Enfrentamos hoje no país duas crises de dimensões catastróficas, a da água e a da energia, ambas estreitamente relacionadas e dependentes, de quem é a culpa?

O Brasil é um país privilegiado em recursos hídricos, possuindo uma gigantesca rede hidrográfica e dispondo do 3° maior potencial hidrelétrico do mundo, representando 10% da disponibilidade mundial. As usinas hidrelétricas respondem por quase 90% da produção de energia elétrica no país, e a contribuição da energia hidráulica, segundo o Balanço Energético Nacional de 2014 é de, aproximadamente, 71% na matriz energética.

Apesar da abundância de recursos hídricos, como se explica o apagão do mês passado em onze Estados brasileiros e no Distrito Federal? Como pode nosso país estar na iminência de sofrer um novo e mais grave apagão do que o de 2001?

O crescimento do consumo de energia cresce todos os anos, proporcionalmente ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e ao crescimento vegetativo da população e da renda das pessoas. O consumo cresceu especialmente nos últimos anos, após a redução da tarifa de energia elétrica para a indústria e para os consumidores; ou seja, o Governo Federal incentivou uma política de consumo irresponsável. É sabido que a falta de chuvas baixou radicalmente o nível dos reservatórios nas hidrelétricas, mas a estiagem é apenas uma das verdadeiras causas da crise.

Mesmo com todo potencial hidrelétrico, esta fonte de energia não é devidamente explorada, haja vista as restrições socioeconômicas e ambientais aos projetos. Em que pese a grande polêmica de construção de barragens nas hidrelétricas, com impactos negativos ao meio ambiente, é preciso ressaltar que as hidrelétricas são fonte renovável de energia.

Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostram que de 42 empreendimentos leiloados de 2000 a 2012, que somam 28.834,74 MW de potência, apenas dez constituem usinas com reservatórios. Estas dez usinas agregam somente 1.940,6 MW de potência instalada ao sistema elétrico. Os outros 32 empreendimentos, num total de 26.894,14 MW, são de usinas a fio d’água, ou seja, sem qualquer capacidade de guardar água para geração de eletricidade nos períodos secos. Apenas 6,73% da capacidade de geração desses empreendimentos são, portanto, provenientes de usinas com reservatório. Para exemplificar, cita-se o exemplo de Belo Monte.

Além do óbice apontado, existem infindáveis problemas de gestão, de coordenação nas várias fases do sistema na transmissão e distribuição de eletricidade, na licitação e construção de empreendimentos de geração, nas demoras e dificuldades das licenças ambientais e no atraso das obras. Problemas esses que precisam ser solucionados urgentemente pela Administração Pública.

Enquanto perdura a dificuldade na energia gerada pelas hidrelétricas, as termelétricas, que produzem energia por meio de combustíveis como óleo e gás, não dependem do clima e, quando acionadas, ajudam a poupar água dos reservatórios das hidrelétricas, já estão funcionando na capacidade máxima.

É provável que tenhamos de enfrentar racionamento de energia, medida preventiva que já deveria ter sido adotada há muito tempo. Mas para se evitar um desastroso apagão, há que se reavaliar todo o processo de geração de energia hidroelétrica, e diversas ações devem ser imediatamente tomadas pelo governo, tais como:

– Investimento urgente em formas alternativas de energia, que representem impactos menores ao meio ambiente e à sociedade;

– Avaliação integrada do rio e da bacia, realizada pela Administração Pública, com critérios claros e precisos, para que se tenha a noção dos efeitos cumulativos de várias hidrelétricas, para que possa subsidiar os Estudos de Impactos Ambientais, agilizando e simplificando os licenciamentos, levando em conta a conservação ambiental, a manutenção da qualidade de vida da população, bem como os impactos econômicos e sociais;

-Reforma na gestão da geração e fornecimento da energia elétrica no país.

A nós consumidores cabe economizar. Aos empreendedores cumpre a conscientização de que a questão ambiental, seja na geração de energia ou em outro processo produtivo, muito mais que uma batalha, é uma questão de conscientização, onde esforços e recursos devem ser empregados preventivamente na produção e serviços mais sustentáveis. E aos órgãos de controle (Ministério Público, órgãos públicos de meio ambiente e entidades não governamentais) cabe a missão de exigir o cumprimento da lei, mas sem exageros que impeçam ou dificultem ainda mais a geração de energia no país.

Por: Juliana Guimarães Malta Côrte