, no entanto, não é irrestrita. Ela está condicionada a critérios importantes, como: (i) não ocorrer em Área de Preservação Permanente (APP), Área de Reserva Legal ou área protegida por legislação específica; (ii) restringir-se a áreas objeto de ASV nativa regularmente executada ou a áreas de uso consolidado, nos termos da Lei n. 12.651/2012 (Código Florestal); (iii) ser formalizada por meio de declaração ao órgão ambiental estadual competente.

A referida disposição do artigo 3º é um avanço notável, uma vez que permite que áreas que já foram utilizadas e estão em pousio retornem à produção sem a necessidade de um processo de ASV complexo, reconhecendo o ciclo produtivo da terra e incentivando a manutenção de áreas produtivas já consolidadas.

Ainda assim, a resolução demonstra uma sensibilidade especial para a agricultura familiar, pois isenta os agricultores familiares da exigência de declaração para a limpeza de áreas em pousio, conforme definido na Lei n. 11.326/2006 (Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais). Além disso, simplifica ainda mais para pequenas propriedades ou posses rurais familiares, estabelecendo que a intervenção e supressão de vegetação em APP e Reserva Legal para atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental dependerão de “simples declaração ao órgão ambiental competente“, desde que o imóvel esteja inscrito no Cadastro Ambiental Rural (CAR) (art. 4, § 6º).

Essas medidas são cruciais para promover a inclusão produtiva e reduzir o ônus regulatório sobre aqueles que mais necessitam de apoio para a subsistência e desenvolvimento de suas atividades, sem, contudo, negligenciar a inscrição no CAR como ferramenta de controle e planejamento ambiental.

Se tanto não bastasse, a Resolução CONAMA n. 510 não foca apenas na permissão e desburocratização, mas também na modernização e na transparência dos processos, tendo em vista que permitiu estabelecer que as ASVs e suas fundamentações técnicas devem ser disponibilizadas publicamente, idealmente por meio do Sistema Nacional de Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor) ou por sistemas próprios de fácil acesso público (arts. 6º e 8º).

Os órgãos ambientais agora têm a responsabilidade de divulgar na internet, de forma acessível e em formato de planilha digital e arquivo espacial vetorial, todas as informações sobre as ASVs emitidas, incluindo detalhes como a área autorizada para supressão, o bioma, o tipo de vegetação, e a localização georreferenciada da área (art. 7º). Tal exigência de transparência ativa e integração de dados não só facilita o controle social, mas também permite uma gestão ambiental mais eficiente e baseada em dados, contribuindo para a rastreabilidade e a legalidade da supressão de vegetação.

A resolução ainda aborda a competência para a emissão de ASVs, pois permite que órgãos ambientais municipais ou consórcios públicos de municípios emitam ASVs nativas para intervenções de impacto ambiental local que afetem diretamente o território do município, especialmente em áreas urbanas ou de expansão urbana consolidada (art. 9º). Essa descentralização, condicionada à comprovação de capacidade técnica e existência de um conselho municipal de meio ambiente ativo, aproxima a gestão ambiental da realidade local e pode agilizar processos, tornando a regulação mais ágil e adaptada às necessidades regionais.

A Resolução CONAMA n. 510, de 2025, de fato, representa um avanço na gestão da supressão de vegetação nativa em imóveis rurais, buscando harmonizar a produção com a proteção ambiental através da flexibilização de procedimentos e da promoção da transparência. As inovações que visam desburocratizar certas atividades, como a limpeza de áreas em pousio, e a sensibilidade demonstrada à agricultura familiar mostram ser aspectos positivos.

No entanto, uma análise mais aprofundada revela que, apesar das intenções de simplificação, a resolução ainda pode gerar entraves significativos. A vinculação e regularização do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR) como condição para a validade de certas autorizações, por exemplo, embora fundamental para o controle e planejamento ambiental, pode se traduzir em um obstáculo considerável para muitos produtores. Os procedimentos para a inscrição e validação no CAR são frequentemente demorados e complexos, exigindo conhecimentos técnicos e acesso a recursos que nem todos os proprietários rurais, especialmente os de pequeno porte e agricultores familiares, possuem. Essa exigência pode, paradoxalmente, retardar a emissão de autorizações, impactar a agilidade prometida e, em alguns casos, até mesmo excluir produtores que não conseguem navegar pela burocracia do sistema. Assim, enquanto a resolução avança em alguns pontos, ela mantém e até reforça mecanismos que, na prática, podem prolongar a espera por aprovações e, em última instância, frustrar os objetivos de modernização e inclusão que a norma propõe.

Por: Monique Demaria