No mês de maio do corrente ano foi protocolada Ação Popular perante a 6º Vara Federal de Florianópolis contra a União (500901210.2015.4.04.7200) com o intuito de discutir a legalidade do procedimento administrativo em trâmite na Secretaria do Patrimônio da União de Florianópolis, que visa homologar a linha demarcatória dos terrenos de marinha na Capital do Estado. O procedimento judicial tinha como o objetivo reconhecer a inexistência de terrenos de marinha sobre as ilhas costeiras ou oceânicas que sejam sede de Município; reconhecer a falta de fundamentação legal para o exercício do poder discricionário na demarcação da linha preamar, passados 70 anos do Decreto-Lei n. 9.760/46 por não mais estarem presentes o interesse jurídico que o legitimou – defesa e segurança nacional, decretando sua nulidade; e, ainda reconhecer o vício no processo de demarcação, para desconstituí-lo, desde seu início, uma vez que processado sem observar as regras formais e materiais do Decreto-Lei n. 9.760/46.

A sentença da lavra do Juiz Federal Marcelo Krás Borges declara a extinção do processo sem julgamento do mérito em face da impossibilidade jurídica do pedido e da inépcia da petição inicial.

Fundamenta a impossibilidade jurídica do pedido no fato da demarcação dos terrenos de marinha encontrar amparo legal no Decreto-Lei n. 9.760/46 o que, ao seu entender, revela-se inviável impugnar a legalidade ou a moralidade da demarcação de todos os terrenos de marinha existentes no Estado de Santa Catarina, uma vez que cada terreno contém uma particularidade que deve ser analisada em processo próprio e, a atuação da União por meio da SPU tem sido apenas de cumprir  a legislação  não podendo interpretar a legislação vigente em prejuízo ao patrimônio público, ou seja, não poderia interpretar a Constituição Federal de modo a concluir que não existem terrenos de marinha no Município de Florianópolis, pois tal ato seria ilegal e imoral dando ensejo a uma ação popular uma vez que o texto constitucional não menciona que os terrenos de marinha foram extintos nas ilhas sedes de município. Destaca que, entender de modo diverso, desvirtuaria o objetivo da ação popular que busca corrigir um ato administrativo ilegal ou imoral, e não obrigar a administração pública a agir ilegal ou imoralmente, sendo o caminho correto para a consecução do pedido do autor a aprovação de emenda constitucional que venha a extinguir os terrenos de marinha ou diminuir os laudêmios ou foros cobrados, não podendo o Poder Judiciário agir como legislador com o fito de corrigir procedimento administrativo legal realizado pela União.

A inépcia da petição inicial, segundo o entendimento do juízo, está consubstanciada no fato de não ter apontado qualquer ato imoral ou ilegal, limitando-se a descrever apenas que a União está cumprindo a legislação vigente, não atentando contra nenhum direito. Assim, entendeu ser impossível ao Poder Judiciário determinar que a União Federal não cumpra sua obrigação de demarcar os terrenos de marinha conforme determina a legislação sob pena de ferir o Princípio Constitucional da Autonomia e Independência dos Poderes.

Importante frisar que da sentença prolatada nos Autos da Ação Popular ainda cabe recurso para a instância superior.

Não obstante a fundamentação utilizada, necessário observar que o procedimento administrativo de demarcação da linha preamar não respeitou a legislação de regência conforme indicado na sentença. Isto pode ser aferido pelo trâmite do procedimento administrativo que já dura vários anos e iniciou-se com a intimação dos interessados via edital, contrariando as decisões dos tribunais no sentido de que os interessados deveriam ser intimados pessoalmente, sendo que tal vício somente veio a ser “suprido” no final do procedimento, quando todos os estudos já haviam sido realizados. Assim aos interessados não foi proporcionada a possibilidade de participação no início dos trabalhos do procedimento administrativos, onde poderiam contribuir com fotos documentos e até depoimentos conforme preleciona o Decreto- Lei n. 9.760/46.

Destaca-se que, este procedimento demarcatório não foi o único a ser questionado, em vários outros Estados os procedimentos adotados pela União através da SPU, foram também atacados tendo sido suspensos pela falta de cumprimento da legislação, em especial a falta de intimação pessoal dos interessados conhecidos. Diante das várias impugnações aos processos demarcatórios foi publicada no dia 26 de junho a Lei n. 13.139 com vigência para 120 dias após a publicação, que alterou entre outros, o Decreto-Lei 9.760/46,  determinando regras claras para os procedimentos demarcatórios, em especial audiências públicas com o objetivo de garantir publicidade e a participação do maior número de interessados, o que por si só demonstra o reconhecimento da União das falhas existentes até então.

Por: Marcelo Suppi