Muitas causas ambientais que tramitam na Justiça uestionam a licença ambiental concedida pelo órgão responsável. Para o advogado Marcelo Buzaglo Dantas, isso acontece porque “a administração pública ambiental acaba não se impondo, fazendo com que não raro haja a necessidade de intervenção no judiciário”.
Comentando as ações que tramitam em Santa Catarina sobre o tema, o especialista avalia que “há certa dose de exagero em algumas dessas ações. Equívocos existem dos dois lados. Ora por parte de quem licencia ora por aqueles que questionam o licenciamento”.
Para ele, o país precisa encontrar “um ponto de equilíbrio entre desenvolvimento econômico e a proteção ao meio ambiente”. Marcelo Dantas é presidente da Comissão do Meio Ambiente da OAB/SC, da qual participa desde 1997. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná) e mestre e doutorando em Direitos Difusos e Coletivos pela PUC-SP.
Professor de direito ambiental da Univale (Universidade do Vale do Itajaí), e de direito processual civil na EPAMP/SC (Escola de Preparação e Aperfeiçoamento do Ministério Público) e na Escola da Magistratura Federal. Ele revela seu contentamento com o arquivamento do projeto de lei da ação civil pública, por não encontrar motivos “para uma reformulação total do instituto, que, bem ou mal, há mais de 2 décadas vem cumprindo seu papel”. Pondera que “a jurisprudência já vem se encarregando de atualizar o instrumento”. Veja a entrevista que Marcelo Dantas concedeu ao Observatório Eco com exclusividade.
Observatório Eco: A administração pública, nas três esferas tem responsabilidade pelos atos predatórios de terceiros, por exemplo, a destruição de nascentes em áreas de proteção, se ela deixa de fiscalizar o uso dessas áreas? Ou mesmo a construção de casas em áreas impróprias?
Marcelo Dantas: Sim, nos termos do que estabelece a lei nº 6.938/81 e a Constituição Federal de 1988, a responsabilidade por danos ao meio ambiente é todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuam para a lesão ambiental.
Observatório Eco: Se a administração pública concede uma licença ambiental para determinado empreendimento, que apenas judicialmente é considerado nocivo ao meio ambiente, o poder público também é responsabilizado pelos danos causados?
Marcelo Dantas: Sem dúvida. Se ele é juridicamente considerado nocivo ao meio ambiente, é porque há base técnica e/ou científica para tanto. Ademais, se o sistema jurídico considera a atividade como lesiva, não há dúvidas da co-responsabilidade do Poder Público em situações com essas.
Observatório Eco: O senhor considera válido, já no inicio da ação civil pública, o poluidor ser obrigado a recuperar a área poluída, antes de esperar todo o trâmite do processo judicial, que ao final irá determinar essa mesma providência?
Marcelo Dantas: Se estiverem preenchidos os requisitos legais para tanto, quais sejam, a relevância dos argumentos jurídicos suscitados e o receio de dano ambiental irreparável ou de difícil reparação, é perfeitamente válida a concessão de provimento judicial liminar para esse fim.
Observatório Eco: Atualmente, o senhor avalia que a especialização da justiça federal e estadual em assuntos ligados ao meio ambiente garante uma prestação de tutela jurisdicional mais célere?
Marcelo Dantas: Certamente. A matéria ambiental é bastante específica, de modo que o juiz que cuida de assuntos variados tende a demorar mais para analisar uma demanda que envolva meio ambiente.
Se a vara onde ele atua está especializada, por conseguinte, terá mais facilidade de lidar com as peculiaridades do direito ambiental e, portanto, dar andamento mais célere aos processos.
Observatório Eco: Cada vez mais, decisões públicas sobre obras de infraestrutura chegam ao Judiciário, em razão de riscos ao meio ambiente. Por que o Brasil tem essa tendência de judicializar seus problemas?
Marcelo Dantas: Infelizmente, porque a administração pública ambiental acaba não se impondo, fazendo com que não raro haja a necessidade de intervenção no judiciário.
Observatório Eco: O Estado de Santa Catarina tem inúmeros problemas ambientais, decorrentes da ocupação de suas áreas litorâneas, ou no interior. As licenças ambientais que são concedidas sofrem o questionamento judicial. O que precisa ser feito para que exista uma harmonia ambiental nessas questões?
Marcelo Dantas: O fato de algumas licenças ambientais sofrerem questionamento judicial não significa que estejam todas equivocadas.
Há certa dose de exagero em algumas dessas ações. Equívocos existem dos dois lados. Ora por parte de quem licencia ora por aqueles que questionam o licenciamento.
É necessário que se chegue a um ponto de equilíbrio entre desenvolvimento econômico e a proteção ao meio ambiente.
Observatório Eco: O senhor avalia que uma nova lei de ação civil pública, (projeto 5.139/2009), trará uma mudança positiva?
Marcelo Dantas: O projeto acaba de ser arquivado. Confesso que fiquei satisfeito. Trabalho com a ação civil pública há cerca de 15 anos e, sinceramente, não via motivos para uma reformulação total do instituto, que, bem ou mal, há mais de 2 décadas vem cumprindo seu papel.
A jurisprudência já vem se encarregando de atualizar o instrumento, sendo desnecessária uma alteração integral da lei reguladora.
A não ser que fosse para enfrentar pontos sensíveis da norma, como a possibilidade de propositura de ação coletiva passiva e do controle da representatividade adequada pelo juiz. Mas o projeto não contemplava qualquer referência a estes assuntos polêmicos.
Observatório Eco: Conte-nos, por favor, um pouco da sua carreira, e o que te motivou a trabalhar com direito ambiental.
Marcelo Dantas: Comecei a trabalhar com o direito ambiental ainda no curso de graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina. Era bolsista de iniciação científica do CNPQ e, já naquela época, escrevi alguns artigos que acabaram sendo publicados em livros e revistas.
Depois que me formei recebi um convite para ser advogado da FLORAM (Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis). Foi a chance de trabalhar na prática com um assunto que já me encantava na teoria. O tempo foi passando e fui me especializando na área, tanto do ponto de vista acadêmico quanto profissional. Hoje me sinto um advogado realizado, pois trabalho com a área do Direito que mais gosto, onde os desafios se renovam a cada dia.
Fonte: Observatório Eco
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