Sabe-se que as situações da vida, que o direito deve regular, são dinâmicas e evoluem de uma maneira bastante célere, de modo que muitas relações jurídicas acabam se instaurando na prática e somente após algum tempo são normatizadas ou disciplinadas pelo próprio Poder Judiciário, no exame de casos concretos que lhe são submetidos.
Esse é o caso dos chamados “loteamentos fechados”, que, muito embora não tenham sido propriamente previstos pelo legislador ordinário federal, têm se proliferado nas últimas décadas devido à inoperância do Poder Público em dotar a população da mais mínima segurança.
Assim, oriundos apenas da realidade social atual, esses institutos por diversas vezes foram questionados juridicamente. Hoje, todavia, apesar de alguma divergência doutrinária sobre a sua natureza, podemos afirmar que os loteamentos fechados são sem dúvida alguma reconhecidos pela doutrina e pela jurisprudência brasileira, inclusive a do c. Supremo Tribunal Federal.
Deste modo, ainda que inexista legislação federal que verse especificamente sobre a matéria, atualmente os loteamentos fechados se apresentam como alternativa legítima e segura aos empreendedores. Basta, para tanto, que os Municípios editem ou tenham editado normas urbanísticas locais adequadas a essas urbanizações peculiares.
Isso porque o c. STF, em verdadeiro leading case sobre a matéria (RE n. 607.940/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 29/10/15), decidiu que a competência para legislar sobre assuntos relacionados a uso e ocupação do solo é dos Municípios, seja por meio do Plano Diretor, seja por intermédio de outra norma, desde que compatível com as diretrizes fixadas naquele.
Esse acórdão da Suprema Corte é de extrema relevância porque, a nosso sentir, além de ter tratado expressamente sobre a legitimidade dos loteamentos fechados, parece ter finalmente posto fim à celeuma consubstanciada na competência normativa municipal sobre a matéria.
Isso porque, normalmente, entendia-se que as normas municipais não eram aptas a disciplinar institutos não previstos na legislação federal (caso, p.ex., dos loteamentos fechados e dos condomínios de lotes), o que ocasionava a busca da intervenção do Judiciário para a decretação de inconstitucionalidade dos respectivos diplomas municipais.
Note-se, todavia, que ao fechar os loteamentos, surgem outras questões jurídicas que merecem maior atenção, como aquelas relativas ao uso particular dos bens públicos (ruas, praças, calçadas e demais espaços) pelos integrantes do loteamento fechado.
Isto é, como se dá essa legitimação do uso especial dos bens públicos? Há necessidade de licitação nesses casos? O município poderá exigir contraprestações para tanto?
Esses são questionamentos compreensíveis que surgem com frequência durante a aprovação dos empreendimentos caracterizados por essa figura jurídica peculiar, exatamente por se tratar de um misto de loteamentos com condomínios. Note-se que esses pontos, muito embora comuns, devem ser abordados com cautela para resguardar a legitimidade dos empreendimentos. Por isso mesmo, trataremos dessas questões de maneira aprofundada em outra oportunidade.
O que podemos afirmar, sem qualquer receio de errar, é que atualmente o Supremo Tribunal Federal reconhece expressamente a existência jurídica dos chamados loteamentos fechados, colocando fim a uma polêmica de décadas a respeito da legalidade desse instituto de uso e ocupação do solo urbano.
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